Estacionamentos privados: cuidados com os abusos

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Basta uma placa para representar o desrespeito ao direito do consumidor. Em estacionamentos pagos, é comum ver o alerta: “Não nos responsabilizamos pela perda ou dano de objetos deixados dentro do veículo”. O aviso é abusivo e, ao contrário do que diz, vale também para avarias na parte externa do carro. Isso porque, a partir do momento em que alguém deixa o bem em um ambiente com cobrança, estabelece-se o dever de guarda. A recomendação é de que o condutor guarde os registros de entrada e saída do estacionamento ao buscar a reparação.

Em algumas unidades da Federação, como São Paulo, a placa afixada ou a cláusula de não responsabilidade incorre em crime. No Distrito Federal, não há legislação que estabeleça punição em caso de colocação dos dizeres, mas todos os estabelecimentos estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor. O Artigo 14 do CDC trata justamente da questão, quando define que a reparação pelos prejuízos é de responsabilidade do fornecedor.

O sistema de câmeras de segurança é um recurso a favor de ambas partes, quando se trata da relação de consumo em estacionamentos pagos. O circuito interno registra a entrada e a saída do veículo e o que ocorreu com ele durante o tempo em que esteve no local. Para a empresa, é uma forma de se resguardar de possíveis atitudes de má-fé dos usuários. “Se não houver as filmagens da câmera, é prova e contraprova”, alerta Fabíola Meira, professora da pós-graduação em direito das relações de consumo da PUC-SP e sócia coordenadora do Departamento de Relações de Consumo do Braga Nascimento e Zilio Advogados Associados.

Justiça

Em caso de haver objetos ou equipamentos pessoais ou sob responsabilidade do cliente, recomenda-se produzir uma declaração de bens ao estabelecimento. Se a empresa não tiver o documento, vale até mesmo informar um funcionário do que está guardado no porta-malas, por exemplo. “O ideal é que o consumidor informe sempre, seja por meio documental, seja mostrando a um responsável pelo estacionamento os objetos que ali estão”, ensina Fabíola.

Desrespeito foi o que viveu Maria Luiza Albuquerque Gomes Nolasco, 28 anos. Em abril do ano passado, ela deixou o carro em um estacionamento pago, no Setor Hospitalar Sul, e, quando retornou, descobriu que uma mochila havia sido furtada. “Tinha consulta no dentista e, no momento em que deixei o carro, o vidro elétrico não funcionou. O funcionário do estacionamento disse que cobriria o veículo com uma lona, pois não havia ninguém para ficar vigiando”, conta. Menos de uma hora depois, ela voltou ao veículo e descobriu que a lona, o funcionário e a mochila não estavam lá. “Parei a cerca de 5m da guarita. Dei falta da mochila assim que saí do estacionamento. Então, retornei e avisei sobre o furto”, lembra.

Ainda que tenha pagado pelo serviço, a diretora de marketing teve de ouvir da gerente do local que, por ter dado falta após cruzar a cancela, não poderia exigir ressarcimento. “Voltei lá no dia seguinte e conversei com o funcionário, que garantiu à chefia ter visto a mochila no carro. Ela alegou que o lugar não tinha câmeras e, portanto, não haveria como provar nada.”

O caso parou na Justiça. “Durante a audiência, os advogados da empresa disseram que eu mentia. O juiz se recusou a pedir a liberação das imagens de câmera de segurança de uma clínica em frente ao estacionamento e não me concedeu o ressarcimento. Também não houve conciliação e, no fim, ainda fui obrigada a pagar os honorários dos advogados da empresa”, revolta-se. Para ela, pior do que o prejuízo ou o desgaste foi o fato de não ter o direito de consumidora respeitado. “Senti-me lesada, não fui levada a sério”, reclama.


Indevido

Mesmo em situações mais sutis, é preciso estar atento. Isso porque a cobrança indevida de tarifas de estacionamento é bastante recorrente. No Distrito Federal, é o principal motivo que leva os consumidores ao Instituto de Defesa do Consumidor (Procon) para registrar queixas. Dos 55 atendimentos realizados no órgão neste ano sobre o tema, 16 tratavam de cobrança abusiva. Ela ocorre quando o estabelecimento cobra a tarifa inteira por hora fracionada, ou seja, o cliente permaneceu menos de uma hora no estacionamento, mas paga o referente a 60 minutos. “É um problema que ocorre em todas as unidades federativas”, destaca o diretor-geral do Procon-DF, Paulo Marcio Sampaio.

Ao serem comparados com a frota do DF, hoje em 1,5 milhão, os atendimentos estão dentro do que se considera aceitável. No caso de cobrança indevida, a recomendação é guardar os bilhetes de entrada e saída e o comprovante de pagamento para acionamento do Procon-DF. “A lei determina que a cobrança seja por minuto. Se isso não ocorrer, o cliente deve se cercar de provas da relação de consumo e, então, procurar o órgão para pedir o ressarcimento. O CDC é bastante claro quando coloca que é preciso ser comprovada a interação”, diz.

Cuidados:

O que fazer…

Quando o carro sofre avarias dentro do estacionamento?

A responsabilidade é do estabelecimento, caso o veículo tenha sido arranhado ou batido enquanto estava lá estacionado.

Recomendação: pedir ao estabelecimento as gravações das câmera de segurança para comprovar a colisão e, então, pedir ressarcimento. Se o carro tiver seguro, a empresa paga o acionamento da franquia.

Quando objetos dentro do veículo são extraviados?

O ideal é o cliente informar ao estabelecimento, antecipadamente, quando houver bens ou equipamentos pessoais ou sob responsabilidade dentro do carro. Isso pode ser feito por meio de uma declaração de bens ou da apresentação dos objetos a um funcionário.

Recomendação: registrar boletim de ocorrência e confrontar empresa com a declaração de bens para requerer ressarcimento.


Quando se perde o tíquete de estacionamento?

Cobrar pelo extravio do tíquete é proibido, uma vez que o cliente paga pela permanência no estacionamento, não pelo tíquete.

Recomendação: avisar ao guichê da perda e pedir a contagem do tempo de permanência por meio dos registros de entrada do veículo. Se a empresa insistir na cobrança pelo tíquete, cabe indenização por danos morais.

Quando ocorrem assaltos a clientes dentro do estacionamento?

Ainda não há jurisprudência sobre essa situação. Alguns tribunais entendem que o estabelecimento não é responsável pela segurança pessoal dos clientes.Outros, no entanto, consideram que a responsabilidade por crimes ocorridos no interior deles é, sim, responsabilidade da empresa.

Recomendação: registrar ocorrência para requerer ressarcimento dos objetos roubados. Cabe indenização por danos morais.

Reportagem de Maryna Lacerda