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Nas entrelinhas: A segunda morte de Collor de Melo

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No poder, enfrentou uma sucessão de crises financeiras e fracassou no combate à hiperinflação. Os planos Collor I e Collor II foram desastrosos. Mas o colapso de seu governo foi ético e político

Velha raposa política britânica, o primeiro-ministro do Reino Unido, Winston Churchill, dizia que “a política é quase tão excitante como a guerra, e não menos perigosa: na guerra, a pessoa só pode ser morta uma vez, mas, na política, diversas vezes”. É o caso do ex-presidente Fernando Collor, que a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou, ontem, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em um processo da Operação Lava-Jato. A sessão foi suspensa com o placar de 6 x 1 e deve ser retomada na próxima quarta-feira. Relator, o ministro Edson Fachin recomendou a pena de 33 anos e 10 meses de prisão.

Votaram pela condenação os ministros Alexandre de Moraes, André Mendonça, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia. O ministro Nunes Marques votou pela absolvição de Collor. Para ele, não ficou comprovado que o ex-presidente tenha se beneficiado de desvios na BR Distribuidora. A pena total de Collor ainda não foi definida. Ele foi responsabilizado por indicações políticas para a BR Distribuidora, empresa subsidiária da Petrobras, e teria recebido R$ 20 milhões como contraprestação à facilitação da contratação da UTC Engenharia. A ação penal tramitava desde 2017 e os crimes teriam sido cometidos entre 2010 e 2014, ou seja, no primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, que não está envolvida no caso.

O advogado de Collor pediu sua absolvição. Alegou que as acusações da Procuradoria-Geral da República (PGR) estão baseadas em depoimentos de delação premiada e não foram apresentadas provas para incriminar o ex-senador. Negou que o ex-presidente tenha indicado diretores para a empresa: “Não há nenhuma prova idônea que corrobore essa versão do Ministério Público. Se tem aqui uma versão posta, única e exclusivamente, por colaboradores premiados, que não dizem que a arrecadação desses valores teria relação com Collor ou com suposta intermediação desse contrato de embandeiramento”, disse.

A decisão do Supremo ocorre um dia após a cassação do mandato do deputado Delton Dallagnol (Podemos-PR), que obteve mais de 350 mil votos nas eleições passadas. Ex-chefe da força tarefa da Lava-Jato, o ex-procurador da República perdeu o mandato por decisão unânime do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o que está sendo interpretado como uma reação dos ministros do STF contra a operação. A atuação de Dallagnol é criticada publicamente por alguns integrantes da Corte, como o ministro Gilmar Mendes, por exemplo. A decisão do Supremo de ontem vai na direção contrária, ao concluir um processo cuja origem foi a Lava-Jato com uma pena duríssima contra um ex-presidente da República.

Collor foi o primeiro presidente do Brasil eleito diretamente pelo voto popular, em 1989. Derrotou o então candidato Luís Inácio Lula da Silva, que saiu do pleito como a principal liderança de oposição. Filho do chefe político e empresário alagoano Arnon de Mello, foi eleito governador de Alagoas em 1986. Combateu os privilégios na política e ganhou o apelido de “caçador de marajás”, com o qual se projetou nacionalmente. Foi um candidato de direita contra o establishment político que emergira durante o governo do presidente José Sarney, na transição à democracia.

Impeachment

No poder, enfrentou uma sucessão de crises financeiras e fracassou no combate à hiperinflação. Os planos Collor I e Collor II foram desastrosos. Mas o colapso de seu governo foi, principalmente, ético e político, em razão das operações de caixa dois do tesoureiro da sua campanha presidencial, Paulo César (PC) Farias, que continuou arrecadando recursos após as eleições.

Uma entrevista de seu irmão, Pedro Collor, à revista Veja, acusando-o de envolvimento com PC Farias, levou à abertura de uma CPMI e uma série de investigações policiais, que motivaram o seu impeachment. Collor foi acusado de ter cometido crimes de responsabilidade, pautados pelo artigo 85 da Constituição de 1988 e na Lei 1.079, de 1950.

O pedido foi acolhido em 29 de setembro de 1992, na Câmara dos Deputados. Depois, seguiu para o Senado. Em apenas dois meses, teve início o julgamento no plenário do Senado. No dia da votação, antes que a sessão começasse, Collor enviou uma carta de renúncia para o Congresso, para evitar a perda dos direitos políticos por oito anos. Mesmo assim foi cassado, por 73 votos a oito contra. Seus aliados mudaram de lado.

Entretanto, o Plenário do STF julgou improcedente, na sessão de 24 de abril de 2014, a Ação Penal (AP) 465, proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o ex-presidente pela suposta prática dos crimes de falsidade ideológica, corrupção passiva e peculato, previstos, respectivamente, nos artigos 299, 312 e 317 do Código Penal.

Collor havia renascido para a política em 2006, quando foi eleito senador por Alagoas, com 550.725 votos. No primeiro dia de mandato, migrou do PRTB para o PTB, a convite de Roberto Jefferson, seu mais leal aliado na crise do impeachment. Manteve-se no Senado nas eleições de 2014. Tentou voltar ao governo de Alagoas três vezes, em 2010, 2018 e 2022, sem sucesso.