TESOURO AINDA NÃO PASSOU NO TESTE

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Muita gente do governo anda se vangloriando, nos bastidores, do clima de certo otimismo difundido pelo mercado financeiro. Acredita-se que a presidente Dilma Rousseff conseguiu quebrar a resistência que os investidores têm em relação a ela ao nomear Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda. Não há dúvidas de que, desde que o ano começou, os preços do dólar e o comportamento da bolsa de valores indicam um voto de confiança na promessa da nova equipe econômica de fazer um ajuste fiscal consistente e de corrigir, senão todos, os principais erros cometidos nos últimos quatro anos.

Mas há uma distância grande entre o sentimento e a razão dos investidores. A despeito da boa vontade com a nova versão de Dilma, ninguém está disposto a pagar para ver. Isso ficou claro no leilão de títulos públicos realizado ontem pelo Tesouro Nacional. Pensava-se, entre auxiliares de Levy, que a simples substituição de Arno Augustin por Marcelo Saintive no comando do secretaria seria suficiente para derrubar os juros exigidos pelo mercado para financiar o governo. O que se viu foi exatamente o contrário. As taxas subiram e saíram na máxima do dia.

As Letras do Tesouro Nacional (LTN), com vencimento em janeiro de 2019, foram vendidas com encargos de 12,45% ao ano. Já os papéis com resgate previsto para abril de 2016 saíram com juros anuais de 12,69% e os de julho de 2017, com rendimento de 12,47%. Essas taxas, no entender do economista Roberto Luiz Troster, indicam que o mercado está exigindo prêmios maiores para cobrir eventuais decepções que possam a vir do governo, sobretudo no controle da inflação. “Não se pode esquecer de que os últimos quatro anos de Dilma foram ruins demais. Por mais que a nova equipe econômica prometa corrigir os erros, falta convicção entre os investidores. Hoje, ainda são poucos os que acreditam, de verdade, em um ajuste fiscal consistente”, diz.

Nas mesas de negócios dos bancos, é possível medir, pelo discurso dos operadores, o grau de confiança em relação ao governo. “Parou de piorar”, resume um funcionário de uma instituição estrangeira. “Depois de tudo o que vimos no primeiro governo de Dilma, levará tempo para que os investidores saiam da retaguarda. Enquanto isso não ocorre, eles continuarão cobrando caro para financiar a dívida pública”, emenda um executivo de um dos maiores bancos nacionais.

A boa notícia, destaca um terceiro integrante do mercado, é que talvez não vejamos, nos próximos leilões, dificuldades do Tesouro em vender seus títulos. “No ano passado, por diversas vezes, o órgão foi obrigado a suspender a oferta de papéis devido à disparidade de taxas apresentadas pelo mercado, fruto da desconfiança provocada pelo governo”, explica.

As divergências entre o Tesouro e seus credores foram tantas, que quase R$ 1 trilhão, o equivalente a um terço da dívida pública em poder do mercado, ficaram sem lastro e tiveram que ser retirados do sistema pelo Banco Central por meio de operações de curtíssimo prazo, ressuscitando o overnight dos tempos da hiperinflação.

Mão pesada do BC

A desconfiança ainda latente em relação ao governo forçará o Banco Central a manter a mão pesada sobre a taxa básica de juros (Selic). Na avaliação de Roberto Troster, se fosse olhar apenas para o ritmo da atividade econômica, que está no chão, o Comitê de Política Monetária (Copom) teria que cortar os juros. Mas, diante de todos os problemas criados por Dilma Rousseff desde 2011, a taxa terá que continuar subindo. Na próxima quarta-feira, deverá passar dos atuais 11,75% para 12,25% ao ano. O aumento de 0,5 ponto percentual ajudará a contrair ainda mais o consumo e a produção. “Infelizmente, não há outra alternativa. A inflação será muito alta no primeiro semestre de 2015, ficando, sistematicamente, acima do teto da meta, de 6,5%. Sendo assim, não há como o BC parar de subir ou cortar os juros agora. Perderia totalmente a credibilidade”, frisa. “Eu, particularmente, vejo a Selic chegando aos 13% ao ano.”

Alimentos pesam mais

Os economistas do Bank of America Merrill Lynch acreditam que a queda dos preços dos alimentos será mais importante para derrubar a inflação nos países emergentes do que o forte tombo do petróleo. Além do peso maior dos alimentos no cálculo dos índices que medem a carestia — em média, o grupo alimentação responde por 27% da inflação e o de energia, 9% —, o valor da comida impacta mais rapidamente o orçamento das famílias e contamina, numa velocidade maior, os demais preços da economia.

Brasil sem benefícios

Os pesquisadores do Bank of America Merrill Lynch fazem um alerta: entre os emergentes, Brasil, Rússia e Turquia serão os que menos se aproveitarão da onda mundial de baixa do petróleo e dos alimentos. Quer dizer: a inflação nesses três países continuará pressionada, seja pela necessidade de correção de tarifas públicas, seja por equívocos na condução da política econômica. O Brasil, aponta o bancão norte-americano, fechará 2015 com carestia de 6,2%. Na Rússia, o custo de vida baterá em 9,1% e, na Turquia, em 7,2%.

Os Malufs em Aspen

A família Maluf está fazendo a festa em Aspen, nos Estados Unidos, a estação de inverno mais badalada do mundo. Somente em aulas privadas de esqui, gastou US$ 24 mil, pela cotação de ontem, o equivalente a R$ 63,4 mil.

Brasília, 00h15min

Vicente Nunes