ROSANA HESSEL
Um dia após o resultado do primeiro turno das eleições, o mercado financeiro parece ter aberto com bom humor com a perspectiva de um segundo turno entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL). A Bolsa voltou a subir e o real se valorizou em relação ao dólar.
Acompanhando o bom humor dos mercados internacionais, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) subiu pouco mais de 4,5% e o Índice Bovespa (IBovespa) chegou a recuperar o patamar de 115 mil pontos, no início da tarde desta segunda-feira (3/10), mas oscilou em seguida e voltou a ganhar força no meio da tarde, avançando mais de 5%.
As ações da Sabesp lideraram as altas da B3, com valorização de 16%, e os papéis da Petrobras subiam acima de 6,6%. Em Nova York, o Índice Dow Jones avançava pouco mais de 2% e o Nasdaq, 1,4%. Enquanto isso, o dólar caia mais de 4% e era negociado a R$ 5,16 para a venda.
As opiniões de analistas sobre quem vencerá estão divididas, mas eles reconhecem que a chances de um Lula mais ao centro aumentaram com a nova composição do Congresso, que terá o PL, partido de Bolsonaro com as maiores bancadas, tanto na Câmara quanto no Senado. “É a precificação de que a vitória do Bolsonaro ficou muito mais provável e que o Congresso terá maioria liberal e pró-reformas”, destacou José Marcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos.
Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, destacou que o mercado avaliou como positiva a confirmação de um segundo turno. “Os candidatos precisam conversar com os eleitores que não são deles, no caso os de centro. Isso ameniza discursos mais radicais”, explicou. “Também teve a leitura de que o centro no Congresso seguirá relevante, o que diminui a chance de populismo. E, nesse sentido, tem a leitura também de que o Bolsonaro tem mais chance de vencer. As ações das estatais estão subindo por conta disso”, destacou.
De acordo com Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset, o mercado está otimista tanto com uma vitória de Bolsonaro quanto de Lula, que precisará ser mais moderado se quiser vencer nas urnas em 30 de outubro. Não à toa, as ações das estatais estão subindo. “A composição do novo Congresso exigirá do novo presidente muita negociação, principalmente, no caso de o novo presidente ser Lula”, afirmou. Ele lembrou que o fato de as pesquisas estarem “erradas”, deu fôlego maior ao bolsonarismo. “A verdade é que a sociedade brasileira é, sim, conservadora, não neste papo de costumes. Na verdade, parte da classe média não quer o PT de volta e controlando as estatais. Não é que gostem do Bolsonaro, não, mas seria o que tem para hoje. Mas claro que ainda é cedo para uma leitura definitiva. Vamos ver o que vem por aí nesta hipótese nova para o segundo turno, com Bolsonaro mais fortalecido”, destacou.
Na avaliação de Thomas Mathews, economista sênior da Capital Economics, os investidores parecem ter encarado positivamente a perspectiva de uma vitória de Lula, “até agora”. “Mas suspeitamos que os retornos dos títulos e ações em dólar do país decepcionarão nos próximos dois anos”, alertou. Para ele, para inverter esse resultado do placar do primeiro turno, em que Lula teve 48,5% dos votos e Bolsonaro, 43,3%, seria preciso uma grande chacoalhada nesse cenário.
“Até agora, a reação do mercado tem sido positiva: o real se valorizou fortemente em relação ao dólar, os rendimentos dos títulos caíram em geral e o mercado de ações está mais alto. Suspeitamos que isso reflita em parte que, embora a presidência de Lula tenha sido amplamente desconsiderada pelos investidores, o sucesso de candidatos de direita nos estados pode significar que o petista precisará governar mais para o centro do que o contrário”, escreveu o analista da consultoria britânica em um comentário para clientes.
Os agentes financeiros, de acordo com Matheus, parecem estar bastante otimistas com a perspectiva de vitória de Lula, uma vez que se tornou cada vez mais evidente que ele venceria. O real é uma das únicas moedas emergentes que se valorizou em relação ao dólar americano neste ano e os prêmios de risco dos títulos do país em dólar não têm apresentado muita elevação, como ocorreu na última eleição de Lula, em 2002. “Os investidores podem ter se animado com o fato de que, antes mesmo dos resultados de domingo, Lula parecia estar caminhando para o centro. Eles também podem estar olhando para o histórico de sua presidência anterior; apesar dos temores iniciais, ele acabou governando com bastante moderação e os mercados financeiros do país se saíram muito bem”, destacou.
Contudo, ele destacou que os mercados do país passarão por um momento muito mais difícil nos próximos anos, porque, com a economia global caminhando para uma recessão, é improvável um novo impulso como ocorreu nos anos 2000 por conta do boom das commodities ocorra nos próximos anos. “De qualquer forma, suspeitamos que os preços dos metais industriais cairão no restante deste ano e não aumentarão muito em 2023. Além do mais, em contraste com o início dos anos 2000, a formulação de políticas bastante moderadas parece já estar precificada”, destacou. Segundo ele, a tendência será de queda nos preços das ações no restante deste ano, à medida que o crescimento global for decepcionando e os preços das principais exportações de commodities do Brasil caírem.