Bolsonaro corre risco de se tornar inelegível e ficar fora da disputa presidencial. O ex-capitão do Exército é acusado do crime de racismo
A interrupção do julgamento de Jair Bolsonaro (PSL), em pleno processo eleitoral, por crime de racismo, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), é mais um fator de instabilidade do quadro político. Tumultua o processo eleitoral, já bastante perturbado pelo registro da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está preso e inelegível. A aceitação ou não da denúncia era para ter sido decidida ontem, mas o ministro Alexandre de Moraes pediu vista do processo. A votação está 2 a 2. Bolsonaro — que se encontra em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás de Lula — corre risco de se tornar inelegível e ficar fora da disputa presidencial. O ex-capitão do Exército é acusado do crime de racismo em palestra no Clube Hebraica do Rio de Janeiro, em abril de 2017. Segundo a Procuradoria Geral da República, o deputado teria usado expressões de cunho discriminatório, incitando o ódio e atingindo vários grupos sociais.
Na ocasião, Bolsonaro disse que se eleito presidente não destinará recursos para ONGs e para reservas indígenas ou quilombolas. “Onde tem uma terra indígena, tem uma riqueza embaixo dela. Temos que mudar isso daí. (…) Eu fui num quilombo, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gastado com eles”, disse. Também fez declarações muito machistas: “Eu tenho cinco filhos. Foram quatro homens; a quinta, eu dei uma fraquejada e veio uma mulher”. Para o Ministério Público Federal (MPF), suas declarações incitaram ao “ódio” e configuram conduta “ilícita, inaceitável e severamente reprovável.”
O ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo, minimizou as declarações e encaminhou a votação contra o recebimento da denúncia. Em seu voto, afirmou que as declarações não se configuram falas discriminatórias, estão dentro dos limites da liberdade de expressão e também protegidas pela imunidade parlamentar. Foi acompanhado pelo ministro Luiz Fux. Quem abriu a divergência na Corte foi o ministro Luís Barroso, a favor da aceitação da denúncia. “Aqui me parece inequivocamente claro um tipo de discurso de ódio que o direito constitucional não admite”, disse. Segundo Barroso, o uso de expressões como “arroba” para se referir aos negros quilombolas pode configurar o crime de racismo. Foi apoiado pela ministra Rosa Weber, que empatou o julgamento. Rosa Weber é a atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A suspensão do julgamento surpreendeu. As expectativas eram de que a denúncia não seria aceita, apesar de a Primeira Turma ser apelidada de “Câmara de Gás” nos bastidores do Supremo. O ministro Alexandre de Moraes alegou que tinha um voto longo e pediu vista do processo. Caso a nova denúncia seja aceita, Bolsonaro será réu em três processos. Já há um pedido de impugnação da candidatura de Jair Bolsonaro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), porque o candidato do PSL é réu em duas ações penais por suposta incitação ao estupro. Os advogados de Bolsonaro alegam que a Lei da Ficha Limpa prevê os casos de inelegibilidade por condenação em instâncias superiores, em nenhum dos quais o candidato estaria enquadrado.
Divergências
Há uma polêmica aberta no Supremo com relação ao fato de réus poderem exercer a Presidência da República. Em 2016, a maioria do STF considerou que réus em ação penal não podem substituir o presidente da República — ou seja, têm direito de figurar na linha sucessória, mas não podem assumir a chefia do Executivo. A decisão teve por objetivo impedir que o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha assumisse a Presidência interinamente. O plenário, porém, não respondeu se um presidente da República pode tomar posse na condição de réu. Há controvérsias quanto à aplicação dessa decisão ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, uma vez que a Constituição determina que um presidente eleito não pode ser julgado por atos cometidos antes do exercício do mandato. O mesmo não se aplicaria, entretanto, a parlamentares que respondem a processo no Supremo, caso de Bolsonaro.
A questão está no rol das decisões intempestivas e até casuísticas do Supremo. Ao pedir vista do processo e interromper o julgamento, o ministro Alexandre de Moraes anunciou que faria um voto longo. Pode ser um voto esclarecedor e definitivo ou mais um voto ambíguo e casuístico, que aumente as dúvidas em relação ao processo. Há duas questões em jogo: a primeira é impor um limite à misoginia, ao racismo e à incitação ao ódio; a segunda, as condições em que um réu pode ser impedido de disputar a Presidência da República. Ambas são relevantes para as regras do jogo democrático e podem conter o acirramento ânimos e a radicalização política no pleito deste ano.
Lula não consegue sustentar medidas econômicas impopulares, porém necessárias, ainda que em médio e longo…
Essa foi a primeira troca da reforma ministerial que está sendo maturada no Palácio do…
Lula não precisou adotar uma dura política recessiva no primeiro ano de governo, porém se…
Agora, às vésperas de tomar posse, Trump choca o mundo com uma visão geopolítica expansionista…