PARA O BARCO NÃO AFUNDAR

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O esforço fiscal prometido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, está longe de garantir a retomada mais forte da economia no médio e no longo prazos. As medidas anunciadas nos últimos dias, que somam R$ 111 bilhões, se concretizadas, apenas evitarão que o país afunde de vez. Para que o Brasil cresça de forma sustentada, a taxas superiores a 3% ao ano, será preciso uma mudança ideológica do governo a fim de resgatar a agenda abandonada da produtividade e da maior competitividade da economia.

É louvável que, mesmo a contragosto, e com o PT lhe apontando uma espada no peito, a presidente Dilma Rousseff assuma que errou feio nos últimos quatro anos e dê poderes para Levy resgatar o barco antes de o pior acontecer. Está claro, porém, que o foco da petista é de curto prazo. Seu objetivo principal é evitar o rebaixamento do país pelas agências de classificação de risco e o fechamento dos mercados internacionais, o que poderia detonar uma crise cambial aguda, a ponto de o Banco Central ser obrigado a se desfazer das reservas que hoje funcionam como importante seguro.

Na visão do economista Sílvio Campos Neto, da Tendências Consultoria, o Brasil está, neste momento, apenas tomando o remédio fundamental para sua sobrevivência. Se realmente o governo quiser impulsionar o Produto Interno Bruto (PIB), terá que ampliar os esforços para além da arrumação das contas públicas. Isso implica apoiar reformas como a tributária e a da Previdência Social, agilizar o processo de concessões na área de infraestrutura e abrir a economia. Sem isso, o país está condenado a ter mais uma década perdida.

Os números mostraram que, sob o comando de Dilma, o Brasil teve o pior desempenho econômico em um quarto de século. O risco de o país acumular dois anos de retração no PIB é enorme, fato que não se vê desde 1930. Com a petista, a desigualdade social aumentou e o desemprego teve a primeira alta em seis anos. Quando se olha para a frente, nada, nem mesmo o esforço fiscal prometido por Levy, garante que, em 2018, quando a presidente encerrará o segundo mandato, o PIB estará caminhando a todo vapor.

Não por acaso os índices de confiança estão tão baixos. Parte da equipe econômica acredita que, já no fim deste ano, o humor dos empresários estará melhor, uma vez que o ajuste fiscal mostrará resultados e a inflação, agora pressionada pela correção das tarifas públicas, estará apontando para baixo. Isso, no entanto, não significará a volta dos investimentos produtivos. A indústria está machucada demais, em recessão há mais de dois anos, e o setor de serviços, que vinha segurando o nível de atividade, desabou para o menor patamar desde a crise de 2009.

Quanto aos consumidores, Sílvio Campos Neto afirma que eles serão os últimos a voltar a confiar no governo. Assim como demoraram a sentir os efeitos da desaceleração da economia, conviverão, por mais tempo, com o pior do ajuste prometido por Levy: redução do poder de compra e demissões. “Não podemos esquecer que o acúmulo de equívocos foi tão grande nos últimos quatro anos, com subsídios em excesso, intervenção para cortes na conta de luz e pressão para o Banco Central reduzir juros mesmo com a inflação em alta, que levará tempo para a casa ficar arrumada”, destaca.

Falta de horizonte

Economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn diz que o fato de o governo demostrar uma visão de curto prazo, imediatista, cria um problema adicional à economia: a falta de horizonte. “Torna-se difícil enxergar o futuro, mesmo o próximo, em meio a ajustes emergenciais”, assinala. Diante desse quadro, ele se pergunta: “Qual será a situação da economia daqui a três, quatro anos? De que forma terminará esse período de ajuste?”.

Para Goldfajn, existem algumas alternativas. Uma delas, bem pessimista, seria a de que os ajustes propostos por Levy não se sustentariam por falta de apoio do governo ou da sociedade, o que minaria de vez a confiança de investidores, empresários e consumidores. Outra, benigna, seria o apoio necessário para os ajustes, apesar de todas as dificuldades econômicas e políticas, resgatando a credibilidade do país e permitindo vários anos de recuperação da economia.

Num cenário intermediário, afirma o economista do Itaú, os ajustes seriam o mínimo necessário para evitar uma crise, mas insuficientes para retomar a confiança e o crescimento. “A agenda continuaria focada no curto prazo, sempre alerta para evitar o pior, mas sem forças para ir além. O crescimento seria medíocre, mas não haveria queda substancial na renda nem aumento forte do desemprego. Seria uma década perdida, mas sem crise”, frisa, concluindo: “Para alguns seria um cenário pessimista; para outros, o melhor que se pode esperar”.

À espera das agências

» Tudo indica que os representantes de agências de classificação de risco que estarão no Brasil nesta semana serão recebidos pelo ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante. No Palácio do Planalto, avalia-se que a perda do grau de investimento do país é um risco real, embora seja injusto se ocorrer, pois tem vários indicadores positivos, incluindo o nível de reservas internacionais e o emprego em patamar historicamente muito bom. O argumento de assessores da presidente Dilma é o de que, nem de longe, o Brasil se parece com o país em grave crise, que recorreu, por diversas vezes, ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Apesar das justificativas, não há ilusões: a perda do grau de investimento vai piorar muito a situação que já é bastante ruim.

Ressalvas de Barbosa

» Em relação à nota publicada na coluna no sábado passado, falando sobre a palestra que fará na Câmara de Comércio França-Brasil, na próxima sexta-feira, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, diz que não tem qualquer participação na organização do evento nem controle de convidados ou sua forma de acesso. Ele ressalta ainda que considera inadequado o título da nota e repudia qualquer insinuação de “preço” envolvendo seu nome.

Brasília, 16h05min