O governo não se emenda. Quando tudo já está ruim, trata de piorar ainda mais a situação. No mesmo dia em que o coração da administração Dilma Rousseff foi atingido pela operação Catilinárias, da Polícia Federal, que jogou ministros e o PMDB para o centro da Lava-Jato, a presidente sancionou a redução da meta de superavit primário de 2016 para 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), com possibilidade de virar zero depois de uma série de abatimentos. Na prática, a petista adotou o sistema de banda fiscal defendido pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, que, mais uma vez, derrotou o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, totalmente contrário à medida — ele pregava uma economia de 0,7% do PIB para o pagamento de juros da dívida.
Esperava-se que, com o mundo político se desmanchando em lama, Dilma desse um sinal de responsabilidade fiscal, criando um contraponto à grave crise que pode implodir o governo e o Congresso. Mas, não. Usando o Bolsa Família como bode expiatório, mais uma vez, ela preferiu rasgar o compromisso fiscal que ajudaria a frear a onda de desconfiança que empurra o país para o precipício. Por mais que o Palácio do Planalto diga que o superavit primário de 0,5% será cumprindo à risca, ninguém acredita. É possível que, ao longo dos próximos meses, o governo proponha ao Congresso que, também em 2016, as contas públicas registrem deficit. É por isso que a equipe de Levy já começa a limpar as gavetas, disposta a pular do barco antes mesmo de o chefe dizer, sem falsas ameaças, que está fora.
A visão entre os subordinados do ministro é a de que não há mais espaço para eles no governo. Levy, se quiser, que continue passando pela humilhação de prometer, prometer, e não entregar. Como bem ressaltou um técnico do Tesouro Nacional, o Ministério da Fazenda se transformou em uma fábrica de promessas são cumpridas, uma ilha da fantasia que, agora, será vista pelos agentes econômicos com total descrédito. O resultado será um aprofundamento da recessão, mais desemprego, inflação nas alturas, rebaixamento do país e necessidade de o Banco Central pesar ainda mais as mãos sobre os juros, ou seja, o filme de terror que temos assistido desde o início do segundo mandato de Dilma.
Na visão de especialistas, com a meta fiscal menor, o governo jogou uma pá de cal em 2016 e praticamente destruiu 2017. Do lado político, o sofrimento de Dilma será enorme. Com o PMDB na linha de tiro e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, com o mandato praticamente cassado, o impeachment ganhou força. Sem Cunha à frente, o processo passará a ter mais legitimidade. “Na ânsia de preservar o mandato, Dilma nomeou ministros aliados do presidente da Câmara que, todos sabiam, eram fichas sujas. Com o envolvimento deles na Lava-Jato, a petista jogou no próprio colo as suspeitas de corrupção. É o típico caso de autodestruição”, sentencia um banqueiro. De agora em diante, será o salve-se quem puder.
Brasília, 08h30min