ANTONIO MACHADO
Três doenças, cujos sintomas só costumam manifestar-se em fase mais avançada, muitas vezes terminal, acometem o país: obsolescência da governança institucional, esclerose da política econômica dirigida obcecadamente ao equilíbrio entre os gastos e as receitas públicas e o vírus do oportunismo, quando o cinismo corrói a coesão social.
Como e quando irromperam essas doenças?
Primeiro, gradualmente: desde 1980, a economia cresce bem abaixo do crescimento econômico médio global, com destaque para o paulatino declínio da indústria. A perda de relevância da economia tanto como fator de progresso social quanto na ordem mundial se acentuou com o viés fiscalista da política econômica a partir da reforma monetária de 1994 e se agravou com o desmonte do Estado pelo atual governo.
Depois, abruptamente: a disseminação entre as elites empresariais e políticas do senso de que o país flerta com a insolvência, devido a gastos públicos irrefreáveis, produziu duas grandes reformas, ambas incapazes de repor o desenvolvimento — a da Previdência e a que pôs teto na expansão da despesa da lei orçamentária, congelada ao valor nominal de 2017 e corrigida só pela inflação durante dez anos.
Entre tais reformas, a do teto, em 2017, e a da Previdência, em 2019, o Congresso, em conjunto com o governo, deveria ter aprovado muitas outras mudanças voltadas a: 1) reduzir os custos de burocracia, de conformidade e de obrigações acessórias, genericamente chamados de “custo Brasil”; 2) transmitir a confiança de que não haveria clima para voluntarismo decisório pelas décadas à frente; 3) desobstruir os investimentos privados e públicos; 4) promover as transformações de forma a ter a criação de emprego e renda regular como resultado; 5) induzir concorrência movida pela inovação e abertura comercial; 6) adequar a educação aos requisitos demandados pelos novos tempos.
Tais objetivos ficaram na teoria, em parte contaminados ora pela pregação moralista da Laja-Jato, ao disseminar o sentimento de que a corrupção seria causa de todas as frustrações, ora pela ideologia ultraliberal levada ao atual governo pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, implicando a paralisia de áreas relevantes de gestão e planejamento do setor público ou o sucateamento — bancos, Sistema Único de Saúde (SUS), órgãos executivos e de controle, tipo Ibama, Funai, INPE, universidades etc.
De modo geral, vivemos uma espécie de sociopatia coletiva, em que o governo, com a conivência de políticos, é sua resultante terminal.
Brasília, 19h20min