Rios da vida

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Desde tempos imemoriais e por motivos óbvios, a humanidade buscou se estabelecer e desenvolver as cidades ao longo dos cursos de água potável. Dessas civilizações antigas, fundadas às margens dos rios (civilizações potâmicas), o destaque são os egípcios, ligados ao Rio Nilo; os mesopotâmicos, fixados no vale fértil entre os rios Eufrates e Tigre; e os indus, assentados ao longo do sagrado Rio Ganges.

Aqui no Brasil, o grosso das nações indígenas também ergueu as aldeias próximas aos grandes cursos d’água doce. A relação de dependência da água era reconhecida e por isso mesmo os rios eram adorados como verdadeiras divindades, fertilizando e irrigando as terras, tornando-as propícias para a prática da agricultura, a pesca, os transportes, a fabricação da cerâmica, entre outras dádivas de vida trazidas pelas corredeiras de água. É sabido ainda que algumas culturas simplesmente desapareceram devido às secas prolongadas e à consequente extinção dos cursos d’água, como parece ser o caso de Ankor, na Ásia, um complexo urbano erguido no século 8º, com uma área que se estendia por aproximadamente 650km, onde viviam mais de 750 mil habitantes.

Milhares de anos depois, a humanidade continua dependendo dos mesmos recursos naturais, mas com uma diferença significativa e preocupante: o aumento da população e o consequente aumento da produção de bens têm levado não só ao esgotamento acelerado dos recursos, mas, sobretudo, têm provocado crescente poluição das águas, tornando-as impróprias para o consumo humano. Ironia das ironias é ver São Paulo, a maior e mais rica das cidades da América do Sul, sofrer com os rigores da falta de água provocada pela estiagem prolongada que simplesmente secou e exauriu grande parte dos reservatórios de água potável. Pois essa mesma cidade é cortada, quase ao meio, pelo caudaloso Rio Tietê, convertido agora em um enorme esgoto a céu aberto.

O descaso com esse importante rio paulista também se repete Brasil afora, já afetando até o maior rio do planeta em volume d’água, o Amazonas. O Nordeste convive hoje com a maior seca dos últimos 30 anos. Pelos cálculos do Ministério da Integração Nacional, mais de 100 importantes cidades nordestinas estão enfrentando sério colapso no abastecimento. A escassez de água tem prejudicada a agricultura e a geração de energia. Projetos importantes como a produção de frutas ao longo do Rio São Francisco estão sendo reorganizados ou abandonados, tragados pela seca incomum. Cerca de 50 milhões de brasileiros nas regiões Sudeste e Nordeste estão com o fornecimento de água e luz comprometidos ao extremo.

Trata-se de situação que, segundo especialistas, só tende a se agravar. Para um país que até  pouco tempo atrás se gabava da quantidade e variedade de suas bacias hidrográficas, a situação está no vermelho. O pior é que tanto o governo quanto a população parecem indiferentes ao quadro e seguem ou com políticas insuficientes para o problema ou, no caso da população, consumindo nos mesmos níveis anteriores.

Circe Cunha

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Circe Cunha

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