Risco de trem da alegria nos cartórios

Publicado em Economia

POR VERA BATISTA

 

Chefes de cartórios eleitorais em todo o país vão fazer um dia nacional de paralisação, em 23 de agosto, para pressionar o Congresso a aprovar projeto de lei (PLN 3), que remaneja recursos da Justiça Eleitoral, de forma a permitir a isonomia de remunerações da categoria. Atualmente, há uma diferença entre o valor das funções comissionadas (FC) na capital e no interior. Os chefes das capitais recebem R$ 1.939 (FC-4) e seus colegas interioranos, R$ 1.019 (FC-1). Caso a proposta seja aprovada, todos receberão R$ 3.072 (FC-6).

 

Analistas apontam que o projeto poderá abrir a porta para uma despesa extra superior a R$ 455 milhões, caso, no futuro, a classe consiga equiparação com os diretores de cartório. Há suspeitas de que começa a se formar um trem da alegria, embora o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário (Fenajufe) garantam que não haverá impacto para a União.

 

“Os recursos são resultados de um remanejamento dentro do orçamento para atender o exigido pela lei com o objetivo de padronizar as chefias de cartório de todo o país”, informou o TSE, por meio de nota. “Não tem custo algum. É o dinheiro que seria usado para horas extras e convocações. Há apenas uma troca de rubricas: de ‘pleitos eleitorais’ para ‘pessoal e encargos’”, reforçou José Costa, diretor da Fenajufe. Segundo o TSE, o montante a ser transferido é de R$ 70,7 milhões. Para a Fenajufe, de R$ 82 milhões.

 

Um técnico que não quis se identificar, contudo, tem uma versão diferente. “A estratégia é a de sempre. Uma conta de chegada que acaba caindo no colo da sociedade. É só observar a história”, disse. Ele lembrou que, no passado, os chefes de cartório não eram concursados da Justiça Eleitoral e a ocupação do cargo era por indicação política. Eles ganhavam um extra de R$ 11,3 mil, extinto em 2004. Desde então passaram a valer as funções comissionadas (FC).

 

“O discurso já começa a mudar sorrateiramente. O pessoal do Judiciário alega que os chefes de cartório trabalham bem mais que os diretores de secretaria, que ganham R$ 14,6 mil. É um passo para pedir isonomia. É assim que os jabutis acontecem”, disse o técnico. É curioso, segundo ele, que a diferença entre os R$ 14,6 mil dos diretores e os R$ 3 mil da FC-6, é de R$ 11,5 mil — bem perto do que foi perdido em 2004.

 

Para o economista Roberto Piscitelli, especialista em finanças públicas, não está descartado um trem da alegria. “Não se pode dizer categoricamente que essa é a intenção. Mas parece irônica a coincidência. A falta de política salarial do governo empurra as categorias para esses artifícios.”

 

Brasília, 13h45min