O que causou a demissão do senhor e de toda a sua equipe? Quantas pessoas o senhor levou para a Geap?
Não tive oportunidade de saber os motivos reais da minha demissão. E quem me demitiu, nem me conhece. Ao aceitar o desafio de recuperar a Geap, fiz questão de levar profissionais especializados em planejamento, em gestão e em assessoramento. Apresentei os currículos das pessoas que indicaria. Não houve qualquer óbice. Substituí 14 profissionais, no total. Não parece muito para uma fundação que atua em território nacional e tem mais de 1.700 colaboradores. Como disse, até agora não entendi os motivos da minha demissão.
A Geap Saúde atribui a sua demissão ao áudio em que o senhor diz que médicos e hospitais roubam os planos de saúde. Isso pesou contra o senhor?
Não. Apesar de ter sido gravado em uma reunião interna e, por isso, ter mais liberdade com as palavras, o áudio tem sido usado como pretexto. Lamento que tudo isso esteja sendo provocado por um senhor autoritário, que, à revelia de normativos regimentais, ignora as atribuições do colegiado (conjunto de conselheiros) e aplica suas vontades de maneira autocrática e arbitrária. Ele me obrigou, assim como fez com a chefe da auditoria e outros colaboradores da Geap, a assinar, sumariamente, o documento de demissão. Mais um desrespeito às regras da Casa. Um conselheiro não pode demitir um empregado da Geap. Vale dizer que, em discordância com essa prática ilegal, não assinei minha demissão.
Quem convidou o senhor para assumir a Geap?
Fui convidado pelo chefe de gabinete do Ministro da Saúde. O meu currículo foi selecionado entre outros, creio eu. Imaginava que fosse para mostrar, inicialmente, a eficácia da nossa gestão à maior base de beneficiários da Geap: a de servidores do ministério. Mas, diante de tudo o que vivi, passei a não compreender mais. Por que me impediram de continuar o que começou tão bem? Gostaria de entender melhor.
O senhor tem ligação com algum político ou algum partido?
Não. Após o convite recebido e aceito, mergulhei, conforme combinado, no processo de recuperação da Geap. Fazer levantamentos e diagnósticos foi a minha rotina e a da minha equipe por longos 20 dias. Importante citar que não tínhamos briefing e outras informações sobre interesses e participações de políticos naquele ambiente. E isso se deu porque não tenho qualquer vínculo ou padrinho político. Sequer fui entrevistado por um parlamentar para ali estar.
O senhor recebeu indicações de políticos para preencher cargos na Geap? Quem são os políticos?
Tomamos conhecimento, ao longo do mês de abril, que há “territórios políticos” na Geap. Não imaginava é que seria monitorado, gravado e derrubado antes mesmo de fazer as mudanças estruturais na organização. Recebi, sim, várias indicações e recomendações para que não fossem feitas mudanças. Porém, imposições vieram mesmo do conselheiro Manoel Messias. Ele me perturbou durante dias para empregar sete pessoas sem a devida qualificação e com salários a partir de R$ 10 mil, mesmo sabendo que há um excedente de mais de 280 colaboradores.
A Geap virou um cabide de empregos?
Infelizmente. Certamente é possível e necessário profissionalizar a gestão da Geap. O que explica, em parte, o atual quadro da empresa. Em poucos dias retomamos a discussão sobre um novo plano de cargos e salários, bem como a implantação de Compliance e o desenho de um planejamento estratégico para o período de 5 anos (2018/2022). Imagina uma fundação do tamanho da Geap não ter qualquer desses instrumentos de gestão e controle devidamente implementados na sua governança? As sucessivas gestões fizeram “inchar” o quadro de colaboradores e mantiveram pessoas com muita deficiência técnica e de motivações duvidosas em postos estratégicos.
Vocês identificaram irregularidades na folha de pagamento?
Soube que empregados com as mesmas atribuições tinham salários desiguais. Confesso que me tocaram muito os problemas de RH. Sou especialista nisso. Já havia mapeado uma série de distorções, mas não houve tempo hábil de corrigi-las. A questão das diferenças salariais para atribuições semelhantes deve ser corrigida imediatamente, pois a Geap paga um preço muito alto em processos judiciais (indenizações). Há, sim, dezenas de profissionais remunerados acima dos valores adequados para seus cargos. Gozam de enquadramentos que excedem as regras previstas no plano atual. Assessor ganhando mais que assessor. Diretor ganhando mais que diretor executivo. Soma-se a isso “a estabilidade” de pessoas que, a rigor, não tem respaldo jurídico, comprometendo ainda mais a gestão da operadora.
A sua demissão foi ilegal, na sua avaliação?
Sim. Feriu todas as regras estatutárias. Admissões e demissões fazem parte do mundo corporativo, entretanto, da forma como foi realizada a demissão coletiva, para nós, caracterizou imaturidade e irresponsabilidade do conselheiro Manoel Messias O papel do Conselho de Administração não é fazer gestão, mas pensar os rumos institucionais e garantir a transparência e a credibilidade aos beneficiários da operadora. Da mesma forma, a demissão autocrática da gerente de auditoria da empresa que, havia anos, prestava esse serviço à Geap nos mesmos moldes, revela outra irresponsabilidade deste conselheiro.
Há indícios de contratos superfaturados ou desnecessários, como o IBBCA, Benner, entre outros? Que irregularidades os senhores identificaram nos 41 dias de trabalho?
A Geap não estaria passando por essas dificuldades se fosse administrada de maneira séria. Essa minha afirmativa não desmerece centenas de excelentes profissionais que, há anos, cuidam da Geap, profissionais alocados na diretoria executiva e nas gerências regionais. O problema central é de comando, com certeza. Quanto aos contratos citados, como o IBBCA, procurem esclarecer com a diretora Luciana Carvalho. Ela sabe de tudo, a começar pela contratação das empresas que prestam serviços. Ela foi uma grande aliada no repasse de algumas informações. Quando tentamos notificar e cancelar alguns contratos, verificamos o grau de dificuldade. Se essas providências forem mantidas, vão gerar economia de milhões de reais já 2018.
O senhor sabe dizer quantos contratos nocivos à Geap foram notificados?
As análises estavam sendo levadas a efeito por uma equipe técnica. Quantos são nocivos, não sei dizer. Mesmo porque nos limitamos a trabalhar inicialmente nos contratos administrativos da diretoria executiva, que correspondem a 150 documentos aproximadamente. Um percentual muito pequeno comparado às gerências regionais, com outros tantos. Alerto aos membros do Conselho Fiscal, pessoas experientes e responsáveis, que tenham a diligência em verificar se há verdade nisso, e de forma urgente. Caso isso seja confirmado, as suas perguntas anteriores terão uma resposta mais assertiva quanto a continuidade de contratos nocivos à Geap.
O senhor acha que foi demitido por contrariar interesses políticos e de empresas que prestam serviço à Geap?
Não tive qualquer oportunidade de diálogo, de expressão, de interação para a construção do processo de continuidade. Sequer participei da reunião extraordinária dos conselheiros e nem da reunião Ordinária, que ocorreu na mesma data de minha destituição, pois fui desarticulado antes pela arbitrariedade do conselheiro Manoel Messias. E endosso: o nosso maior propósito junto a minha equipe sempre foi o de cuidar dos beneficiários. Ponto.
Soube por um conselheiro que a auditora ligada ao conselho de administração teria sido demitida por se recusar a alterar um relatório. Isso, de fato, ocorreu?
Olha, eu não tive contato com ela depois que saí. Antes, sim. A profissional em questão demonstrou seriedade na discussão dos trabalhos afetos à sua equipe e fez com que eu me identificasse com a sua postura séria e profissional. Combinava com o modelo de nossa gestão: apuração, correção, ação transparente. O papel dos conselhos é o de governabilidade, e essa atitude individualizada não condiz com a sua responsabilidade.
A Geap tem solução? É possível equilibrar as contas da operadora?
Acreditávamos que sim. Afinal, juntamente comigo, vários profissionais especializados, somados a um grupo de bons colaboradores pratas da casa, fariam, certamente um grande trabalho. Tendo saído, se não houver uma recomposição a altura, sem falsa modéstia, não terá solução. Se a gestão temerária continuar, a Geap vai quebrar. A quem interessa isso? Por que mantê-la nessas condições administrativas tão precárias? Isso eu não consigo responder.
Qual sua opinião sobre uma eventual intervenção da ANS na Geap?
Talvez seja a solução, mas deve ser avaliada dentro da Lei. Por outro lado, fazer intervenção e não oxigenar a carteira (com novos clientes corporativos) dará o mesmo resultado: faltará recurso para sanar os compromissos. Finalmente, se não for pra Geap ser efetivamente dos beneficiários, que ela honre seus compromissos e que não seja de mais ninguém. Os beneficiários da Geap, em sua maioria com idades avançadas, merecem respeito.
Brasília, 12h36min