Novo imposto de Guedes não impede estouro do teto de gastos

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ROSANA HESSEL

O governo passou a defender a criação de um novo imposto defendido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes,  nos moldes da velha Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), para conseguir recursos para criar o novo programa que vai tomar lugar do Bolsa Família. Contudo, qualquer despesa que for criada para complementar o benefício, se não houver uma redução de gastos no Orçamento de 2021 correspondente, vai implicar em estouro no teto de gastos.

No Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2021, o governo prevê R$ 34,8 bilhões em gastos para o Bolsa Família e não há espaço algum para aumento de despesa, porque a previsão de gastos primários equivale ao limite do teto, ou seja, R$ 1,485 trilhão. Logo, qualquer gasto adicional com o novo programa vai estourar o teto, mesmo se o governo criar uma nova CPMF, que virou uma fixação do ministro da Economia Paulo Guedes. A simples derrubada do veto da prorrogação da desoneração da folha já explode o teto em algo em torno de R$ 10 bilhões, valor bem inferior ao que um tributo nos moldes da CPMF deverá arrecadar anualmente.

A emenda constitucional limita o crescimento de despesas sujeitas ao teto pela inflação do ano anterior, criando o novo regime fiscal em 2016 e é a única regra de responsabilidade fiscal que sobrou. A meta de resultado primário e a regra de ouro já foram flexibilizadas e, portanto, uma mudança logo quando a regra vai começar a ter efeito na prática derruba qualquer confiança no governo sobre a capacidade dele em controlar a explosão da dívida pública, que deverá encostar em 100% do PIB neste ano.

Mas o próprio governo já está sabotando o teto de gastos, apesar de tanto o ministro Paulo Guedes e o líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), afirmarem, ontem, que a regra do teto, que é a única âncora fiscal remanescente, será preservada. Basta ver a aprovação dos reajustes para os militares do Distrito Federal e as promoções de servidores da Advocacia-Geral da União (AGU), medidas na contramão da proposta de reforma administrativa. São gastos que vão impactar nas contas públicas por muitos anos a fio e vão comprimir ainda mais o piso do teto. E, para piorar, o próprio presidente Jair Bolsonaro recomendando para os parlamentares derrubarem o veto dele para o perdão de dívidas tributárias de igrejas é outra incoerência com o compromisso de responsabilidade fiscal.

Pelas estimativas da Instituição Fiscal Independente (IFI), os gastos sujeitos ao teto na PLOA de 2021 estão subestimados em pelo menos R$ 20,4 bilhões, o que necessitaria um contingenciamento logo no início do ano que vem para que o governo não comece 2021 já com o telhado furado. Desse jeito, não há teto que aguente e o mercado já está precificando o estouro do teto, pois não está acreditando nas conversas de Guedes e Barros.

Ontem, o dólar encostou em R$ 5,60 por conta dessa desconfiança de que o teto já ruiu e não há, até agora, uma proposta do governo para uma nova âncora fiscal. Aliás, não vai adiantar. Quando a confiança é quebrada, não há como consertar, avisam especialistas.

O discurso do governo agora passou a ser que a plataforma de defesa do emprego, uma vez que a taxa de desemprego deverá disparar nos próximos meses, podendo chegar a 17%, em 2021, pelas estimativas da MB Associados. Contudo, especialistas já criticam a falta de uma estratégia definida de política pública de Paulo Guedes e sua equipe. O consenso em formação é de que não existe um bom formulador de uma saída para a crise dentro do governo e que o superministro está encolhendo e perdendo relevância no meio dessa recessão.

Vicente Nunes