O PESO DA CORRUPÇÃO

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O mercado de luxo de Brasília está sentindo, como nunca, o peso do combate à corrupção. Lojas de grifes que, até bem pouco tempo, ostentavam os maiores índices de vendas do país estão amargando forte queda no faturamento e tendo que demitir funcionários. Clientes que costumavam chegar aos estabelecimentos com maços de dinheiro desapareceram. Alguns foram presos pela Polícia Federal.

Não é segredo para ninguém que recursos desviados da União e do governo federal sustentaram parte importante da economia do Distrito Federal. Muitos dos envolvidos em corrupção nunca fizeram questão de esconder a forma fácil como enriqueceram. Foram essas pessoas que ajudaram o mercado de luxo de Brasília a se tornar o terceiro do país, atrás de São Paulo e do Rio de Janeiro.

O primeiro baque para as empresas que investiram nos endinheirados se deu no fim de 2009, quando foi deflagrada a Operação Caixa de Pandora. Conhecido como mensalão do DEM, o esquema consistia no pagamento de propina a políticos da base do governo em troca de apoio no Legislativo.

A partir do momento em que a corrupção se escancarou, o mercado de luxo se retraiu. Pouco tempo depois, porém, as vendas retornaram com tudo. Novamente, Brasília voltava a ostentar números impressionantes dentro das redes que se especializaram em atender o público de alto poder aquisitivo. Do meio do ano passado para cá, a situação se inverteu novamente. A deflagração da Operação Lava-Jato fez parte da clientela desaparecer e o faturamento, despencar.

Para desânimo do mercado, está em andamento, agora, a Operação Zelotes, que investiga fraudes no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Espécie de tribunal que ratifica ou não as multas impostas pela Receita Federal, o órgão pode ter provocado perdas de R$ 19 bilhões aos cofres públicos. “Estamos apreensivos. Mesmo com a economia em situação ruim, conseguíamos manter as vendas em níveis adequados”, admite um profissional que atua no segmento de luxo. “Mas sempre que há alguma operação da PF, a demanda cai”, acrescenta.

Os economistas ressaltam que não dá para atribuir o sucesso do mercado de luxo de Brasília ao dinheiro oriundo da corrupção. Lembram que a capital do país tem renda elevada por sediar os Três Poderes, que pagam salários altíssimos quando comparados aos da iniciativa privada. Somente no Lago Sul, onde um terreno pode custar R$ 7,5 milhões, a renda per capita chega a R$ 82 mil, o equivalente a US$ 26 mil, bem superior à da Suécia, de US$ 18,6 mil.

Não se pode esquecer ainda, no entender dos especialistas, de que, no governo Lula, houve um grande incremento no quadro de pessoal da administração federal e reajustes muito fortes nos salários. Nos concursos realizados, a prioridade foi para a elite do funcionalismo, com salários iniciais de R$ 15 mil. “Com certeza, os servidores ajudam a sustentar nossas vendas. Mas é o pessoal que ganha dinheiro fácil, do qual não se sabe a origem, que compra sem perguntar os preços, que sempre leva para casa as peças mais caras”, afirma um gerente de um estabelecimento de artigos de luxo.

O susto de Furlan

» Logo quando chegou a Brasília, no início do governo Lula, em 2003, o então ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, se disse espantando com a ostentação de riqueza no Lago Sul. Afirmou que ficava impressionado com a quantidade de carros nas garagens das casas.

Revolta dos nobres

» Diante do que viu, Furlan declarou que, se pudesse, recomendaria ao então colega e ministro da Fazenda, Antonio Palocci, que mandasse fiscais da Receita Federal conferirem se a ostentação dos moradores do Lago Sul era compatível com a renda deles. O então ministro foi hostilizado pela população do bairro nobre de Brasília, que organizou uma manifestação em frente ao Ministério do Desenvolvimento.

Inflação de 8,17%

» O economista-chefe do Banco Santander, Maurício Molan, aposta em alta de 1,36% para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de março, que será divulgado na quarta-feira. Se ele estiver certo, a inflação oficial acumulada em 12 meses chegará a incríveis 8,17%, a maior desde 2003, quase o dobro do centro da meta definida pelo governo, de 4,5%.

Reajustes disseminados

» Pelos cálculos de Molan, a carestia de março foi puxada, sobretudo, pela energia elétrica, com alta de 24%, e pelos alimentos, com reajuste médio de 1,24%. Ele chama a atenção para o salto no custo da alimentação fora de casa, com reajuste de 8%. Para o economista, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrará disseminação nos aumentos de preços.

Brasília, 20h59min

Vicente Nunes