Os riscos à frágil recuperação da economia

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ANTONIO TEMÓTEO

O ambiente internacional favorável tem garantido ao Brasil tranquilidade para que o país se concentre no debate da reforma da Previdência. O reconhecimento, porém, do governo de que a aprovação das mudanças propostas ao Congresso ficou difícil acendeu o sinal de alerta dos investidores. A pergunta que todos estão se fazendo é: até quando o país aguentará conviver com rombos crescentes nas suas contas. A situação está no limite.

As alterações nas normas para concessão de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), destacam economistas, são fundamentais para o reequilíbrio das contas públicas e para que o processo de recuperação da economia seja sustentável. Entretanto, engana-se quem crê que pressões externas não podem se materializar ao longo de 2018. O alerta é da economista-chefe da ARX Investimentos, Solange Srour. Ela explica que a forte recuperação da economia dos Estados Unidos, com a taxa de desemprego comportada e dados de atividade surpreendendo positivamente, pode pressionar os índices de preços da maior economia do mundo.

Solange explica que o risco é de que o Federal Reserve (Fed) esteja atrás da curva de juros, o que evidenciaria a necessidade de aumentar a taxa mais rápido do que o esperado anteriormente. “A inflação nos Estados Unidos deve voltar em algum momento e, se houver alguma surpresa, o Fed teria de tomar medidas para evitar que a variação de preços seja superior a sua meta. Esse risco existe” destaca.

A escolha de Jerome Powell, integrante do Conselho de Governadores do Fed para suceder Janet Yellen no comando da autoridade monetária norte-americana, trouxe tranquilidade ao mercado. O nome definido pelo presidente Donald Trump representa a continuidade do trabalho realizado até o momento e aponta para uma retomada gradual dos juros da maior economia do mundo. Entretanto, não há garantia de que o ritmo de alta será o mesmo se a inflação dos Estados Unidos acelerar.

As eventuais pressões externas não se limitam ao Fed. Conforme Solange, o Banco Central europeu também tem sinalizado que os estímulos econômicos concedidos até o momento para fortalecer a Zona do Euro podem estar próximos do fim. A melhora dos indicadores da Europa é outra fonte de preocupação e pode trazer pressões para a economia brasileira. Outro ponto de tensão pode surgir caso a China mostre uma desaceleração do ritmo de crescimento maior do que a esperada. “Os riscos existem”, sentencia a economista da ARX Investimentos.

América Latina

A possibilidade de pressões internacionais também está no radar do economista-chefe do Itaú Unibanco, Mario Mesquita. Para ele, o crescimento global está melhorando, mas ainda há espaço para se tornar mais disseminado. O maior banco privado do país elevou as projeções para a geração de riquezas dos Estados Unidos, Europa e China. Com isso, a estimativa de elevação do PIB mundial passou para 3,8% em 2017 e 2018, de 3,6% e 3,7%, respectivamente.

Nesse contexto, Mesquita comenta que a inflação global iniciará processo de normalização gradual à medida que a recuperação nas economias desenvolvidas se materialize e a pressão deflacionária da China diminua. “O principal risco é uma correção acelerada nas taxas de juros de mercados desenvolvidos devido à rápida aprovação de reduções de impostos ou pressões inflacionárias nos EUA, tendo em vista uma eventual retomada da dinâmica da Curva de Phillips. Mas esses riscos não parecem preocupantes no momento”, ameniza.

Com os juros mais altos dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos, detalha o economista-chefe do Itaú, a maioria das moedas latino-americanas enfraqueceu em outubro. Ele explica que o peso mexicano apresentou desempenho inferior aos pares, refletindo os rumores em torno das eleições presidenciais no próximo ano e das renegociações do Nafta, enquanto o aumento dos preços do cobre favoreceu o peso chileno e o sol peruano.

“A atividade na região está se recuperando gradualmente, mas os números mistos de inflação estão suscitando reações de política monetária divergentes. Em outubro, dois bancos centrais surpreenderam as expectativas: na Colômbia, a taxa básica de juros foi reduzida em 0,25 ponto percentual após a surpresa negativa da inflação, e, na Argentina, houve um aumento de 1,50 ponto percentual em resposta à persistência da inflação. De qualquer modo, mesmo em países que estão reduzindo os juros, os ciclos de flexibilização estão se aproximando do fim”, diz Mesquita.

No Brasil, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central cortou a taxa básica de juros (Selic) em 0,75 ponto percentual em outubro, sinalizou um corte de 0,5 ponto em dezembro e deixou a decisão de fevereiro em aberto. Para Mesquita, a Selic deve terminar o ano em 7% e, em 2018, chegar a 6,5% ao ano. Nas contas dele, a inflação de 2017 chegará a 3,3%, diante da maior pressão de preços administrados, mas a estimativa para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2018 permanece em 3,8%.

Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o economista-chefe do Itaú espera uma alta de 0,8% em 2017 e de 3% em 2018. Entretanto, alguns riscos podem atrapalhar esse processo. “Os fatores domésticos apresentam um viés negativo, enquanto o ambiente global mais forte trabalha na direção oposta. Nossa projeção para a taxa de desemprego no fim de 2018 foi revisada para baixo, de 12% para 11,8%. As projeções para a taxa de câmbio permaneceram inalteradas, em R$ 3,25 por dólar em 2017 e R$ 3,50 em 2018”, estimou.

Brasília, 06h50min

Vicente Nunes