A crise econômica na qual o país está mergulhado é grave, mas, na avaliação do economista Raul Velloso, há um pessimismo exagerado que acaba superdimensionando os problemas. Segundo ele, o Brasil está numa posição bem mais confortável para superar as adversidades do que num passado recente. Mas é preciso ação.
Velloso cita um conjunto de fatores que o levam a ver o país saindo do atoleiro mais cedo do que prevê a maioria do mercado: o Banco Central está efetivamente comprometido com o combate à inflação; o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é responsável do ponto de vista fisca; o país adotou o realismo tarifário, está retomando o programa de concessões e as contas externas estão passando por um ajuste.
Mesmo o quadro internacional, que não é dos melhores, tem jogado a favor do país, acredita o economista. Como os Estados Unidos vêm adiando o aumento das taxas de juros, há dinheiro de sobra para irrigar a economia brasileira e evitar saltos expressivos na cotação do dólar. “A desvalorização do real está criando demanda externa pelos produtos brasileiros. Quando esse ponto ficar mais evidente, os investimentos devem ser destravados”, diz.
Especialista em contas públicas, Velloso reconhece que boa parte do pessimismo que agiganta os problemas da economia decorre do desastre herdado do primeiro mandato de Dilma Rousseff. Ressalta que o ajuste fiscal necessário hoje para trazer a confiança de volta será muito mais doloroso porque, em vez de se recuperar rapidamente, como ocorreu em 2003, a atividade está indo para o fundo do poço.
Na visão do economista será possível arrumar as finanças do país, mas é preciso estar atento pois, antes de melhorarem, indicadores como os da dívida bruta, que está em 62,5% do Produto Interno Bruto (PIB), vão piorar muito. “Nesse contexto, a presidente Dilma terá que, todos os dias, reforçar seu apoio a Levy. Terá que pedir paciência aos investidores até que os resultados comecem a aparecer”, afirma.
Para Velloso, o governo não tem mais qualquer espaço para errar. A situação está tão frágil, sobretudo porque há uma crise política grave atropelando o Palácio do Planalto, que qualquer ponto fora da curva fará a engrenagem desandar. Sendo assim, para evitar o pior, a presidente Dilma deveria unificar o discurso do governo, especialmente quando o assunto for o ajuste fiscal. É dentro do governo que está a maior ameaça ao setor público.
DivisãoUm governo dividido é alvo fácil para o Congresso. Não à toa, os técnicos da agência de classificação de risco Moody’s ressaltaram ontem ao ministro da Fazenda a preocupação com as dificuldades de a presidente Dilma reorganizar a sua base aliada. Segundo a Moody’s, é incompreensível que o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), seja o principal adversário do projeto que prevê a unificação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), defendido com unhas e dentes por Levy.
Nos últimos dias, o ministro fez uma grande maratona para conseguir o aval do Senado aos projetos do ICMS e de repatriação de recursos enviados ilegalmente pelos brasileiros ao exterior. Falou com parlamentares de todos os partidos, conversou com pelo menos 14 governadores, aglutinou apoio. Mas o partido da presidente acabou por impor a barreira que levou a discussão sobre a mudança na tributação para agosto, quando o Congresso voltará do recesso.
O grande temor da agência de classificação de risco e de técnicos da equipe econômica é de que, com o acirramento da disputa política, toda a reforma tributária pensada por Levy, que inclui a unificação do PIS e da Cofins e a criação de dois fundos para compensar perdas aos estados com a redução do ICMS para 4%, vá para o ralo. O ministro da Fazenda acredita que, com a ampliação do debate, conseguirá reverter os obstáculos que tanto incomodam os investidores.
Levy detalhou aos técnicos da Moody’s as dificuldades estruturais e, sobretudo, as de curto prazo, para que o país possa retomar a agenda do crescimento econômico. Assinalou que o governo está empenhado em cortar gastos, mas, com as dificuldades atuais de arrecadação, ainda dependerá de receitas extraordinárias para fechar as contas e cumprir o superavit primário de 1,1% do Produto Interno Bruto (PIB).
A manutenção da meta fiscal, porém, continua sendo dúvida. E isso é um grande problema, reconhece Raul Velloso. Para ele, o governo deve insistir ao máximo que alcançará tal objetivo, com toda a transparência possível. Apesar de a Moody’s ter admitido, nas reuniões com integrantes da equipe econômica, que o esforço do governo para arrumar a casa é importante, o rebaixamento do país ainda está a um passo de ser decretado.
Relações chinesas
» Já foram melhores as relações da Petrobras com os sócios chineses no Campo de Libra, privatizado por Dilma Rousseff em 2013.
Direto de Nova York
» Na conversas para obter apoio ao projeto de reforma do ICMS, Joaquim Levy recebeu apoio de um governador que estava em Nova York. De lá, ele mandou mensagens a todos os aliados no Congresso para que apoiassem o ministro.
Economista do ano
» Raul Velloso foi eleito economista do ano de 2015 pela Ordem dos Economistas do Brasil. A premiação está marcada para 10 de agosto.
Brasília, 00h01min