Nas entrelinhas: A eleição pode ser decidida no debate da Globo entre Lula e Bolsonaro

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Não se deve fazer nada de inútil, tudo pode se decidir com base no condicionamento físico, na capacidade de discernimento, na verdade, no espírito e na vontade. Num gesto e na força do olhar.

A campanha eleitoral entrou na reta final, com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a um passo da vitória e o presidente Jair Bolsonaro, a dois. No universo das pesquisas eleitorais, pode-se dizer que é mais ou menos essa a distância da linha de chegada, considerando-se a margem de erro das pesquisas. Com certeza, será a decisão mais apertada da história de nossas eleições, mais até do que a vitória da presidente Dilma Rousseff (PT) contra Aécio Neves (PSDB) nas eleições de 2014.

A contestação do resultado da eleição de domingo será líquida e certa no caso de Lula vencer Bolsonaro, conforme sinalizam auxiliares do presidente da República, como o general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), e o ministro das Comunicações, Fábio Faria, autor de uma denúncia de manipulação de inserções de propaganda eleitoral por rádios do Nordeste. A declaração de Bolsonaro, ontem, sobre a análise da segurança das urnas feita pelo Exército, ao dizer que não foram conclusivas, nesse aspecto, corrobora a narrativa golpista.

Temos uma crise contratada no horizonte imediato, que está se armando faz tempo, mas que foi fragilizada pelo episódio envolvendo o ex-deputado Roberto Jefferson, ao disparar 50 tiros de fuzil e três granadas contra policiais federais. Eleitoralmente, acertou no pé de Bolsonaro. Jefferson está preso em Bangu 8, por tentativa de homicídio dos policiais federais e ofensas à ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (TSE), e ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news, que cassou sua prisão domiciliar.

Os elementos

Terra — a disputa eleitoral pode ser decidida numa “guerra de posições”, na qual Lula e Bolsonaro se movimentam com objetivo de alterar o cenário que emergiu do primeiro turno. Bolsonaro tenta ampliar sua vantagem em São Paulo, virar a eleição em Minas e reduzir a vantagem de Lula no Nordeste. Lula resiste em São Paulo, avança no Rio de Janeiro, tenta manter sua vantagem em Minas e, sobretudo, ampliá-la ainda mais no Nordeste. Lula aposta nas grandes manifestações políticas, Bolsonaro no apoio de governadores e prefeitos.

Água — existe uma batalha ideológica em curso na sociedade, que já não se estrutura em classes sociais definidas. A chamada sociedade líquida. Essa batalha opõe reacionários e progressistas, num universo em que conservadores e liberais flutuam entre os dois polos, sem força para impor sua própria hegemonia. A extrema-direita dá o tom da campanha de Bolsonaro nas redes sociais, como no gesto tresloucado de Jefferson, impondo constrangimentos aos conservadores que o apoiam. No campo de Lula, a entrada na campanha de Simone Tebet (quem disse que ela não iria para o segundo turno?) mudou a qualidade de suas alianças, que evoluíram de uma frente de esquerda para, finalmente, a tal da frente ampla.

Fogo — a artilharia dos candidatos continua muito mais focada na rejeição dos adversários do que nos problemas do país, mas nem tudo é a baixaria das redes sociais. Qual será o principal divisor de águas da eleição? Lula bate forte no reacionarismo de Bolsonaro e seu projeto autoritário, de implantar uma espécie de Executivo forte, iliberal, dominante em relação aos demais Poderes. Também ataca Bolsonaro nos temas econômicos, que sensibilizam a população mais pobre, assalariados e aposentados. O presidente da República corre contra o prejuízo com o empréstimo consignado tendo como garantia o Auxílio Brasil, medida juridicamente questionável, mas que tem impacto junto aos eleitores de baixa renda, não se sabe a escala ainda.

Vento — Bolsonaro ataca Lula no seu ponto mais fraco: explicar o mensalão e o escândalo da Petrobras, invocando a Lava-Jato, operação que ajudou a encerrar. Mas tem o telhado de vidro da sua histórica relação com as milícias e a compra de imóveis com dinheiro vivo por seus filhos. O conservadorismo nos costumes dá voto para Bolsonaro de um lado, os evangélicos, mas joga no colo de Lula os intelectuais, os artistas, as mulheres e a juventude.

Vácuo — pode ser que a eleição seja decidia no debate de sexta-feira, na TV Globo, como num duelo de samurais. Esse é o vácuo da reta final. Nele, é preciso enxergar na escuridão. Não se deve fazer nada de inútil, tudo pode se decidir com base no condicionamento físico, na capacidade de discernimento, na verdade das coisas, no espírito e na vontade de fazer o certo. Num gesto e na força do olhar.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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