POR MÔNICA CABAÑAS, da Cidade do México
Ao pensar em contar aos brasileiros o que temos vivido no México desde setembro último, me lembrei do cantor e compositor Belchior que, em uma de suas músicas, dizia: ”….quero lhe mostrar o que vivi e tudo o que aconteceu comigo….”. Desculpe decepciona-los se esperam que lhes conte sobre número de vítimas, casas e edifícios derrubados, intensidade dos terremotos, pessoas encontradas, impacto na economia e todas essas informações, verdadeiras ou falsas (vide a história da menina Frida), que todos vêm escutando no mundo todo desde 7 de setembro de 2017.
O que quero contar para vocês é a respeito de ressignificação de palavras e sentimentos, de descobertas pessoais e coletivas de emoções. De ser reapresentada, com toda intensidade, a uma palavra que nos últimos tempos pensava que havia desaparecido do dicionário mundial. Essa palavra mágica é SOLIDARIEDADE.
Dos intensos terremotos que atingiram o país, o primeiro em 7 de setembro, considerado o mais forte dos últimos 100 anos, e o segundo, em 19 do mesmo mês, que foi, na realidade uma sequência de dois terremotos, quase dentro da Cidade do México, no dia em que o histórico sismo que destruiu a capital do país completou 32 anos e 2 horas após a realização do grande treinamento antissísmico anual, reativaram a utilização de outras duas palavras em desuso pelo mundo: esperança e amor ao outro.
O que vimos nas ruas das cidades mexicanas atingidas pelos terremotos foi o enorme trabalho desenvolvido por milhares de socorristas, alguns deles munidos sobretudo de grande vontade e desejo de salvar vidas, não importando se as vidas em questão possuem pernas ou patas. Alguns desses socorristas eram cidadãos anônimos que simplesmente estavam passando em determinado local ou eram sobreviventes desses mesmos locais, que formaram correntes humanas para retirar paus, pedras, tijolos, ferros, enfim, todo tipo de escombro com o único objetivo de salvar uma vida.
Redes de distribuição
Por toda a Cidade do México e nas demais cidades do país se formaram o que eles chamam de “Centros de Acopio”, que foram organizados por instituições públicas, privadas, por clubes, ONGs, Parques, vizinhos, ruas, restaurantes, empresas, enfim, todos que desejavam de alguma forma ajudar e apoiar as vítimas dos terremotos. Nesses Centros, muitos voluntários trabalharam, foram criados albergues para receber pessoas que perderam suas casas, organizaram-se grupos para localizar e receber animais perdidos e devolver aos seus donos, além de postos de atendimento médico e redes de distribuição de comida aos socorristas e aos desabrigados.
A solidariedade dos residentes no país se somou o apoio de diferentes países no mundo que enviaram suas principais equipes de socorristas para apoiar nas buscas aos sobreviventes. Internamente, diferentes profissionais, engenheiros, arquitetos, psicólogos, médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, universidades, advogados e etc. se juntaram a população para, dentro de sua especialidade, realizar ações e atividades que pudessem minimizar o sofrimento coletivo.
Na luta que os socorristas empreenderam por todo o pais, a cada mão levantada do coordenador da equipe – que simbolizava o pedido de silêncio para permitir a escuta os pedidos de socorro vindos dos escombros e que se transformou em símbolo de luta pela vida – a esperança renascia. O México nunca mais será o mesmo país após o último mês setembro, não somente pela dimensão humana da tragédia que vive o país, mas também pela percepção da sociedade de toda sua força e vitalidade.
Sonhos e realidade
Quem vive no México vem descobrindo de forma individual e coletiva que, sim, pode mudar seu destino; que, sim, pode fazer a diferença; que, sim, pode ser solidário, amoroso, forte, esperançoso, ter sonhos e transforma-los em realidade; que, sim, pode salvar vidas, se doar; e que, sim, somos parte de um conjunto denominado sociedade e que essa sociedade pode, sim, organizar-se e transformar estruturas, evoluir, aprender, e viver uma realidade diferente da até então vivida.
A Mãe Terra, como uma mãe preocupada em fazer com que cresçamos, moveu-se forte em setembro no México e segue se movendo diariamente em diferentes regiões do país, mas o que ela realmente despertou em todos nós, que vivemos no México, foi a certeza de que, unidos e solidários e desvinculados de paixões irracionais e preconceitos, somos capazes de reconstruir, tanto interna como externamente, este país rua a rua, bairro a bairro, cidade a cidade, estado a estado.
Por tudo isto que lhes contei, o México foi e sempre será “…lindo e querido…”, como canta o famoso artista mexicano Jorge Negrete, e capaz de despertar em nossas mentes e corações a possibilidade de reencontrar uma nova forma de viver, em que a humanidade ainda possui a capacidade de ser SOLIDÁRIA.
Brasília, 20h38min