SENHORA INFLAÇÃO

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A carestia que faz estrago no orçamento das famílias dará as caras hoje com toda a sua feiura. Se a maior parte dos analistas estiver correta, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou, em março, alta de 1,39%. Com isso, no acumulado do primeiro trimestre, a inflação medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) atingiu 3,90%, taxa sem precedentes para o período desde 2003, início do governo Lula. Em 12 meses, o salto do custo de vida será de 8,20%, o equivalente a 60% do teto da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), de 6,5%.

Qualquer que seja a comparação, os números são de assustar. Será a primeira vez, em 12 anos, que o IPCA ficará acima de 1% por três meses seguidos. Somente a energia elétrica subiu mais de 30%, aumento que foi engrossado pela alta dos combustíveis e pelos reajustes dos alimentos. O Banco Central vem pregando que a carestia dará trégua a partir de agora. Mas, no entender dos analistas, será um alívio momentâneo. Mesmo com taxas menores em abril (0,7%), maio (0,5%) e junho (0,3%), a senhora inflação continuará acima de 7% em 12 meses, podendo atingir seu ápice em agosto, ao bater em 8,4%.

Nada do que estamos vendo hoje foi obra do acaso. O custo de vida tão elevado reflete as escolhas erradas feitas pela presidente Dilma Rousseff nos quatro primeiros anos de governo. Apesar de a inflação ter ficado no teto da meta ou acima dele constantemente, pouco foi feito de efetivo para conter os reajustes. O que se viu foi um Banco Central subordinado ao Palácio do Planalto, assistindo passível à carestia aumentar, e um Ministério da Fazenda especializado em maquiagens contábeis e tarifárias. Sob as ordens de Guido Mantega, fez-se o diabo para encobrir a gastança desenfreada e segurou-se, o quanto pôde, as tarifas de energia elétrica e os preços dos combustíveis.

O estrago foi tamanho que, mesmo com a economia em recessão — estima-se tombo de pelo menos 1% do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre do ano —, a inflação não cedeu. Pelo contrário, só subiu. Nem mesmo o forte aumento das taxas de juros desde 2013 pelo BC — foram 5,5 pontos percentuais, para 12,75% ao ano — conseguiu reverter os reajustes disseminados. Estima-se que, de cada 10 produtos e serviços pesquisados pelo IBGE, em média, sete vêm tendo os preços aumentados constantemente.

A inflação elevada agrava a situação das famílias endividadas, que, desde o início do ano, têm se deparando com o desemprego. Nos cálculos do BC, quase metade da renda mensal dos lares está sendo usada para o pagamento do principal e dos juros de dívidas. Os efeitos dessa combinação perversa só não são piores porque, nos últimos anos, criou-se uma importante rede de proteção social, lembra o economista Pedro Paulo Silveira, da TOV Corretora. Mas até aqueles que recebem benefícios do governo, sobretudo os mais pobres, estão pagando caro pela fatura acumulada por Dilma no primeiro mandato.

Sensação de empobrecimento

Técnicos do Banco Central reconhecem que não há como o governo pensar em recuperar a popularidade com a inflação tão alta. É possível que, com os alimentos subindo menos até junho ou julho, o mau humor diminua um pouco. Mas nada que mude a percepção do grosso da população em relação à gestão da presidente Dilma. A carestia se prolongou por tempo demais e a queda real na renda se consolidou. A sensação de empobrecimento ganhou força. E levará tempo para que ela se dilua no tempo, pois não há perspectiva de retomada do crescimento.

Consumo esgotado

» As vendas de eletrodomésticos devem cair neste ano pela primeira vez desde 2003, preveem os economistas Fábio Silveira e Amabile Ferrazoli, da consultoria GO Associados. O recuo deve ser de 2%. Além dos juros altos, vão contribuir para esse resultado a redução da massa salarial e o aumento de preços, devido à valorização do dólar.

Atenção sobre o Confaz

» A secretária da Fazenda de Goiás, Ana Carla Abrão Costa, está otimista em relação à reunião do Conselho Nacional Política de Fazendária (Confaz), organizada por ela, amanhã e sexta-feira, em Goiânia. O encontro terá como temas principais a convalidação de incentivos fiscais, a convergência das alíquotas do ICMS e a criação do fundo para equalização das perdas dos estados. “Temos tudo para anunciarmos um acordo sobre esses três pontos”, diz.

Fundo para compensações

» Para Ana Carla, será apresentado ao Confaz um novo estudo sobre as perdas dos estados com a unificação das alíquotas do ICMS a fim de dar mais subsídios sobre o tamanho do fundo de compensação. “Estamos atualizando os dados, que serão mais fidedignos e sólidos do que os apresentados em 2011”, afirma ela, lembrando que, naquela época, o valor, em torno de US$ 100 bilhões, mostrou-se inviável.

Mãos de tesoura

» A secretária de Fazenda de Goiás, que vem tocando um duro ajuste fiscal, conta ainda que não se incomoda com o apelido de mãos de tesoura. “Faz parte da minha atividade. Neste momento, é quase um elogio, porque é preciso fazer uma gestão austera por sobrevivência.” Os estados serão vitais para o cumprimento da meta fiscal de 1,2% do PIB prometida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Perdão, leitores

» Ao contrário do que informou a coluna ontem, a Queiroz Galvão não está em recuperação judicial. A empresa que recorreu à Justiça para reestruturar sua dívida é a Galvão Engenharia.

Brasília, 00h01min

Vicente Nunes