Paulo Guedes nega conflito de interesses de investimento em paraíso fiscal

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ROSANA HESSEL

O ministro da Economia, Paulo Guedes, negou conflito de interesses e foi bombardeado por críticas de que ele tem manipulado o mercado durante audiência pública, realizada nesta terça-feira (23/11), Câmara dos Deputados, para a qual foi convocado para explicar os investimentos em paraísos fiscais, as offshores reveladas pelo projeto Pandora Papers, do consórcio de jornalistas investigativos internacionais.

“Offshore é um veículo de investimento absolutamente legal”, afirmou Guedes, aos deputados presentes no Plenário 12 da Câmara, durante sessão conjunta da Comissão do Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP) e da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC).

“Eu vendi todas as minhas participações nas empresas em que eu era sócio. Eu fui mais realista do que o rei. Eu fiz mais do que era esperado e não coloquei todos os meu patrimônio em blind trust. Eu vendi”, afirmou o ministro, dizendo que “se doou” para trabalhar no governo. Durante a sessão, o ministro foi bombardeado de questionamentos de parlamentares sobre o conflito de interesses com a desvalorização do real, garantindo lucros no exterior em empresas administradas pela esposa e pela filha, que, na avaliação dos parlamentares da oposição, é crime. Já os parlamentares da situação chegaram a elogiar Guedes, chamando-o de “Ronaldinho dos negócios”.

Um dos principais críticos do fato de Guedes ter investimentos em paraísos fiscais gerenciados pela filha, o deputado Elias Vaz (PSB-GO), afirmou que o ministro tem um fundo que ganha quase R$ 400 mil por mês desde o início do governo até 30 de junho.  “O senhor diz que faz sacrifício. Sacrifício é o povo brasileiro que ganha a miséria que ganha”, afirmou.

Ao justificar o investimento em offshore, para evitar a expropriação do governo dos Estados Unidos de 47% do patrimônio, Guedes entrou em contradição no discurso de fazer com que os mais ricos paguem imposto no país. “Mesmo que seja estrangeiro qualquer coisa lá vira imposto sobre herança. O melhor é usar offshore, uma conta que esteja fora do continente”, declarou. “Isso que explica botar um parente, um filho, uma filha, um cônjuge, como sócio”, disse.

“Esta escrito ‘tem algum conflito de interesse de algum parente seu com seu cargo no Brasil?’ A resposta é não”, declarou o ministro aos parlamentares. Ele disse também que criou dezenas de empresas e desinvestiu “com enorme prejuízo”. “Abri mão de 8, 9, 10 anos de trabalho. Eu desinvesti com preço de investimento. Abro mão dos rendimentos de capital. É um sacrifício pelo país”, disse o ministro, que negou que tenha fugido para explicar movimentações financeiras. “Essas medidas foram aprovadas pela Câmara, minha experiência com a Câmara tem sido a melhor possível, é uma Câmara reformista que tem feito o trabalho”, afirmou.

Na avaliação do ministro, offshore é como uma simples ferramenta que pode ser usada para o bem ou para o mal. “É como uma faca. Você pode usar para o mal, para matar alguém, ou pode usar para o bem, para descascar uma laranja”, comparou.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), líder da minoria, demonstrou indignação sobre o fato de o ministro declarar que ter investimento em offshore em paraíso fiscal é legal. Ela disse que é muito “complexo ouvir que offshore pode tudo”. “Pode ser legal, mas, na maioria das vezes, não é. O paraíso fiscal é o paraíso do secreto”, afirmou, acrescentando que nesses países onde tudo é escondido, há um comércio paralelo. Logo, o investimento é “imoral ou ilegal” para um ministro da Economia. Segundo ela, se, de fato, fosse a decisão política e de governo tributar paraíso fiscal, “a proposta teria passado”. “Passa tudo nesse governo”, disse, citando a PEC dos Precatórios, recentemente aprovada pela Câmara e que agora está tramitando no Senado.

A médica rebateu o otimismo do ministro em relação à economia e classificou a política econômica do ministro de “vergonhosa”. “A verdade dos fatos e os números não desmentem”, disse, em referência aos dados cada vez piores da economia deste ano e as previsões nada animadoras do mercado para o ano que vem. “Esse governo é um favorecedor, um parceiro do capital financeiro e destruidor políticas públicas”. pontuou, questionando a falta de investigações efetivas sobre corrupção no governo.

Segundo a parlamentar, se não fosse o projeto Pandora Papers, ninguém saberia que o ministro da Economia e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, possuem investimentos em paraísos fiscais, onde 40% dos investimentos que circulam no mundo, conforme os dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Feghali ainda citou as denúncias da venda de investimentos em carteira do Banco do Brasil e de privatizações “a preço de banana” que teriam sido coordenadas pela pasta chefiada por Guedes.

Ao ser questionado sobre os números dos investimentos no exterior e a movimentação das offshores por vários parlamentares, o ministro respondeu que “abriu tudo”, mas para as “instâncias pertinentes”, e evitou comentar sobre os dados por questão de “sigilo”.

Vicente Nunes