R$ 90 bilhões escorrem por ano pelos ralos da Previdência

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POR ANTONIO TEMÓTEO

 

Determinado a impor uma idade mínima para aposentadoria e a desvincular o reajuste do salário mínimo da revisão do piso dos benefícios da Previdência Social, o governo Michel Temer pouco falou sobre como tapar os ralos por onde escorrem os recursos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Dados do extinto Ministério do Trabalho e Previdência Social apontam que as renúncias previdenciárias, a sonegação fiscal e a inadimplência nas contribuições implicaram uma perda de arrecadação de R$ 88,6 bilhões no ano passado. Esse valor ultrapassa o rombo de R$ 85,8 bilhões registrado. Para 2016, o prejuízo aos cofres públicos deve passar de R$ 90 bilhões em meio à recessão econômica.

 

Somente as desonerações da folha de pagamento representarão uma renúncia de R$ 15,6 bilhões. As empresas que se enquadram no Simples receberão incentivos de R$ 20,6 bilhões, as entidades filantrópicas terão isenção de R$ 11 bilhões, os exportadores rurais deixarão de pagar R$ 6,5 bilhões ao INSS e os microempreendedores individuais, R$ 1 bilhão. Já os prejuízos com a sonegação e a inadimplência podem ultrapassar os R$ 35 bilhões e se somarão aos R$ 374,9 bilhões inscritos na dívida ativa da União.

 

Um levantamento do governo apontou que, do total da dívida ativa, somente R$ 10,2 bilhões têm alta probabilidade de recuperação. E outros R$ 89,7 bilhões têm chances medianas, conforme os parâmetros estabelecidos pelo Executivo. Além dos recursos que escorrem pelos ralos por meio das renúncias, as normas para concessão de benefícios da Previdência Social continuam benevolentes com os segurados e os patrões. Atualmente, 2,4 milhões de beneficiários acumulam aposentadoria e pensão a um custo de R$ 64 bilhões aos cofres do Executivo. Pelo menos 93,4% desse grupo possui 60 anos ou mais.

 

Auxílio-doença

 

Especialistas ainda alertam que os empregadores são beneficiados pelas regras generosas. Um exemplo disso são as obrigações com trabalhadores que adoecem. Os patrões são obrigados a custear somente os 15 primeiros dias de afastamento e depois o seguro deve requerer o auxílio-doença. O governo da presidente afastada, Dilma Rousseff, tentou elevar para 30 dias o período que as empresas deveriam arcar com os custos de empregados doentes. Entretanto, a proposta foi barrada no Congresso Nacional pelos parlamentares ligados ao setor produtivo.

 

As regras frouxas para a concessão de benefícios, as renúncias fiscais e a sonegação de contribuições levarão o rombo nas contas da Previdência Social a atingir R$ 133,6 bilhões até do fim do ano, o equivalente a 2,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2030, o deficit chegará a R$ 553 bilhões, valor que corresponderá a 3,2% da geração de riquezas no Brasil. E, em 2060, a necessidade de financiamento do INSS chegará a incríveis R$ 8,9 trilhões ou 11,1% do PIB.

 

Na opinião de José Matias-Pereira, especialista em finanças públicas da Universidade Brasília (UnB), a incorporação da Previdência pelo Ministério da Fazenda pode estimular mudanças nas normas para tapar os ralos por onde escorrem as contribuições. Conforme ele, os auditores da Receita Federal, muitos deles oriundos do INSS, têm a capacidade de aperfeiçoar os mecanismos de controle para combater a inadimplência e a sonegação de recursos.

 

Matias-Pereira alertou que, além de aperfeiçoar a fiscalização, o Executivo precisa alterar as normas para concessão de benefícios com a instituição de uma idade mínima para parar de trabalhar. Ele explicou que as aposentadorias precoces pressionam as contas da Previdência. Dados do governo mostram que a idade média de aposentadoria no Brasil foi de 58 anos em 2015. Já a expectativa de vida chegou a 75 anos. “Já que os brasileiros estão mais longevos, em algum momento, terão de ser chamados a cobrir o rombo do INSS. Isso é inevitável sem uma reforma”, explicou.

 

O economista-chefe da Opus Investimentos, José Márcio Camargo, detalhou que a reforma da Previdência é essencial para que o governo sinalize ao mercado um compromisso com as contas públicas. Segundo ele, o rombo do INSS potencializa o rombo fiscal, que se soma às despesas com juros e eleva a dívida pública. “O país precisa enfrentar essa discussão para que não sofra o que diversos países europeus enfrentaram nos últimos anos”, afirmou.

 

Camargo ressaltou que a política de desonerações não surtiu o efeito desejado pelo governo e pode ser revista para reduzir a perda de receitas previdenciárias. Ele defendeu também que o governo fortaleça os mecanismos de cobrança para evitar o crescimento da dívida ativa da União. “Sem essas medidas, o deficit da Previdência continuará sua trajetória explosiva. O parlamento precisa se manifestar sobre essa questão e ter compromisso com a recuperação do país”, disse.

 

Brasília, 11h13min