ROSANA HESSEL
A queda de 0,43% no Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) de maio na comparação com abril frustrou as expectativas do mercado de que a recuperação da economia estava em curso, apesar da segunda onda da pandemia da covid-19 ter sido mais forte em número de mortes. Um crescimento com do Produto Interno Bruto (PIB) acima de 5% é cada vez mais desafiador diante da série de riscos pela frente apontada pela MB Associados.
De acordo com o economista-chefe da MB Associados, existem freios para o crescimento que precisam ser considerados e que favorecem um cenário com uma expansão do PIB mais modesta como prevê a consultoria, de 4,7%, neste ano, e de 1,8%, no ano que vem. Na lista elaborada pelo analista há cinco riscos elencados, mas o especialista cita um sexto risco que precisa ser colocado no radar devido às recentes turbulências que levaram a uma nova reforma ministerial: o choque político e “o peso extra do Centrão” no governo, que poderá ajudar a piorar o quadro fiscal, com aumento de medidas populistas tanto do presidente Jair Bolsonaro quanto de parlamentares da base aliada que poderão colocar em risco o teto de gastos, afugentando os investimentos de longo prazo.
A tensão política em torno dos dois candidatos que ainda lideram as pesquisas, Lula Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro, na avaliação de Vale, “deve se manter a não ser que outra solução possa aparecer no caminho, desde um impeachment, menos provável, até uma terceira via de consenso, um pouco mais provável”.
O analista lembrou que a inflação persistente tem feito o Banco Central sinalizar a manutenção do ciclo de alta da taxa básica da economia (Selic), atualmente em 4,25%, até o fim do ano. Pelas estimativas de Vale, os juros básicos devem encerrar dezembro a 7,25% ao ano, “o que poderá ser um freio na atividade já que a taxa de juros neutra está em 6,5%”.
Segue a lista com os cinco maiores riscos para a recuperação da economia que não podem ser ignorados:
- Terceira onda da pandemia: Dada a vacinação acelerada e o impacto relativamente pequeno da segunda onda na atividade, difícil imaginar que esta terceira onda poderá ter forte impacto na economia. Provavelmente restrições poderão ser impostas à movimentação por causa da variante delta, que apenas agora começa a se espalhar no Brasil. A aceleração da vacinação é ponto relevante de contenção de maior estrago da doença nesse momento. Entretanto, a vacinação em segunda dose segue muito lenta e provavelmente, apenas no fim o ano, será possı́vel uma quantidade relevante de pessoas totalmente imunizadas, segundo a consultoria.
- Crise hı́drica: em que pese a tranquilidade do governo sobre o assunto, a crise hı́drica tem, talvez, o maior potencial em afetar a economia brasileira neste segundo semestre e talvez nos próximos anos. O baixo nı́vel dos reservatórios em relação ao ano passado coloca riscos evidentes em um momento de recuperação da economia em que a demanda por energia se acelera. Os dados dessazonalizados mostram que o nı́vel de reservatórios se encontra em patamar historicamente baixo, comparável aos piores momentos de 2001, 2015 e mesmo ano passado, logo antes da pandemia. Não fosse a pandemia, que diminuiu o ritmo de demanda de energia, talvez estivéssemos em situação ainda mais grave. O fato é que o nı́vel de reservatórios na região Sudeste/Centro Oeste caiu drasticamente nos últimos anos. Dado que o peso da matriz hidroelétrica ainda é elevado, a instabilidade por conta de regimes de seca como o de agora podem manter o cenário energético estressado. Há uma elevada chance de um novo La Niña no fim do ano, que não pode ser descartado. Além da alta já contratada de tarifas, poderá ocorrer impactos adicionais possı́veis de controle maior da demanda de energia que poderia se estender até 2022.
- Aumento mais forte dos juros devido à inflação: Com a manutenção da taxa de câmbio em nı́veis pressionados e os riscos de pressão na tarifa de energia que pode se estender a 2022, o BC não terá muita alternativa a não ser subir a taxa de juros acima da taxa neutra nominal de 6,5%. A MB elevação da Selic para 7,25%, o que mesmo assim talvez não seja suficiente para conter a inflação na meta ano que vem. Aumentamos marginalmente o IPCA de 2022 de 3,8% para 4%. O aumento da taxa real de juros, em que pese ela ainda permanecer baixa ano que vem, é para a casa de 3%, voltando aos patamares de 2018/2019 , o que deverá trazer impacto na atividade, reforçando nossa aposta em crescimento pouco abaixo de 2%.
- Alto desemprego e baixa renda: dos impactos mais duradouros que podemos ter da pandemia, infelizmente o do mercado de trabalho é dos mais difı́ceis de resolver. Não é apenas uma questão de retomada de crescimento, mas de readequação por qualificação de uma mão-de-obra que foi severamente afetada por duas crises profundas em pouco tempo. Com a massa real em queda de 5,5% este ano, o poder de compra da população mais pobre especialmente foi afetada. Alguma reversão deve ter com os R$ 300 de auxı́lio permanente no ano que vem. Mas a classe média tende a ser mais afetada com o adicional de uma reforma tributária com mais peso nela, além da classe mais alta de renda.
- Agricultura: é fato que a agropecuária tem tido forte impacto de renda. Mas do ponto de vista de PIB é relevante também a dinâmica das lavouras e, nesse caso, a produção agrı́cola tem dados sinais de problemas por conta da seca, que não afeta apenas a energia. De fato, a expectativa é por queda na colheita de lavouras importantes como milho, cana-de-açúcar, café e algodão, que devem fazer com que o PIB agro tenha queda no segundo trimestre na margem. Com efeito, a diminuição do IBC-Br de maio contra abril em 0,43% pode ser creditada à reversão da produção agrícola nos últimos meses. Com isso, o PIB da agropecuária tende a ter um crescimento baixo este ano, que por ora consideramos de 1,4%, mas com elevada chance de se aproximar de zero.