Reforma da Previdência para adoçar a boca dos investidores

Publicado em Economia

ALESSANDRA AZEVEDO E LUANA MELODY BRASIL

 

Enfraquecido com a apresentação da denúncia pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o governo Temer cambaleia para não deixar que a agenda de votação das reformas pare de vez. A aprovação da trabalhista na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal, na última quarta-feira, foi uma sinalização de que há governabilidade. No entanto, a paralisação da reforma da Previdência há mais de um mês na Câmara dos Deputados esfria os ânimos do Palácio do Planalto. Diante da conjuntura, já é visto como certo, inclusive por boa parte da base aliada do governo, que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 287, que muda as regras de aposentadoria e pensão, não conseguirá os 308 votos necessários para passar no plenário.

 

Com o objetivo de não deixarem o mercado financeiro sem resposta em relação a um dos principais pontos da agenda econômica atual, parlamentares governistas articulam a sugestão de uma nova reforma, mais palatável que a enviada pelo Planalto em dezembro. Com a ajuda de consultores jurídicos, parte dos deputados do PSDB constrói, há cerca de duas semanas, um texto alternativo. Há cerca de uma semana, eles receberam sinal verde da liderança do partido para seguir com esse plano, conforme contou uma deputada ao Correio.

 

O grupo considera que a proposta peemedebista é cruel, especialmente com a população mais vulnerável, como os trabalhadores rurais e pessoas com necessidades especiais. A “reforma pocket”, como definiu a deputada, manteria apenas os pontos essenciais, como a idade mínima, provavelmente de 65 anos. “Será mais discreta e sem exageros”, defendeu. “O governo jogou no tudo ou nada e vai ficar com nada, porque agora não tem condição daquele texto passar. Para deixar ele bom, teria que riscar tudo e recomeçar do zero. Como entendemos que a Previdência precisa de reforma, resolvemos fazer outro texto”, explicou.

 

A ideia de uma reforma alternativa vem a calhar justamente numa época de apreensão do PSDB quanto a sustentar um governo desgastado na opinião pública. Dessa forma, os tucanos apresentariam um novo caminho para se descolar do PMDB e, ao mesmo tempo, apontar soluções para que a reforma saia do papel. Além disso, seria um alento para um mercado financeiro preocupado com a estagnação da proposta, como foi sinalizado no último fim de semana pelo presidente do conselho do Itaú Unibanco, Roberto Setubal, em evento da XP Investimentos. “Provavelmente, a reforma previdenciária não vai ser possível na dimensão necessária, mas quero crer que algo vai ser possível. Não vai ser agora que será feito direito, mas tem que ser feito”, cobrou.

 

Projeto viável

 

Novos textos não têm sido pensados apenas pelos tucanos. O deputado Rogério Rosso (PSD-DF), por exemplo, também propõe uma alternativa e garante que o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem discutido a questão. “Maia concorda que, do jeito que está, a reforma não vai avançar, que é preciso fazer algo diferente”, disse Rosso. A ideia do deputado é enxugar a reforma e instituir apenas a idade mínima para a aposentadoria, de 70 anos para homens e 68 anos para mulheres. A mudança valeria apenas para os que entrassem no mercado de trabalho após a promulgação da PEC. “Sempre fui crítico do texto oferecido pelo governo porque não se pode mexer nos direitos adquiridos. Estamos prevendo solução para um cenário daqui a 30 anos, quando a expectativa de vida do brasileiro vai ser maior. É um projeto mais viável e menos traumático politicamente.”

 

Efraim Filho (PB), líder do DEM na Câmara, um dos partidos que defendem abertamente a agenda econômica do governo, confirmou que a possibilidade de uma reforma mais “enxuta” tem sido discutida, de maneira informal, entre os deputados, mas não especificou quais pontos estariam, de fato, em negociação. “Não chegamos a nos debruçar sobre qual texto passaria ou passará, mas com certeza ele precisará ser rediscutido”, frisou. As atenções estão voltadas, agora, à reforma trabalhista e à denúncia do PGR, recebida ontem pela Câmara. “Só depois de encerrados esses assuntos, a previdenciária volta a ter protagonismo”, destacou Efraim.

 

Brasília, 21h35min