PORTAS ABERTAS

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Ainda que por meio de sinais cifrados, o Banco Central indicou ontem que o processo de alta da taxa básica de juros (Selic) está próximo do fim. No máximo, o Comitê de Política Monetária (Copom) deve promover mais um aumento de 0,25 ponto percentual, de 12,25% para 12,50% ao ano. Dentro do BC, a percepção é de que os juros estão elevados demais para uma economia que está à beira da recessão.

A explicação de técnicos da autoridade monetária é de que não havia outra saída. A inflação está muito acima do tolerável e vai continuar subindo ao longo deste primeiro semestre, com risco de estourar o teto da meta no fim de 2015, por causa do tarifaço anunciado pelo governo. Diante desse quadro, o BC não poderia ter um comportamento tímido, pois enterraria de vez a credibilidade que tenta reconstruir a todo custo.

O BC acredita, porém, que, com a alta de 1,25 ponto desde outubro do ano passado, mais o possível aumento de 0,25 ponto em março, já terá dado a sua contribuição para levar, gradualmente, a inflação ao centro da meta, de 4,5%. Agora, acredita a autoridade monetária, não há mais a necessidade de um choque de juros, uma vez que o governo demonstrou, com vigor, que fará um ajuste fiscal consistente, “sem remendos”, como destacou o ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

A visão de hoje do BC não significa, porém, que o time comandando por Alexandre Tombini se intimidará em pesar as mãos nos juros em março ou mesmo em abril, caso a inflação dê sinais de descontrole. Por isso mesmo, as portas foram mantidas abertas por meio do lacônico comunicado pós-reunião do Copom, de que está avaliando o cenário macroeconômico e as perspectivas para a inflação.

Na visão do professor Simão Davi Silber, da Universidade de São Paulo (USP), certamente o BC poderia ter anunciado ontem queda dos juros, movimento que se tem observado em boa parte do mundo, se a economia brasileira estivesse em boas condições. “Infelizmente, o que vemos no Brasil é um circo de horrores. E o aumento da Selic faz parte do pacote de medidas corretivas. Neste momento, a prioridade é restabelecer a confiança de que o Copom realmente está compromissado em levar a inflação para o centro da meta, o que não se percebeu no primeiro mandato da presidente Dilma”, afirma.

Tudo indica, pelas contas de Simão, que a inflação passará dos 7% ainda neste início de ano, pois há uma onda de aumentos de preços que não se esgotará tão cedo. Desde setembro do ano passado, o dólar subiu 16%, encarecendo os produtos importados. A moeda norte-americana impacta o preço da carne, da soja e da energia elétrica, já que a eletricidade vendida pela hidrelétrica de Itaipu é dolarizada. A luz subirá também porque o governo decidiu repassar para os consumidores os erros que cometeu no setor. E há os aumentos de impostos e dos combustíveis. “Portanto, não há como o BC ficar passível perante esse quadro”, assinala.

No Planalto, conformismo

Dentro do Palácio do Planalto, o clima é de conformismo. A presidente Dilma parece ter entendido que, em economia, se pode ter benefícios de curto prazo, mas o custo real vem depois, e pesado. É o caso da energia elétrica. Em 2012, às vésperas da eleição municipal e com o intuito de ajudar a candidatura de Fernando Haddad, do PT, à prefeitura de São Paulo, a chefe do Executivo foi à televisão anunciar que reduziria a tarifa elétrica em 20%, na média. E o fez no ano seguinte. A fatura, porém, chegou em 2014, quando a conta de luz aumentou, em média, 17%. Agora, fala-se em alta entre 30% e 40%. “A verdade é cruel. O que nos resta, neste momento, é esperar para colher os frutos dos ajustes feitos por Levy. E esperamos que sejam muitos e saborosos”, diz um auxiliar da presidente.

Bancos vão cobrar mais

» Antes mesmo de o Comitê de Política Monetária anunciar o aumento de 0,5 ponto percentual na Selic, os bancos já estavam ajustando as tabelas de juros cobrados dos consumidores. A perspectiva é de que, já na próxima segunda-feira, aqueles que forem às agências paguem bem mais caro pelos empréstimos.

Medo de calote

» A ordem dos bancos, no entanto, é ser muito seletivos na concessão de crédito. Há o temor de que, com o tarifaço anunciado pelo governo mais os impostos tradicionais de início de ano, o calote dispare.

Ajuda da Petrobras

» Os mais otimistas do governo acreditam que a Petrobras dará uma ajuda ao Banco Central no fim do ano, para que a inflação feche abaixo do teto da meta. Com o petróleo em baixa, a gasolina é  vendida até 60% acima do mercado internacional, ajudando a estatal a recompor o caixa. Em novembro ou dezembro, no entanto, a empresa reduziria os preços do combustível.

Mudança de Barbosa

» O ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, decidiu fixar residência em Brasília. Ele está trazendo a mulher e o filho de São Paulo para a capital do país.

Brasília, 08h35min

Vicente Nunes