ROSANA HESSEL
O ministro da Economia, Paulo Guedes, ao justificar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê o parcelamento dessas dívidas judiciais da União em até 10 anos para os que tiverem valor acima de R$ 66 milhões, reforçou que essa medida tem como objetivo principal respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Segundo ele, as dívidas são antigas, desde o governo Fernando Henrique Cardoso, e caíram, agora, no colo do atual governo.
“Os precatórios não foram produzidos por nós. São poderes independentes. Cada um tem a sua esfera de atuação. Cabe ao judiciário dar os precatórios. Eu não vou discutir mérito. Agora, eu tenho que cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal do lado de cá. A minha obrigação é controlar o crescimento dos gastos públicos”, afirmou o ministro, nesta sexta-feira (13/8), em entrevista à rádio Jovem Pan. Ele lembrou que tanto o Congresso quanto o Judiciário não possuem essa mesma obrigatoriedade e tomam decisões sem precisar apontar a fonte de receita para as despesas que aprovam.
De acordo com o ministro, a despesa com precatório prevista para 2022, que passou de R$ 54,7 bilhões neste ano para R$ 89,1 bilhões, conforme os dados do secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, tornou chegou a um “um valor que não é inexequível” “E lembre-se. Isso é um estoque de causas que foram ganhas lá atrás e que vieram acumulando multas juros compostos”, frisou.
Apesar das críticas à PEC que é considerada uma grande pedalada fiscal por especialistas em contas públicas, Guedes defendeu o parcelamento dos precatórios como uma forma de tornar a despesa mais “previsível” . Ele descartou a alternativa de mexer no teto de gastos, retirando as dívidas judiciais do limite ou parte delas. “Seria muito fácil isso, mas eu só resolveria a despesa de 2022. O próximo governo que entrar iria pegar uma bomba atômica. Eu preferi atacar o componente fiscal. Daqui para frente tem previsibilidade”, disse. Ele reforçou que essa proposta tem como principal objetivo não deixar o governo cometer crime de responsabilidade.
Na avaliação do ministro, toda vez que tem uma despesa subindo descontroladamente tem que atacar diretamente, como foi feito com reforma da Previdência. Ele ainda isentou a Advocacia-Geral da União (AGU) de qualquer responsabilidade pelo aumento expressivo no volume de precatórios neste ano. “Ninguém sabe o número exato (dessas ações). Se soubesse, teriam feito algo a respeito”, afirmou. Na avaliação do ministro, quem criou a incerteza fiscal é o ritmo de criação de passivos. “Todos os poderes são independentes, mas não são todos responsáveis pelo controle orçamentário. Quem fica sujeito à LRF é o Executivo”, reforçou.
“Chuva de pedrinhas”
O chefe da equipe econômica fez questão de afirmar que o parcelamento dos precatórios não foi uma estratégia para o governo poder aumentar as despesas com o novo programa social, o Auxílio Brasil. Segundo ele, o novo Bolsa Família “já estava orçado no valor de R$ 270 a R$ 300 e estava planejado dentro do teto”. Contudo, a programação acabou precisando mudar com a surpresa com os precatórios e, por conta disso, a solução encontrada foi o parcelamento do meteoro a fim de transformá-lo em uma chuva de meteoritos. “Precisamos de previsibilidade. Precisamos controlar o ritmo de crescimento de causas perdias para o governo. Mas o que eu não posso fazer é de um ano para o outro emitir R$ 100 bilhões de dívida e jogar o juro na lua e jogar a inflação na lua. Daqui para frente, vai cair um monte de pedrinhas”, disse.
Segundo o chefe da equipe econômica, os pequenos precatórios, com valores menores, serão pagos “imediatamente”, e os grandes, a partir de R$ 66 milhões, serão parcelados. E os maiores, chamados de “superprecatórios”, são de estados, que poderão participar das privatizações, por meio do fundo de liquidação que deverá ser criado com a PEC. “Super míssil, será parcelado. Míssil pequeno, recebe à vista. Mas os mísseis parcelados podem ser transformados imediatamente em moeda de privatização”, afirmou ele, citando as grandes que estão previstas, como Correios e Eletrobras, mas sem citar uma data específica.
Para Guedes essa solução do parcelamento de precatórios não é calote e é diferente do expediente utilizado em situações semelhantes no passado que era feito “no pé do ouvido” e sem transparência. “Eu, pelo menos, fiz uma coisa à luz do dia para todos”, ironizou. “Isso não é inovação. Ninguém chamou de calote quando valeu para estados e municípios”, disse ele, não lembrando que os entes federativos não podem emitir dívida como a União. “Acredito que fizemos o que tínhamos ter feito. Estamos controlando as despesas”, reforçou.
O ministro reconheceu que o crescimento dessas despesas foi “assustador” e, no ano que vem, poderia chegar a R$ 150 bilhões e a R$ 230 bilhões no ano seguinte, tornando a despesa descontrolada. Aliás, esse volume atípico vinha chamando a atenção dele desde o ano passado. “Mais vale a pena entrar para a indústria de precatórios do que tentar tocar qualquer outra atividade no Brasil. É o negocio que mais cresce no Brasil”, criticou.
Ao se defender das críticas sobre o aumento da desconfiança e da queda na credibilidade do governo, voltou a citar a reforma da Previdência e a redução da relação divida-Produto Interno Bruto (PIB) devido à política de redução dos juros pelo Banco Central, que levou a taxa básica da economia (Selic) para 2% ao ano, como alguns pontos positivos da sua gestão.
“Fizemos uma reforma previdenciária que ninguém tinha feito antes. Fomos para a segunda reforma e reduzimos em R$ 100 bilhões na despesa com juros”, disse ele, apontando como terceira reforma o congelamento dos reajustes do funcionalismo civil por dois anos, como contrapartida para a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Orçamento de Guerra no combate à pandemia da covid-19. Segundo o ministro, essa medida garantiu uma redução de R$ 150 bilhões na trajetória de gastos com pessoal em três anos. “Nenhuma reforma administrativa daria isso”, disse.
Otimismo
Ao ser questionado sobre a conjuntura econômica, Guedes voltou a demonstrar otimismo por conta de o país ter registrado uma queda menor do que muitos previam no ano passado e, pelas estimativas dele, o PIB deverá crescer 5,5% neste ano. A previsão oficial do Ministério da Economia, recentemente revisada, é de 5,3%. Para o ministro, o Brasil tem que seguir a agenda de reformas, porque “cada avanço nos marcos regulatórios dispara bilhões de reais de investimentos”. Apesar achar que houve os avanços na agenda econômica na Câmara dos Deputados, ele reconheceu que, no Senado Federal, os processos devem andar mais devagar por conta da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia, que está sob os holofotes.
Como exemplo no avanço dos marcos regulatórios, o ministro citou o leilão da Cedae, estatal de saneamento do Rio de Janeiro, que, arrecadou R$ 20 bilhões mais R$ 30 bilhões em compromisso de investimentos para os próximos 10 anos. “Vem a lei da cabotagem, a modernização do setor elétrico, as privatizações dos Correios e da Eletrobras”, enumerou.
Nesse sentido, Guedes reforçou o otimismo. “Estamos realmente transformando recuperações cíclicas que chamávamos de voo de galinha com reformas em um horizonte de investimento mais amplo, em todos os setores”, disse ele, minimizando o “barulho” dos mercados em relação às preocupações com as incertezas por conta do aumento dos riscos fiscais, justamente por conta da PEC dos precatórios e a falta de espaço no Orçamento para o governo criar o novo Bolsa Família do jeito que o presidente Jair Bolsonaro vem anunciando, com valores acima dos R$ 300 defendidos pelo chefe da equipe econômica.
“A democracia é barulhenta. Mas os atores, às vezes, se excedem. A grande verdade é que a Bolsa subiu bastante e estávamos andando no caminho certo. E começou todo o barulho novo. É barulho político que antecipando as eleições”, ressaltou.
O ministro minimizou essa crise de credibilidade do governo e garantiu que será possível zerar o rombo das contas públicas no ano que vem se o país continuar crescendo no ritmo atual. “Está previsto para o ano que vem, dentro dos parâmetros que nós temos, o déficit poderia praticamente desaparecer no ano que vem, este ano cai para 1,7% PIB ano que vem estaria em 0,2%, 0,3% (do PIB), se a economia conseguir manter o ritmo de crescimento”, disse. “Não vai ser agora que eu vou ficar pessimista. Agora, está tudo melhorando. Está tudo melhorando”, concluiu.