“Não consigo enxergar correção de rumos”, lamentou a especialista que sempre defendeu resultados concretos da equipe econômica, algo que Guedes não conseguiu cumprir as promessas feitas desde que assumiu o cargo, como arrecadar R$ 1 trilhão com privatizações e melhorar a eficiência do gasto público. “Não se trata mais de fazer discurso e trocar o time. É preciso entregar, e este governo não tem muito que entregar. O que vai acontecer é um leve respiro”, afirmou. “A credibilidade está muito arranhada”, disse.
Essa mobilização do de Bolsonaro e de Guedes buscou acalmar o mercado, porque o dólar disparou e a Bolsa de Valores abriu em queda pelo segundo dia seguido em meio à confusão na pasta que culminou com a nova debandada na equipe econômica, segundo a economista. O mau humor do mercado voltou, ontem, um dia depois de o ministro da Economia anunciar que pediria uma “licença” para gastar mais e estourar o teto de gastos a fim de arrumar espaço fiscal para o novo Bolsa Família de R$ 400, sem cortar um centavo de emenda parlamentar ou de subsídios. Esse discurso de Guedes foi visto como uma guinda do ministro para o populismo de Bolsonaro, que nunca foi foi um político liberal, historicamente. Não à toa, mercado financeiro mostrou o descontentamento e a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) desabou fazendo os investidores perderem R$ 284 bilhões no valor das ações da B3 um único dia, conforme levantamento da Economática.
De acordo com Zeina Latif, o governo precisa mostrar algo concreto de que vai realmente melhorar a disciplina fiscal. “Não adianta o governo falar que vai respeitar o teto de gastos, como fez o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), se a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios (que institui calote de dívidas judiciais) apresentada ontem pelo relator (o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), é pior do que o texto enviado pelo governo”, lamentou. “Não dá mais fizer uma palavra aqui e ali. Se, por ventura, o mercado der uma sossegada, é momentânea, até vir a próxima notícia ruim”, emendou.
Pelos cálculos de especialistas em contas públicas, o texto da PEC dos Precatórios aprovado, ontem, na comissão especial da Câmara dos Deputados amplia em mais de R$ 90 bilhões as despesas extra-teto. Além da pedalada em cerca de R$ 50 bilhões dos R$ 89,1 bilhões previstos no Orçamento para o pagamento de dívidas judiciais, o relator mudou a base de cálculo para o reajuste do limite do teto. Em vez de utilizar o IPCA acumulado em 12 meses até junho do ano anterior, a proposta altera o indexador para os 12 meses encerrados em dezembro, o que poderá significar cerca de R$ 45 bilhões a mais para o governo gastar, se a inflação oficial não encerrar o ano em dois dígitos.
Na avaliação da consultora, o governo precisa mostrar que, pelo menos, tenta cortar onde é possível para abrir espaço fiscal para criar o benefício social prometido há mais de um ano, sem sucesso. “Ninguém quer mexer em nada. Tá todo mundo (da ala política do governo) preocupado com a reeleição, assim como o Lira, que quer eleger o grupo dele. Para eles, a inflação (que é consequência da piora fiscal), não é problema deles. Não estamos vendo esforço do governo desde a aprovação da PEC Emergencial, que o mercado tentou ficar otimista com ela, mas ela é muito ruim. Não tem nenhum ajuste. Agora, as expectativas se ajustam e será preciso que o governo entregue muito mais”, acrescentou.
Diante do mau humor dos mercados, Bolsonaro foi ao Ministério da Economia para conversar com Paulo Guedes e sinalizar que o ministro continua forte. Durante o pronunciamento de ambos à imprensa, a B3 chegou a zerar as perdas, chegando a 107 mil pontos. Contudo, no fim da fala do ministro, que disse que prefere tirar nota 8 em fiscal do que 10, o Índice Bovespa voltou a operar com queda. Por volta das 16h30, recuava mais de 1%, a 106,6 mil pontos.