Nas entrelinhas: A cartada de Lula

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O petista pretende manter o PT unido  e evitar a divisão de seus eleitores entre o apoio ao candidato do PDT, Ciro Gomes, e uma candidatura própria que ainda precisa ser catapultada

“Desafio apresentarem provas do meu crime até o dia 15 de agosto, quando serei registrado candidato a presidente”, disse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em carta lida ontem pela presidente do partido, senadora Gleisi Hoffmann (PR), na sede da Executiva do partido. Lula cumpre pena de 12 anos e 1 mês por lavagem de dinheiro e corrupção passiva, no caso do tríplex no Guarujá, e fez diversas tentativas junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), que entrou em recesso, para sair da cadeia em Curitiba e suspender sua inelegibilidade, todas fracassadas. A carta faz um duro ataque ao ministro-relator da Operação Lava-Jato, Edson Fachin, e ao próprio Supremo.

“Primeiro, o ministro Fachin retirou da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal o julgamento do habeas corpus que poderia impedir minha prisão e o remeteu para o Plenário. Tal manobra evitou que a Segunda Turma, cujo posicionamento majoritário contra a prisão antes do trânsito em julgado já era de todos conhecido, concedesse o habeas corpus(…)

Em seguida, na medida cautelar em que minha defesa postulou o efeito suspensivo ao recurso extraordinário, para me colocar em liberdade, o mesmo Ministro resolveu levar o processo diretamente para a Segunda Turma, tendo o julgamento sido pautado para o dia 26 de junho (…)

No entanto, no apagar das luzes da sexta-feira, 22 de junho, poucos minutos depois de ter sido publicada a decisão do TRF-4 que negou seguimento ao meu recurso (o que ocorreu às 19h05m), como se estivesse armada uma tocaia, a medida cautelar foi dada por prejudicada e o processo extinto, artifício que, mais uma vez, evitou que o meu caso fosse julgado pelo órgão judicial competente (decisão divulgada às 19h40m).

Minha defesa recorreu da decisão do TRF-4 e também da decisão que extinguiu o processo da cautelar. Contudo, surpreendentemente, mais uma vez o relator remeteu o julgamento deste recurso diretamente ao Plenário. Com mais esta manobra, foi subtraída, outra vez, a competência natural do órgão a que cabia o julgamento do meu caso (…)”, disparou Lula.

Repete-se a estratégia fracassada de Lula no julgamento em primeira instância, no qual foi condenado a 9 anos e dois meses de prisão em regime fechado pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, e no julgamento pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Porto Alegre, no qual a pena foi aumentada para 12 anos e 1 mês, já em execução. Não se deve subestimar o poder de influência de um ex-presidente da República no Supremo, mas sempre há um rito formal a observar. Nesse caso, o réu se insurge contra o juiz como se estivesse num tribunal de exceção, o que não é o caso.

O substituto

Há inúmeros exemplos de estratégia do tipo “a defesa acusa” ao longo da história, todas elas em processos na natureza política e não, criminal. É famoso o caso do capitão Alfred Dreyfus, acusado de vender informações secretas aos alemães, que recebeu pena de prisão perpétua na Ilha do Diabo, na Guiana Francesa, em 1894. Quatro anos depois, ilustres personalidades resolveram denunciar o processo, entre as quais os escritores Émile Zola e Anatole France, o poeta Charles Péguy e os compositores Alfred Bruneau e Albèric Magnard. Só em julho de 1906 sua inocência foi reconhecida e ele pôde ser reabilitado.

Lula tece a narrativa de que é vítima de uma grande injustiça, ao mesmo tempo em que trava uma batalha de bastidor para derrubar a jurisprudência da Corte que determina a execução da pena em segunda instância. Perdão para o trocadilho, mas a cartada de Lula não mira apenas o ministro Fachin. Ao radicalizar o discurso e reiterar sua candidatura a presidente da República, mesmo estando inelegível em razão da Lei da Ficha Limpa (já não se trata de jurisprudência), pretende manter o PT unido em torno de sua liderança e evitar a divisão da legenda entre o apoio ao candidato do PDT, Ciro Gomes, que já atrai seus eleitores no Nordeste, e uma candidatura própria que ainda precisa ser catapultada.

Ao mesmo tempo em que divulgou a carta de Lula, o PT anunciou os nomes dos coordenadores de campanha: o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli (coordenador-geral executivo), os ex-ministros Ricardo Berzoini (coordenador de finanças), Luiz Dulci e Gilberto Carvalho, e o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto. O coordenador-geral do programa Lula de governo é o ex-prefeito Fernando Haddad (SP), na verdade, o candidato que Lula pretende indicar num “dedazo”, para substituí-lo na cédula eleitoral.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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