ROSANA HESSEL
Apesar de o futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciar dois economistas respeitados pelo mercado financeiro, como Bernard Appy e Gabriel Galípolo — os primeiros dois nomes da equipe econômica –, o novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já dá sinais de que quer cometer, infelizmente, os mesmos erros do passado e deixa o mercado financeiro mais apreensivo.
O fato de Lula afirmar que não quer privatizar mais nenhuma estatal e ainda anunciar o nome do ex-senador e ex-ministro da Casa Civil do governo Dilma Rousseff (PT), Aloizio Mercadante, é apenas a ponta do iceberg de preocupações do governo sobre retrocessos na Lei das Estatais, que precisará ser mudada para que Mercadante assuma o cargo.
Ao tentar agradar a ala política colocando Mercadante longe de Brasília, os retrocessos que entrara no radar devem provocar estragos no mercado financeiro e na imagem do país junto a investidores internacionais que Lula disse que pretende trazer de volta ao país. Ele diz que não esqueceu que foi injustiçado, mas evita comentar sobre os erros do PT no poder e parece que quer repeti-los antes mesmo de assumir o cargo.
A Lei das Estatais, aprovada em 2016, durante o governo Michel Temer (MDB), com é considerada por analistas um avanço para evitar o aparelhamento político das empresas públicas e evitar escândalos de corrupção como o da Petrobras. E, na calada da noite de ontem (13/12), a Câmara dos Deputados aprovou um jabuti em um projeto de lei que reduz de três para um mês o período que um dirigente partidário tem que esperar para ocupar um cargo em estatal. Com isso, Mercadante estaria apto para assumir o comando do BNDES e outros políticos também poderão assumir cargos em empresas públicas. A mudança ainda precisa ser aprovada pelo Senado.
Reação imediata
A reação dos agentes financeiros e especialistas foi imediata à mudança na Lei das Estatais . A Bolsa de Valores de São Paulo (B3) abriu o pregão desta desta quarta-feira (14/12) em queda de quase 1%, o dólar voltou a subir e já é cotado a R$ 5,34, e os investidores passam a exigir maior premio de risco para os títulos públicos.
Não à toa, o Tesouro Nacional precisou suspender novamente as operações do Tesouro Direto no início da manhã por meia hora. Foi o terceiro dia seguido de suspensão nos negócios, diante da forte volatilidade de preços e taxas dos títulos públicos. O Tesouro Selic com vencimento em 2025 está sendo vendido com taxa anual de 13,8% e os títulos indexados à inflação, o Tesouro IPCA, já pagam prêmio de rico de 6,55% nos papéis com vencimento em 2055.
Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset, reconheceu que o mau humor de hoje do mercado é resultado dessas medidas em direção ao retrocesso. “Desmontar a Lei das Estatais, da forma em que foi é de um casuísmo que muito me impressionou”, lamentou. Ele lembrou que, nos anos de governo do PT, o aparelhamento das estatais eram frequentes e geravam corrupção. “Estudos acadêmicos reafirmam esta conexão entre uso político de estatais e corrupção. Geralmente, estes políticos acabam alocados em departamentos de compra, de licitações, por exemplo. De certa forma, a Lei das Estatais ‘blindou’ as empresas desses ataques e, com isso, elas voltaram a ter bons resultados”, acrescentou ele, em referência ao lucro recorde da Petrobras depois do desaparelhamento. “Os sinais são péssimos”, emendou.
A economista e advogada Elena Landau, ex-diretora do BNDES e responsável pelo programa de privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), também demonstrou a sua indignação nas redes sociais. O PT conseguiu, na calada da noite, mudar a lei da estatais, coisa que Bolsonaro tentou durante muito tempo e não levou. A Lei agora se chama Lei Aluízio Mercadante”, escreveu.
Logo, o anúncio de Lula de não querer privatizar nenhuma estatal, nem mesmo aquelas que são deficitárias e servem apenas para serem meros cabides de emprego, é mais um sinal ruim sobre o zelo do novo governo com o dinheiro dos contribuintes de fato. Uma afirmação de que analisaria quais são estratégicas para as políticas econômica e social do futuro governo seria mais equilibrado. Até agora, ninguém da equipe de transição de Lula fala em revisão de gastos ineficientes e, muito menos, corte de despesas, como subsídios. A equipe de Bolsonaro chegou a prometer, mas não cumpriu de fato. Pobre Brasil.