“Muy amigo”, Tarcísio larga a mão de Bolsonaro na crise do tarifaço

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Horas após o pedido de condenação da PGR ao Supremo, o presidente dos Estados Unidos saiu em defesa de Bolsonaro. Novamente associou o tarifaço de 50% ao julgamento do ex-presidente

A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF), na noite de segunda-feira, a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e de mais sete integrantes do chamado Núcleo Central da trama golpista, que tentou impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2022. Assinado pelo procurador-geral Paulo Gonet, o parecer foi entregue ao ministro Alexandre de Moraes, relator do processo, às 23h45. Com isso, o julgamento entra em fase decisiva e deve ser concluído em setembro.

De nada adiantaram as pressões do presidente Donald Trump, que voltou a defender Bolsonaro. O tarifaço de 50% sobre as exportações brasileiras mobilizou os exportadores nacionais e os empresários norte-americanos, cuja Câmara de Comércio criticou a medida. No plano político interno, a crise comercial e diplomática dividiu os aliados de Bolsonaro. O governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, mui amigo, mudou o discurso e passou a defender uma negociação com a Casa Branca em bases apenas comerciais, desvinculada do julgamento do ex-presidente. O deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que articula as pressões de Trump nos Estados Unidos, atacou Tarcísio e acusou-o de “subserviência servil”.

O documento da PGR tem 517 páginas e classifica Bolsonaro como “líder da organização criminosa” e “principal articulador e maior beneficiário” das ações que visaram à ruptura do Estado Democrático de Direito. O ex-presidente é acusado de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Somadas, as penas podem chegar a 43 anos de prisão.

Leia também: Veja os crimes e as penas que podem levar Bolsonaro a ficar mais de 40 anos preso

Entretanto, como tem mais de 70 anos e comorbidades resultantes das sequelas da facada que levou em Juiz de Fora (MG), na campanha eleitoral de 2018, dificilmente será condenado a pena tão grande. A defesa de Bolsonaro poderá requerer prisão domiciliar humanitária, a exemplo do ex-presidente Fernando Collor de Mello.

Além de Bolsonaro, são réus no processo: Walter Braga Netto, Augusto Heleno, Alexandre Ramagem, Anderson Torres, Almir Garnier, Paulo Sérgio Nogueira e Mauro Cid (que pode ter a pena suspensa em razão do acordo de delação premiada). O procurador-geral descreveu Bolsonaro como responsável por instrumentalizar o aparato estatal para atacar instituições e o sistema eleitoral. Gonet também destacou que, com apoio de setores estratégicos das Forças Armadas, o ex-presidente “mobilizou agentes, recursos e competências estatais para propagar narrativas inverídicas, provocar instabilidade social e defender medidas autoritárias”.

A PGR também destacou que os discursos de Bolsonaro extrapolaram o campo da crítica legítima e tiveram caráter de “incitação e desestabilização da democracia”. Como exemplo, citou a live no Palácio do Planalto, em 2021, e a utilização ilícita da Abin, a chamada “Abin Paralela”, para espalhar desinformação sobre vulnerabilidades das urnas eletrônicas.

Pressão continua

Horas após o pedido de condenação, Trump saiu em defesa de Bolsonaro. Novamente associou a imposição de tarifas de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados aos EUA, a partir de 1º de agosto, aos processos judiciais contra o ex-presidente. “O presidente Bolsonaro é um bom homem. Ele lutou muito pelo povo brasileiro e acredito que isso seja uma caça às bruxas”, disse, em tom de solidariedade ao aliado político.

Apesar da pressão internacional, o parecer de Gonet demonstrou que a PGR não se intimidou com as ameaças de Trump e reforçou que Bolsonaro agiu de forma dolosa e persistente para corroer os pilares republicanos e se manter ilegitimamente no poder.

O apoio de Trump fortalece o discurso bolsonarista de perseguição política, porém, internamente, a oposição se dividiu. Empresários, antes aliados de Bolsonaro, criticaram duramente a postura do ex-presidente e de seu filho 03, acusando-os de “rifar o Brasil” por interesses pessoais. Tarcísio, inicialmente crítico ao governo Lula e alinhado com a narrativa bolsonarista, suavizou o discurso. Agora, defende “união de esforços” com o governo federal para enfrentar os impactos do tarifaço.

Esse foi o tom do discurso de Tarcísio na reunião de ontem com empresários paulistas e com o representante da Embaixada dos EUA, Gabriel Escobar, para tratar do assunto. Essa guinada irritou profundamente Eduardo, que acusou o governador de “subserviência servil às elites” e de “trair os interesses nacionais”. Nas redes sociais, criticou duramente Tarcísio: “Prezado governador, se você estivesse olhando para qualquer parte da nossa indústria ou comércio, estaria defendendo o fim do regime de exceção que irá destruir a economia brasileira e nossas liberdades”.

Leia mais: Eduardo ataca Tarcísio por diálogo com empresários sobre tarifa dos EUA

Líderes do Centrão foram procurados por empresários descontentes com a posição de Bolsonaro a favor das pressões de Trump. Em sério risco de perder um mercado importante por causa de uma disputa pessoal, pressionam Tarcísio para se diferenciar do radicalismo bolsonarista e preservar sua base econômica , mantendo diálogo institucional com o governo federal. As reiteradas manifestações de Trump, porém, sinalizam que a crise deve se prolongar durante todo o julgamento de Bolsonaro.

Com a entrega das alegações finais pela PGR, abre-se prazo de 15 dias para que as defesas apresentem seus argumentos. Concluída esta etapa, Moraes deve marcar o julgamento para setembro.

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Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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