ROSANA HESSEL
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, foi categórico ao afirmar que a meta principal da autoridade monetária é combater a inflação e, por conta disso, o BC pretende continuar elevando os juros o quanto for necessário para ancorar as expectativas do mercado, adotando um ciclo mais contracionista. Apesar de negar prever recessão no país em 2022, o presidente do BC sinalizou que, se necessário, continuará elevando os juros, em detrimento da atividade, e admitiu que não sabe qual será a taxa básica de juros (Selic) no fim do ciclo de alta iniciado em março.
“Os exemplos brasileiros mostram que você tem que colocar o país em recessão para recuperar a credibilidade”, afirmou Campos Neto, nesta quinta-feira (16/12), durante entrevista virtual com jornalistas sobre o Relatório Trimestral de Inflação (RTI). Ele admitiu a necessidade de o BC continuar elevando os juros para conter as expectativas. “Tudo está muito relacionado em um país como o Brasil com herança inflacionária recente. E entendemos que, para assegurar a inflação no centro da meta, é muito bom avançar nesse processo de normalização e passar a mensagem de que vamos seguir a meta. O processo vai se estender até quando as expectativas fiquem ancoradas”, emendou.
No Relatório de Inflação deste mês, o Banco Central reduziu as previsões de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano e do próximo, mas ainda tem perspectiva de inflação para 2022 bem abaixo das estimativas do mercado, que apontam para novo estouro da meta e Campos Neto reforçou que o objetivo central será ancorar as expectativas, e, nesse sentido, os juros devem subir até que isso ocorra.
“Nós entendemos que a ancoragem da inflação é o elemento mais importante para estabilizar o crescimento de longo prazo, a parte fiscal. E nós entendemos que vamos de novo estar passando por um processo que, sim, você vai ter uma elevação de juros com um crescimento na margem que não é muito elevado. Mas, nós entendemos que , se isso for feito de forma a ter credibilidade e com transparência, esse é o melhor remédio para maximizar o que entendemos que são as condições ideais de crescimento futuro”, afirmou.
Apesar de sinalizar no Relatório de Inflação, com base nas previsões do mercado, uma taxa básica de juros de 11,75% ao longo de 2022, devendo recuar para 11,22% no fim do ano, o presidente do BC reconheceu que ainda não é possível afirmar qual será o juro no final do ano. “Ainda não sabemos qual é a taxa terminal, que pode demandar um ciclo mais longo”, afirmou. Ele, inclusive, minimizou o impacto da inércia inflacionária em 2022 e evitou dar uma estimativa desse impacto, mas sinalizou que um dos motivos de um ciclo de aperto monetário mais prolongado será a piora no cenário fiscal. “Se tiver novas notícias que levem à interpretação de nova piora no fiscal, isso não faz parte do nosso cenário central”, disse.
Sem metas secundárias
Campos Neto reforçou que a meta primária do BC é o controle da inflação e, nesse sentido, as metas secundárias não estão no radar e não haverá metas para elas. Logo, a instituição não pretende direcionar esforços com as metas secundárias, como de emprego e de atividade econômica, porque essas metas estão relacionadas ao controle da inflação.
“Nós entendemos que a meta de emprego e suavização dos ciclos estão muito relacionadas com a inflação em um país como o Brasil. Temos experiência de que a inflação se transforma em um imposto muito cruel para as pessoas de renda mais baixa, corrói a renda de forma assimétrica, desorganiza o setor produtivo e cria dificuldades para as empresas de funding financiarem projetos de longo prazo”, disse o ministro. Ele lembrou que com a incerteza de financiamento de curto prazo das empresas, o mercado de capitais também encolhe, dificultando o acesso a crédito de grandes empresas.
Em relação ao discurso da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), Campos Neto reforçou que o objetivo do colegiado é buscar um aumento dos juros para ancorar as expectativas dentro de “um horizonte relevante”, olhando para as metas de 2022 e 2023. “A gente segue o padrão normal e a essa altura damos um peso igual a 2022 e a 2023”, declarou.
O diretor de Política Econômica do BC, Fabio Kanczuk, reforçou a declaração de Campos Neto focando na ancoragem das expectativas para a meta. “(As previsões de inflação do mercado) Estão acima da meta e demandam uma política monetária sensivelmente contracionista”, afirmou. “O Banco está preocupado com a ancoragem das expectativas e isso está muito claro no comunicado”, reforçou. Apesar da queda nas previsões para o PIB deste ano e do ano que vem, o Banco Central não prevê um cenário de recessão, “mas de crescimento baixo”.
Para Campos Neto, a piora no quadro fiscal não faz parte do panorama do cenário básico do BC, mas reconheceu a piora nas expectativas por conta da deterioração do arcabouço fiscal por conta da PEC dos Precatórios. “Houve piora nas expectativas e quando vemos um crescimento estrutural mais baixo, ao longo dos últimos tempos, seja mais baixo, e com inflação mais elevada, há uma convergência para que o resultado fiscal fique pior no longo prazo”, afirmou.
Erros de avaliação
Ao ser questionado sobre os erros na condução da política monetária ao deixar a taxa básica de juros (Selic) em um patamar muito baixo, de 2% ao ano, por um período muito longo, Campos Neto justificou que, “naquela época”, os bancos centrais trabalhavam com um cenário de depressão econômica. “Nós reajustamos as expectativas à medida que os dados foram surgindo”, afirmou.
Na avaliação do ministro lembrou que o BC brasileiro saiu na frente dos demais bancos centrais ao iniciar o ciclo de aumento dos juros básicos quando percebeu que a inflação não era temporária e não era apenas resultado de choque de oferta.
Kanczuc, por sua vez, admitiu que há uma “dificuldade enorme” para o BC fazer previsões para o hiato do produto, atualmente em -2,1%, e os juros neutros, que passou de 3% ao ano para 3,5%. Contudo, disse que as surpresas recentes não estão relacionadas às dificuldades de estimar esses dados.