Trem da alegria embarca no Tribunal de Contas da União

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O Tribunal de Contas da União (TCU), que serve de referência para as boas práticas no serviço público, deu um péssimo exemplo ao arrombar a porta para um trem da alegria de seus funcionários. O órgão autorizou que servidores da área administrativa — como nutricionistas, psicólogos, médicos, bibliotecários, enfermeiros, analistas de sistemas, programadores — passem a ter o mesmo tratamento das carreiras de Estado, hoje restrito aos auditores de controle externo.

Com isso, cerca de 200 profissionais que nada têm a ver com as atividades fins do TCU poderão participar de auditorias, fiscalizar órgãos e autarquias federais e empresas estatais. Terão poder, inclusive, para supervisionar os auditores nas fiscalizações e arquivar representações que propõem investigações. Esses mesmos servidores poderão, ainda, exercer cargos de diretoria nas unidades técnicas finalísticas do órgão de instrução e fiscalização, que reúne atividades finalísticas de supervisão de todas as fases de fiscalização (planejamento, coordenação e execução).

Segundo auditores do TCU, a Resolução nº 332, de 6 de outubro de 2021, na prática, retira daqueles que são alvos do Tribunal o direito de serem fiscalizados e terem seus processos instruídos por agentes legalmente aptos ao exercício das atividades de fiscalização e instrução processual, cujo resultado afeta direitos subjetivos dos jurisdicionados, questão já reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pela Justiça Federal.

As decisões do TCU vão além: o órgão abriu a possibilidade de os gabinetes de ministros terem um servidor de fora do quadro próprio de pessoal exigido desde a Constituição de 1946, mesmo que oriundo de um ministério, de uma autarquia ou de estatal alvo de fiscalização. Isso significa dizer, por exemplo, que um funcionário do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ou da Petrobras pode ser requisitado para atuar no TCU, em flagrante conflito de interesse. A resolução segue na contramão do requerimento aprovado pela CPI da Covid, que recomendou ao TCU requisitar todos os auditores cedidos aos órgãos fiscalizados, de forma a prevenir conflito de interesses.

O problema da resolução é que essa pessoa terá acesso a processo bilionários de interesse do governo referentes a órgão, à empresa ou à autarquia de origem, que ficará responsável para o pagamento do salário durante todo período da cessão ao Tribunal. Mais adiante, voltará para o posto original carregado de informações privilegiadas. Isso se, enquanto estiver no TCU, não interferir em favor do órgão ou entidade que o cedeu. Afinal, é para lá que voltará quando não mais servir ao Tribunal.

A reação contrária à Resolução nº 332, do TCU, é enorme entre os auditores. Tanto que a Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC) convocou reunião extraordinária para 11 de outubro a fim de definir as ações a serem adotadas contra o Tribunal.

Já está certo que o Congresso Nacional e o Judiciário devem ser acionados. Para a entidade, as decisões do TCU fragilizam os 33 Tribunais de Contas do Brasil, ao dar um mau exemplo.

Brasília, 16h41min

Vicente Nunes