Saída de capital estrangeiro do país em 2019 bate recorde: US$ 44,8 bi

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ROSANA HESSEL

A debandada de investidores estrangeiros do Brasil foi recorde em 2019, mesmo com o risco país medido pelo CDS (Credit Default Swap) para contratos de cinco anos ficando levemente abaixo de 100 pontos. Conforme dados do Banco Central divulgados nesta quarta-feira (08/01), as saídas líquidas de dólares do Brasil somaram US$ 44,8 bilhões no acumulado até o dia 30 de dezembro. Esse dado é quase três superior ao maior deficit anual do fluxo cambial registrado até então registrado pelo BC, de US$ 16,2 bilhões, em 1999.

Em dezembro, a autoridade monetária computou a saída líquida de US$ 17,6 bilhões, a maior retirada do país para o período desde 2014, quando o saldo negativo ficou em US$ 14 bilhões.
O volume de saídas líquidas é a diferença entre o resultado de compras e vendas do volume financeiro no país (que ficou negativo em US$ 62,2 bilhões no ano passado), e o saldo das operações de comércio exterior, que foi positivo em US$ 17,4 bilhões no mesmo período.  Os últimos meses do ano costumam ter um fluxo maior de retirada de dólares do país devido ao envio de lucros das subsidiárias para as matrizes no exterior, mas especialistas consideram o montante atípico em meio ao ciclo de recuperação da economia e de maior otimismo no mercado de ações.

“O grande problema é que o capital estrangeiro que vinha para o país atrás dos juros de 10% ao ano dos títulos públicos, quando a Selic (taxa básica da economia) começou a sair e foi para 4,5% anuais. E como o país não tem grau de investimento, e os títulos públicos são classificados como junk bonds (lixo) esses investidores foram obrigados a procurar outros tipos de aplicação em mercados considerados mais seguros”, explicou Ricardo Galhardo, gerente da Treviso Corretora de Câmbio. Ele lembrou que os grandes fundos internacionais têm um limite para investir em países sem grau de investimento, que é o selo de bom pagador das agências de classificação de risco. O Brasil demorou mais de 20 anos para conquistas e que perdeu em pouquíssimo tempo devido ao desequilíbrio das contas públicas.

“Não adianta ter o risco baixo se ainda existe muita insegurança jurídica. Isso afasta o investidor estrangeiro e esse pessoal que saiu são pessoas que buscam rentabilidade e não estão preocupados com o bem do país”, adicionou Galhardo. Segundo ele, a queda da Selic também provocou um movimento atípico na bolsa, que bateu recordes consecutivos devido ao aumento do volume de investidores domésticos, que foram atrás de rendimentos maiores do que os da poupança, de fundos de renda fixa e de alguns títulos do Tesouro Nacional, que passaram a perder para a inflação.

A Standard & Poor’s, no fim do ano passado, melhorou a perspectiva da nota de risco do Brasil e sinalizou uma melhora na classificação do país, caso o crescimento da economia for acima das expectativas e houver melhora na trajetória da dívida pública bruta, que apresentou leve melhora neste ano pela redução da Selic e também pela devolução de R$ 123 bilhões de aportes do Tesouro pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), esse valor é quase cinco vezes maior do que os R$ 25 bilhões previstos pela instituição. Esses dois fatores positivos não tem nada a ver com melhora estrutural das contas públicas, infelizmente.

Logo, há muito trabalho para a equipe econômica do ministro da Economia, Paulo Guedes, a ser feito para ele cumprir as promessas de início de mandato. Zerar o deficit primário das contas públicas, por exemplo, algo que Guedes prometeu fazer no primeiro ano de à frente da pasta, dificilmente acontecerá antes de 2022. Pelas estimativas de Pedro Schneider, economista do Itaú Unibanco, um superavit de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) que é o necessário para conter o crescimento da dívida pública, só ocorrerá, na melhor das hipóteses, em 2023.

Na avaliação de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, a volta do grau de investimento ainda deve demorar alguns anos. “Só deve acontecer depois de 2023. Tem um longo chão aí. As agências vão esperar maiores sinais de consolidação fiscal. É preciso um crescimento mais forte durante mais tempo para aí pensar em colocar o investment grade de novo”, explicou.

Vicente Nunes