O INFERNO DE LEVY

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O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, sabe que viverá o inferno nos próximos dias. A decisão de reduzir as metas de superavit primário deste ano e de 2016 e 2017 abriu um flanco que ele não imaginava para os inimigos de dentro do governo que estavam prontos para lhe dar o bote. A meta desse grupo é enfraquecer o máximo possível aquele que é apontado como um invasor, um estranho no ninho.

Logo na manhã de ontem, o ministro fez uma grande varredura nos jornais para ver como a mídia havia tratado o anúncio do afrouxamento fiscal. Incomodou-se com o que viu, sobretudo com as informações atribuídas a pessoas do Palácio do Planalto de que ele havia perdido a batalha travada com o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, defensor de um superavit mínimo neste ano.

Levy garante que partiu dele a proposta da meta de 0,15% para este ano, depois de varar madrugadas com sua equipe tentando fechar as contas com a arrecadação em queda. Seu assessores, inclusive, vinham atuando para convencer as empresas que tinham adiado o pagamento de impostos a retomarem os recolhimentos. Mas se depararam com um quadro dramático: não havia lucro a ser tributado, devido à forte retração da atividade.

A versão dos inimigos é a de que o ministro defendeu, com todas as forças, manter em 1,13% do Produto Interno Bruto (PIB), ou pelo menos reduzir o mínimo possível a economia para o pagamento de juros da dívida. Na segunda-feira, Levy ficou até as 2h numa conversa com a presidente Dilma Rousseff, da qual teria saído convencido de que a chefe fechara questão em não mexer no superavit agora para sinalizar aos investidores que o compromisso com o ajuste fiscal estava mantido.

A derrota de Levy, por sinal, foi tema de várias conversas ontem no Planalto. Assessores da presidente diziam que o ministro da Fazenda havia caído na real, que o arrocho imposto por ele estava agravando a recessão e, pior, fazendo disparar o desemprego. A visão, agora, é de que o ministro está começando a vestir o figurino do governo, mesmo que a contragosto. Diga ao povo que fico Apesar das claras demonstrações de satisfação dentro do governo com a redução das metas fiscais, dois ministros muito próximos da presidente Dilma garantem que Levy está firme como uma rocha, com total apoio da chefe. O próprio Levy também faz questão de reforçar que não há a menor possibilidade de ele deixar o governo, pois acredita que ainda tem muito a contribuir com o país. No entender dele, o prolongamento do ajuste será bom para a economia, dada a conjuntura atual, pois, além de manter o compromisso com arrumação das finanças do país, trará de volta a transparência que as contas públicas perderam nos últimos anos.

Entre os que circulam no entorno do ministro da Fazenda, há a preocupação de mapear todos os focos do fogo amigo disparado contra ele. A percepção é de que o grosso do pelotão contrário está no PT, o partido da presidente, que ainda não assimilou o fato de uma pessoa de fora das hostes da legenda, com passagem pelo mercado financeiro, sentar-se na cadeira mais importante da Esplanada dos Ministérios.

O descontentamento do PT aumenta porque muitos gostariam que o governo retomasse suas políticas populistas para tentar recuperar a popularidade de Dilma, que esta no chão. Na avaliação de Levy, o melhor que a presidente tem a fazer é dar um boa direção na economia para que a confiança seja restabelecida, as incertezas desapareçam do horizonte e os investimentos produtivos voltem.

Daqui a 10 dias, quando o Congresso voltar ao trabalho, o ministro terá seu grande teste. Mesmo com o PMDB fragilizado, já que dois de seus principais caciques — os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros — foram solapados pela Operação Lava-Jato, ele acredita que encontrará espaço para aprovar as medidas que garantirão parte dos R$ 26,4 bilhões que evitarão o Brasil de fechar o ano com rombo nas contas.

Desta vez, mais do que gogó e promessas, Levy terá que acumular vitórias. Desde que assumiu a Fazenda, ele nunca pareceu tão frágil aos olhos dos agentes econômicos.

Lava-Jato e o PIB » A Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda fez estudo e constatou que os efeitos da Operação Lava-Jato, que desmontou o esquema de corrupção das empreiteiras na Petrobras, vão tirar pelo menos 1 ponto percentual do PIB. No colo do Banco Central » A redução da meta de superavit primário jogou duas bombas no colo do Banco Central: gastos maiores do governo e alta do dólar, ambos fatores inflacionários.

Emergentes rebaixados » Pelos cálculos do banco de investimento Brown Brothers Harriman (BBH), haverá uma onda de rebaixamento de países emergentes pelas agências de classificação de risco. Além do Brasil, devem perder o grau de investimento a Turquia, a África do Sul e a Rússia. Irritação de Barbosa » O motivo ninguém sabe, mas o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, saiu bufando do Ministério da Fazenda ontem, depois da reunião do Conselho Monetário Nacional.

Brasília, 00h10min

Vicente Nunes