Nas entrelinhas: A polêmica do caixa dois

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“Rejeitada a tese de que o caixa dois em conexão com outros crimes, como corrupção e lavagem de dinheiro, possa ser desmembrado, ficando a Justiça Eleitoral com o crime eleitoral e os demais, com a Justiça comum”

O Supremo Tribunal federal (STF) manteve sua jurisprudência sobre o caixa a dois, numa votação apertada — 6 a 5 —, na qual o voto decisivo foi o do presidente da Corte, ministro Dias Toffoli. Com isso, os crimes de caixa dois continuarão sendo julgados na Justiça Eleitoral, e não pela Justiça comum, como desejava o Ministério Público Federal (MPF). A decisão é um muro de contenção à ofensiva da força-tarefa da Operação Lava-Jato de Curitiba contra os políticos citados nas delações premiada da Odebrecht e JBS.

Na legislação vigente, o caixa dois eleitoral é punido com denegação ou cassação do diploma do candidato; suspensão do repasse dos recursos do Fundo Partidário aplicável às agremiações que descumprirem as regras atinentes à arrecadação e gastos de recursos financeiros; e rejeição das contas dos partidos e candidatos. Sempre foi julgado pela Justiça Eleitoral, nunca foi tipificado como um crime comum, apesar dos muitos projetos apresentados no Congresso para isso, o mais recente, no pacote anticorrupção do ministro da Justiça, Sérgio Moro.

A decisão do Supremo rejeitou a tese de que o caixa dois em conexão com outros crimes, como corrupção e lavagem de dinheiro, possa ser desmembrado, ficando a Justiça Eleitoral com o crime eleitoral e os demais, com a Justiça comum. Na votação de ontem, foram vitoriosos os ministros Marco Aurélio Mello, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Dias Toffoli. Defenderam a tese de compartilhar os processos com crimes conexos os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Luiz Fux, Rosa Weber e Cármem Lúcia.

Comentando o julgamento, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que defendeu o compartilhamento, minimizou os riscos de retrocesso na Lava-Jato. A tese principal do MPF era de que a Justiça Eleitoral não tem estrutura para analisar os crimes mais complexos. O impacto imediato da decisão pode ser o envio de alguns casos que estão na alçada da Justiça Federal de Curitiba para a Justiça Eleitoral.

Novo paradigma

O caixa dois eleitoral é uma prática recorrente na política brasileira, na qual a linha que separava os políticos honestos dos desonestos era a formação de patrimônio pessoal, e não a origem do dinheiro. A Constituição de 1988, os órgãos de controle e a sociedade, porém, não fazem esse tipo de distinção. O que importa é a origem do dinheiro, geralmente proveniente de doações ilegais, propinas e desvio de recursos públicos.

O sinal de esgotamento desse modelo de financiamento da política, dos partidos e dos políticos já havia sido dado na crise do “mensalão”, durante o primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas foram o escândalo da Petrobras, no segundo mandato do petista, investigado pela Lava-Jato, e as delações premiadas da Odebrecht e da JBS, negociadas pelo ex-procurador-geral da república Rodrigo Janot, que implodiram o caixa dois dos partidos.

Centenas de políticos estão sendo processados pela Lava-Jato, alguns dos quais foram condenados e estão presos, entre eles o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A decisão de ontem, porém, permitirá que muitos dos envolvidos sejam julgados apenas por crime eleitoral e não por crime comum, principalmente os que receberam doações ilegais de campanha das empresas envolvidas no escândalo da Petrobras.

A ofensiva da Lava-Jato, porém, continua. Ontem, o ministro relator Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), liberou para julgamento a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra quatro parlamentares do PP reeleitos em 2018: os deputados Aguinaldo Ribeiro (PB), Arthur Lira (AL) e Eduardo da Fonte (PE); e o senador Ciro Nogueira (PI), presidente da legenda. O MPF também denunciou à Justiça 12 acusados de crimes ligados ao apoio financeiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao grupo J&F, entre os quais o empresário Joesley Batista, da JBS, o ex-presidente do BNDES Luciano Coutinho e os ex-ministros Guido Mantega e Antonio Palocci. A ação pede reparação de R$ 5,5 bilhões aos cofres públicos.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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