BERNARDO BITTAR
Pelo segundo ano consecutivo, a principal Corte do país inicia os trabalhos sob pressão. Em 2017, estava nas mãos da já presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, a homologação da delação da Odebrecht batizada de “Delação do Fim do Mundo”. Os ministros ainda estavam em choque com a morte de Teori Zavaski, e o Ministério Público cobrava investigações. Um ano depois, outros assuntos delicados prometem movimentar novamente os corredores do Supremo após o fim do recesso. Advogados querem que os ministros apreciem temas polêmicos ainda este mês, mas integrantes da Corte não querem se comprometer sem o aval da presidente. Mudanças na pauta de fevereiro são aguardadas, mesmo sem a prévia sinalização de Cármen Lúcia.
A partir desta quinta-feira (1º/02), com a retomada das atividades no Supremo, ganham atenção o debate sobre a execução da pena dos condenados em segunda instância, motivado pela condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), e a desgastada posse da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) como ministra do Trabalho, após seis pedidos rejeitados pela Justiça. O resultado dos julgamentos pode respingar de forma negativa no Supremo, por isso, as decisões precisam ser tomadas com cuidado. A ministra Cármen Lúcia terá a opinião mais importante em todos os casos, além do poder de incluir os processos na pauta se achar necessário.
Contrário ao entendimento do Supremo sobre a execução da pena dos condenados em segunda instância, o ministro Marco Aurélio Mello disse que não vai cobrar que a presidente da Corte antecipe as discussões. Ele é relator da ação que tenta mudar o entendimento, protocolada pelo PEN, e liberou o caso para julgamento no começo de dezembro. “Em quarenta anos de órgãos colegiados, eu nunca pedi a nenhum presidente para pautar algum processo. A minha parte eu faço, que é liberar para julgamento. Tenho sempre cerca de 50 processos liberados, que ficam a critério da Presidência para serem pautados”, afirmou Marco Aurélio.
O tema voltou a ser tratado como urgente porque integrantes do STF acreditam que é preciso decidi-lo de forma permanente antes de uma eventual prisão do ex-presidente Lula — condenado pelo TRF-4 a 12 anos e um mês de detenção. Ao condenar o ex-presidente, os desembargadores citaram o entendimento do STF sobre o tema para determinar que a pena seja executada — ou seja, que Lula seja preso — assim que se esgotarem os recursos ao próprio Tribunal. Cármen Lúcia disse que pautar o processo em virtude de um caso específico, o do petista, seria “apequenar” o Supremo, negando a discussão em fevereiro. Para o ministro Luis Roberto Barroso, “um país que vai alterando a jurisprudência em função do réu não é um estado de Direito, mas um estado de compadrio”.
“O Supremo tem sido muito volátil, apontando direções distintas em curto espaço de tempo. Sem pauta, teria a possibilidade de prisão após embargos de declaração. Inelegível, em tese, Lula já está. O que pode vir a acontecer é que, se o PT quiser insistir com a candidatura, o pedido de registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é possível. Os atos de campanha, sem ele preso, são possíveis. Mesmo condenado. É importante dizer que é possível”, afirma o advogado Francisco Emerenciano, especialista em direito eleitoral.
Ministério
Já o Palácio do Planalto — o presidente Michel Temer está confirmado para a reabertura dos trabalhos no STF — luta pela posse da deputada Cristiane Brasil como ministra do Trabalho, mesmo após seis decisões da Justiça. Para o ministro Carlos Marun, da Secretaria de Governo, “deve haver certa limitação nos temas justamente para não se falar em ativismo judicial”. Ele acredita que a Justiça “terá muito trabalho, até por causa de todo esse protagonismo”. “Estamos vendo esses casos, todos de grande repercussão, com a necessidade de um veredito. O que não pode acontecer é essa intromissão de um poder dentro de outro. Cada um em seu quadrado. Aí dá certo”, afirmou.
Marun acredita haver “um grande problema, porque a decisão é privativa do presidente da República e não deveria ser desrespeitada pelos juízes”. Quanto à possibilidade de prisão imediata após decisão em segunda instância, baseado no caso de Lula, o ministro acredita que “o entendimento será feito por instância competente. A lei é praticamente autoexplicativa. O que eu entendo é que é absolutamente necessário que se retome a observância ao que está claramente escrito na lei”.
Integrantes do PTB na Câmara estão se mobilizando para tentar encontrar um “plano B” caso a posse de Cristiane, de fato, seja impugnada pela Justiça. O processo está em posse da presidente Cármen Lúcia, que avocou a competência para si. Segundo o presidente do partido e pai de Cristiane, o deputado cassado Roberto Jefferson, a expectativa é de que “o processo esteja resolvido até a próxima segunda-feira (05/02)”. Confiante, a deputada afirmou que “vai trabalhar como ninguém nunca trabalhou naquele ministério”.
Brasília, 22h41min