O MAL QUE FAZ O INCONFORMISMO

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Aqueles que se dizem cansados de tantas denúncias de corrupção no país, mas pouco fazem para mostrar indignação e cobrar medidas concretas a fim de coibir a roubalheira, deveriam ouvir o alerta do juiz Sérgio Moro. “Parece que a Operação Lava-Jato é uma voz pregando no deserto”, disse. Na visão do magistrado, que afirmou estar decepcionado, nem o governo nem o Congresso se movimentaram no sentido de apresentar respostas institucionais para combater os desvios. Isso, apesar de todo o impacto causado pelas revelações de que a Petrobras, a maior empresa brasileira, foi saqueada para bancar o projeto de poder do PT.

As declarações de Moro foram dadas um dia antes de a Polícia Federal realizar a 21ª fase da Lava-Jato, que levou para a cadeia o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo pessoal do ex-presidente Lula. As investigações identificaram que ele pegou empréstimos de ao menos R$ 518 milhões com o Banco Nacional de Desenvolvimento e Social (BNDES), sem qualquer critério técnico, e parcela dos recursos pode ter sido desviada para contas de petistas e de integrantes da base aliada do governo.

A resistência ao combate à corrupção não surpreende. Governo e Congresso se alimentam desse veneno que mata a economia e destrói a esperança dos brasileiros. A máquina está montada para sugar os recursos públicos de forma irregular e, assim, manter estruturas partidárias cujo único compromisso é garantir mais roubalheira. Mesmo que a Lava-Jato leve mais políticos e empresários para atrás das grades, pessoas como Sérgio Moro continuarão pregando no deserto. Se houver algum tipo de ação, será para dificultar as investigações e não para incomodar os que estão roubando.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de fatiar a Lava-Jato vai exatamente na direção que não pode ir. O desmembramento dos processos tira a força das investigações e das provas. A corrupção desvendada pelas equipes da PF, da Justiça Federal e do Ministério Público, que atuam em Curitiba, está completamente amarrada. Não há como um pedaço do processo — o que trata dos desvios da Eletronuclear — ficar no Rio, e, outro — envolvendo o pagamento de propina pela empresa Consist para a senadora Gleisi Hoffmann — ser mandado para São Paulo. É o tipo de manobra que só favorece os corruptos.

Acordo inaceitável

A Lava-Jato foi deflagrada há mais de um ano. Nesse período, em vez de uma resposta clara à sociedade, o que se viu, tanto por parte de integrantes do governo quanto do Congresso, foi uma tentativa de desqualificar o trabalho conduzido por Sérgio Moro. Investigados pela Lava-Jato se acharam no direito de questionar o trabalho da força-tarefa instalada em Curitiba, alegando excessos e faltas de provas. Felizmente, as operações continuaram e estão mostrando que a rede de corrupção tem fortes ligações com o Palácio do Planalto.

O momento não é de recuo. Mesmo com todas as adversidades e isolamento, a Lava-Jato trouxe conquistas importantes para o país. Para que ela saia do deserto é preciso que a sociedade se engaje. Não basta apenas a reclamações das mesas do boteco, das filas dos supermercados, das salas de espera do médico. A cobrança por medidas que limem de vez as mazelas da corrupção deve ser diária. A indignação não pode permitir que continuemos a aceitar que cargos estratégicos para o país, como as presidências da Câmara e do Senado, sejam ocupadas por pessoas envolvidas nos desmandos que quase quebraram uma companhia que já foi símbolo de eficiência e de modernidade.

O governo que não age é o mesmo que protege investigados pela Lava-Jato em troca de apoio para a permanência no poder. Os acordos fechados entre a presidente Dilma Rousseff, Eduardo Cunha e Renan Calheiros para garantir a sobrevivência de todos são importantes sinais de que, se não houver um movimento mais claro da sociedade, o risco de o trabalho conduzido pelo juiz Sérgio Moro se perder pode ser mais real do que se imagina.

Mesmos indignados com a Operação Lava-Jato, os acusados de terem surrupiados o caixa da Petrobras só não conseguiram frear as investigações porque temem uma reação popular forte. De qualquer forma, vão fazer de tudo para evitar que o combate à corrupção se dissemine. Enquanto estiverem no poder, não darão nenhum passo no sentido de promover a revolução que o país precisa para extirpar o mal que nos priva de um futuro melhor.

Economia em frangalhos

Quanto mais o governo e o Congresso demorarem a agir, maior será o custo imposto à economia. Não bastasse o país ter que assumir a fatura imposta pelas maluquices cometidas por Dilma na política econômica, desde que a Operação Lava-Jato desvendou a corrupção na Petrobras, o Produto Interno Bruto (PIB) derreteu. Serão pelo menos dois anos de retração da atividade e de desemprego em alta — o exército de desocupados já soma 9 milhões de pessoas.

Não é só. As agências de classificação de risco já avisaram que a corrupção pesará bastante na hora de definirem se vão ou não rebaixar o país. A falta de compromisso de governantes e legisladores em impor regras rígidas para evitar desvios de recursos públicos é um forte indicativo de que o país resiste a mudar. O resultado disso é o escárnio de envolvidos na Lava-Jato continuarem cometendo crimes mesmo depois de terem cumprindo penas pelo mensalão.

Quando alerta para a falta de respostas institucionais ao combate à corrupção, Sérgio Moro pede uma ação mais firme da sociedade. Não há dúvidas, no entender dele, de que o Brasil melhorou muito nos últimos 20 anos, ao se livrar da praga da hiperinflação e ao obter avanços sociais importantíssimos. Pena que os ganhos da estabilidade não conseguiram pôr fim ao mal de acomete a maioria dos brasileiros: o conformismo.

Brasília, 08h30min

Vicente Nunes