O Banco Central terá coragem de enfrentar Bolsonaro e subir juros?

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Nao foram poucas as vezes em que o presidente Jair Bolsonaro revelou sua satisfação diante da disposição do Banco Central em cortar os juros. Recentemente, ele não se furtou em opinar que a taxa básica (Selic) deveria cair abaixo dos atuais 2% ao ano para estimular a economia.

Diante de tais manifestações, integrantes da equipe econômica começam a se perguntar: o Banco Central terá coragem de aumentar os juros e enfrentar Bolsonaro? Para a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, o embate entre o BC e o presidente da República já está marcado. Com a inflação em alta e as contas públicas em frangalhos, não restará ao BC outra alternativa que não seja a de apertar a política monetária.

A dúvida no Ministério da Economia é a mesma do mercado: se o Comitê de Política Monetária (Copom), que se reúne nesta terça e na quarta (27 e 28/10), antecipará a alta dos juros, criando ruídos com o Palácio do Planalto. Bolsonaro está mergulhado até o pescoço na campanha pela reeleição. E não quer dar munição aos adversários, sobretudo ao governador de São Paulo, João Dória, com quem está em pé de guerra.

Projeções apontam para alta dos juros em dezembro

Pelas projeções do Banco Haitong, 72% dos analistas apostam em aumento de 0,25 ponto percentual na taxa Selic em dezembro e 52%  projetam elevação de 0,25 ponto em janeiro. Outros 48% já trabalham com alta de 0,50 ponto nos juros no primeiro ano de 2021. Ou seja, o arrocho monetário está mais próximo do que nunca.

A percepção do mercado de que o Copom aumentará os juros consolidou-se depois da divulgação da prévia da inflação de outubro, com alta de 0,94% do IPCA-15, a maior para o mês desde 1995. Com isso, os analistas ouvidos pela pesquisa Focus, do BC, elevaram as estimativas para o custo de vida de 2,65% para 2,99% em 2020 e de 3,02% para 3,10% em 2021.

Em ambos os casos, as expectativas estão abaixo das metas de inflação, de 4% e de 3,75%, respectivamente. Mas já se consolida o consenso de que a carestia vai além dos preços dos alimentos. A alta desses produtos vinha sendo apontada com temporária. Agora, os reajustes estão mais disseminados.

Não por acaso, todas as atenções estão voltadas para o comunicado do Copom após sua reunião. Boa parte dos analistas acredita que o BC mudará o discurso do seu forward guidance. O primeiro passo será retirar do texto a possibilidade de cortes adicionais nos juros. Definitivamente, não há mais espaço para isso.

Outro ponto a ser considerado no possível embate entre Bolsonaro e o BC por causa de um eventual aumento dos juros é o projeto que está no Congresso e prevê independência à autoridade monetária. Se a proposta em discussão for aprovada, o presidente da República não poderá mais demitir diretores do BC por livre e espontânea vontade. Para o grande público, Bolsonaro se diz favorável ao projeto. Mas, pelo histórico, é difícil acreditar no chefe do Executivo. O que ele diz não pode ser levado muito a sério.

Brasília, 13h54min

Vicente Nunes