Trabalhadores aceitam acordo

Compartilhe

POR HAMILTON FERRARI

A flexibilização de normas trabalhistas é aceitável e até mesmo defendida por trabalhadores, com a ressalva de que alguns princípios sejam respeitados. Para a gerente financeira Viviana Ferreira, 30, é preciso olhar com cuidado os interesses específicos de cada grupo, seja do ponto de vista econômico, seja do político. Ela destaca que direitos importantes conquistados não podem ser eliminados. “Não se pode voltar atrás no 13º salário, por exemplo, uma compensação da alta quantidade de impostos pagos pelos trabalhadores”, relata. Viviana vê com bons olhos os acordos feitos entre empresa e empregados sem a interferência do Estado. “O combinado é vantajoso. Não vejo necessidade de ter uma lei rígida”, pondera.

Para a servidora pública Helenice Costa, 52 anos, a reforma trabalhista já deveria ter sido feita há muito tempo. “A nossa CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) é muito antiga, já tem mais de 70 anos”, observa. Entre os principais pontos que já deveriam estar em vigor, na opinião dela, está a maior liberdade entre acordos de empresa e trabalhador. “Se estiver dentro da lei, um acerto entre o empregador e o empregado é o melhor. Pode ser bom para as duas partes”, diz.
Helenice acredita que a possibilidade de negociação e a legislação menos rígida podem dar resultados e rendimentos melhores para os funcionários e para a empresa. Na avaliação dela, os acordos devem englobar a hora extra, a compensação de trabalho, bancos de horas e férias. “Se o trabalhador topar trabalhar no fim de semana no comércio, por exemplo, não há motivos para isso ser vedado. Será bom para a empresa, que terá mais um dia de venda, e para o empregado, que está fazendo a atividade por vontade própria, sendo remunerado por isso”, afirma.

A enfermeira Luanna Castro, 30, é a favor de atualização das leis trabalhistas, desde que se aprimorem direitos. Ela vê com restrições qualquer proposta do governo de Michel Temer. Na atual gestão, diz ela, as mudanças vão atingir conquistas da CLT. “Não acredito no discurso de melhora na economia e nas condições de trabalho”, diz.
Apesar de não ser afetado por eventuais mudanças, o aposentado Valdir Fonseca, 63, apoia a reforma trabalhista. Ele acredita que alguns gastos, como horas extras, podem quebrar qualquer negócio. A flexibilização e os acordos, diz, permitem que a empresa dê mais condições de trabalho e capacitação aos empregados. “Tantos benefícios acabam prejudicando as empresas no Brasil, que migram para outros países”, afirma.

Resistência

A ideia de alterar as leis trabalhistas enfrenta grande resistência nos sindicatos de trabalhadores, sobretudo os que são mais próximos ao PT, partido da presidente afastada, Dilma Rousseff. Representantes da Força Sindical, que tem mantido diálogo com o governo interino, foram procurados, mas não retornaram as ligações.

Para a secretária nacional de Relações de Trabalho da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Graça Costa, não há necessidade de fazer grandes mudanças, mas sim garantir os direitos existentes. “A reforma do governo golpista é para retirar direitos. Isso se percebe em diversos projetos que estão em tramitação no Congresso Nacional, como o da terceirização, que vai impactar drasticamente a economia brasileira e as relações de trabalho”, critica.

Ela alerta para o risco de que conquistas como o 13º e horário de almoço, que existem há décadas, sejam eliminadas. A CUT se organiza para realizar uma greve geral contra Michel Temer e em defesa da garantia dos direitos trabalhistas. “Se não nos mobilizarmos, haverá retrocesso de séculos. As pessoas que estão no poder são extremamente conservadoras. Não têm empenho em melhorar as relações de trabalho, os direitos sociais, os direitos humanos. Vai ser uma avalanche”, argumenta.

O diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudo Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, diz que a agenda de flexibilização trabalhista não é novidade e aparece frequentemente nos momentos de crise. Para ele, é sempre válido realizar modernizações que visam melhorar a proteção social e aumentar as condições de trabalho. “Há que se ter adequações para que o direito seja cumprido na integridade e adaptado nas organizações econômicas”, afirma.

O que não pode ocorrer é o rebaixamento ou a destruição de direitos, na visão de Ganz. Segundo ele, o movimento sindical está sempre aberto a mudanças, mas que não diminuam o padrão estabelecido nos últimos 70 anos. “Cada proposta vale uma análise do contexto e do sentido na aplicação”, pontua. A organização de acordos entre os trabalhadores sempre foi um pedido do movimento sindical, segundo Ganz. Os que ampliam os direitos dos trabalhadores devem prevalecer. “Se for possível acertar um patamar superior e melhor, é válido. A lei é o piso do que deve acorrer”, destaca.

Desocupação elevada

A taxa de desemprego não para de crescer no país, e deve atingir 13% até o fim do ano, segundo expectativas do mercado. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há 166,3 milhões de brasileiros em idade de trabalhar. Mas apenas 90,8 milhões estão ocupados. A diferença inclui os 11,6 milhões de desempregados, mas também os 63,9 milhões que estão simplesmente “fora da força de trabalho”. Uma parcela mínima dessas pessoas decidiu ficar de fora para se dedicar exclusivamente à faculdade, por exemplo. Predominam os nem-nem, que estão ausentes do trabalho e do estudo.

Brasília, 07h08min

Vicente Nunes