ROSANA HESSEL
Em meio à confusão do Orçamento de 2021 aprovado pelo Congresso Nacional na última quinta-feira (25), aumentando os riscos de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e sem condições de ser executado, a equipe econômica conseguiu fazer uma ginástica contábil, que permitiu reduzir a necessidade de financiamento para cumprir a regra de ouro neste ano em mais da metade, para R$ 125,7 bilhões. Foram feitos vários abatimentos nesse buraco fiscal, de R$ 444,1 bilhões atualmente, por meio de superavit do Banco Central, dividendos e devoluções do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Prevista no artigo 167 da Constituição, a regra de ouro impede, basicamente, que o governo emita títulos da dívida pública para cobrir despesas correntes, como salários e aposentadorias. Devido aos rombos consecutivos nas contas públicas desde 2014, essa norma fiscal, antes ignorada, ficou evidente nos últimos anos, e só não foi descumprida pelo governo no ano passado por conta do decreto de calamidade.
Conforme a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano, existe uma buraco de R$ 451 bilhões que precisa ser coberto com emissão de títulos públicos por meio de crédito suplementar para evitar o descumprimento da regra de ouro. Por conta disso, a equipe econômica condicionou várias despesas no mesmo valor para o cumprimento dessa norma. Com isso, o pagamento desses gastos, obrigatórios e discricionários, ficou sujeito à autorização de créditos suplementares pelo Congresso Nacional para que o Tesouro possa emitir títulos da dívida cobrir essas pendências.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) deste ano condicionou, por exemplo, R$ 272,1 bilhões em gastos previdenciários, R$ 167,5 bilhões em salários e encargos, R$ 15,1 bilhões em sentenças judicias, R$ 21 bilhões de despesas discricionárias e R$ 2,6 bilhões em benefícios aos servidores.
Abatimento
De acordo com o secretário adjunto do Tesouro Nacional, Otavio Ladeira, a insuficiência atual para o cumprimento da regra de ouro está em R$ 444,1 bilhões, que é o resultado da diferença entre as despesas com capital, como investimentos, inversões financeiras e amortizações, de R$ 1,730 trilhão, e as receitas com operações de crédito, de R$ 2,174 trilhões.
“Essa é a nossa estimativa atualizada, mas, considerando os abatimentos permitidos, de R$ 318,4 bilhões, chegamos a R$ 125,7 bilhões, que o tamanho da insuficiência no momento. Se nenhuma despesa nova surgir, esse é o valor que deverá constar no projeto de lei para solicitar ao Congresso permissão para a emissão de crédito suplementar para cumprir a regra no exercício de 2021”, contou Ladeira, nesta terça-feira (30/03), durante a apresentação do resultado das contas públicas de fevereiro.
O técnico explicou que nesses R$ 318,4 bilhões estão incluídos R$ 197,7 bilhões de superavit nas contas do Banco Central em 2020 e R$ 100 bilhões de devoluções de aportes da União no BNDES programadas para este ano, incluídos os R$ 38 bilhões já devolvidos pela instituição no início deste mês.
Os R$ 20,7 bilhões restantes serão provenientes de “outras fontes de superavit financeiro” que estão sendo discutidas, como dividendos e operações de crédito. Ladeira aida destacou que é preciso manter os “esforços para a consolidação fiscal, “pois a regra de ouro será um desafio nos próximos anos”.
Projeções para a dívida
De acordo com o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, as projeções para a evolução da dívida pública bruta em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) mostram um cenário mais animador após a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Emergencial, que regulamenta alguns gatilhos de redução de despesas para os governos federal e regionais para cumprir o teto de gastos e ainda prevê redução subsídios para 2% do PIB até 2030, em um cenário mais otimista.
No cenário pré-PEC, o Tesouro previa a dívida bruta chegaria a 85,6% do PIB em 2030 após atingir o pico de 89,9% em 2026. Já no cenário otimista, poderá chegar a 72,5% do PIB, no fim da década.
O cenário base, considerando a premissa a não renovação de gastos tributários que forem perdendo vigência, a dívida bruta poderá chegar a 83,3% do PIB em 2030. O Tesouro prevê que a dívida bruta em 88,1% neste ano para todos os dois cenários.