POR PAULO SILVA PINTO
Num país destroçado pela recessão e pelo desemprego, qualquer sinal de possível melhora faz a diferença. E a simples troca da equipe econômica pelo presidente interino, Michel Temer, abriu uma faixa de luz num horizonte turbulento. Não por acaso, vários analistas de mercado já veem crescimento levemente maior do Produto Interno Bruto (PIB) em 2017. Tudo são projeções, mas que funcionam como estímulo para um Brasil movido pelo pessimismo.
Os economistas são enfáticos. Para este ano, o quadro já está dado, independentemente do que a equipe chefiada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, venha a fazer. A contração do PIB se manterá até pelo menos o terceiro trimestre e as demissões infernizarão a vida das famílias. A travessia até 2017 exigirá paciência e sangue-frio. Se o time de Temer não recorrer a estripulias, será possível botar a cabeça para fora do atoleiro e respirar.
“A percepção é de que a parte mais aguda do problema político foi superado, e que nós podemos voltar a discutir a economia”, avalia Evandro Buccini, economista-chefe da Rio Bravo Investimentos, que fará a revisão de seus números apenas no próximo mês. “O viés é de alta para 2017”. Na avaliação dele, a disposição do governo de fazer um ajuste fiscal consistente, assumindo um rombo maior nas contas públicas, de R$ 170,5 bilhões, dá ânimo novo a empresários e investidores.
Para o economista-chefe da Quantitas Asset Management, Ivo Chermont, a mudança de chave do pessimismo para otimismo, ainda que comedida, se deve, basicamente, ao anúncio da equipe econômica. “Os nomes anunciados são bons”, frisa. Ele ressalta que o pequeno crescimento do próximo ano, algo como 0,6%, será proporcionado pela melhora da confiança, em um ambiente que vai se aproveitar da uma base muito deprimida de comparação. Em 2015, o PIB tombou 3,8% e deve ter queda semelhante neste ano.
Quando empresários e consumidores acham que as coisas vão melhorar, a tendência é de que se concretize, de fato, uma mudança positiva. Buccini reconhece, porém, que há divergências consideráveis entre os colegas que já traduziram o otimismo para 2017 em números. A mudança mais radical foi a do Credit Suisse, que saiu de uma queda de 1% do PIB — seria a terceira consecutiva — para uma alta de 0,5% (veja quadro). A aposta do banco é de melhora do trânsito político do novo governo, o que permitirá a aprovação de matérias que ajudem a governabilidade.
Há, no mercado, ceticismo quanto às chances de avanço da reforma da Previdência e de outras mudanças estruturais. Mas se argumenta que seria de grande valor a aprovação de medidas mais corriqueiras, como a Desvinculação das Receitas da União (DRU), que permitiria realocar até 30% dos recursos que hoje têm destinação obrigatória. Isso facilita o corte de despesas do Orçamento sem provocar o colapso de serviços públicos.
O Banco Fibra tem a previsão mais favorável entre as já divulgadas, de alta de 2,1% para o PIB em 2017, tendo saído de um incremento de 1%, que já estava acima da média do mercado. O boletim Focus, do Banco Central, prevê alta média de 0,5%. Na visão do economista-chefe do Fibra, Cristiano Oliveira, indicadores da indústria, comércio e serviços sugerem que os empresários acham que “o pior já passou”, e se preparam para a retomada.
O Morgan Stanley elevou de 0,6% para 1,1% a projeção de crescimento no ano que vem. Para a instituição, em 2016, em vez de o PIB recuar 4,3%, cairá, agora, 3,8%, ficando em linha como a maior parte do mercado. A taxa básica de juros (Selic), por sua vez, baixará de 14,25% para 13,25% até o fim deste ano, com a “maior das políticas econômicas para os próximos trimestres”, na análise do economista-chefe da instituição Arthur Carvalho.
Limitações
Para Buccini, a volatilidade nas estimativas se deve à diferença de peso que cada analista atribui ao endividamento das empresas e das pessoas. Ele acha que isso não é tão alto quanto alguns imaginam, pelo histórico de alavancagem da maior parte das companhias. O economista admite, contudo, que é difícil ter uma noção nítida disso a partir dos dados disponíveis, limitados a empresas com ações negociadas em bolsa. Analistas de grandes bancos podem ter uma visão um pouco mais clara, a partir dos dados das carteiras de créditos das próprias instituições.
Do Bradesco, segundo maior banco privado, veio uma revisão para cima do número de 2017. Subiu pouco: apenas 0,2 ponto. Saiu de 1,3% de alta — uma das mais generosas entre as previsões anteriores — para 1,5%. O economista-chefe da instituição, Octavio de Barros, atesta que a pesquisa mensal que a equipe realiza com 4 mil empresas demonstra que os pedidos em carteira pararam de se reduzir e que os estoques começam a se contrair, o que indica a necessidade de produzir mais.
Cautela
André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, vê uma grande distância entre a melhora da situação das empresas e a retomada dos investimentos produtivos, vitais para o salto do PIB. “A capacidade ociosa ainda é muito grande. A indústria ainda vai religar máquinas primeiro antes de ampliarem fábricas”, avisa. Na avaliação de Buccini, há um lado positivo nessa sobra de equipamentos, prédios e linhas de montagem: tudo já está lá, pronto para elevar a produção. Quando os empresários identificarem o momento de fazer isso, poderão, rapidamente, intensificar a atividade. As empresas vão lucrar mais e contratar trabalhadores para atender a novos pedidos, colocando a economia para funcionar em outro ritmo.
Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, destaca que o ambiente é de grande cautela. “As pessoas e as empresas estão muito machucadas. Há endividamento, há situações de recuperação judicial. Mas, pelo menos, não há mais uma situação em que o comando do governo não se convence da gravidade da crise”, nota. Ela acha que os maiores riscos estão na situação fiscal. Neste ano, o deficit previsto pela equipe econômica cresceu 76,5%. Passou de R$ 96,6 bilhões para R$ 170,5 bilhões. Em relação a 2017, a situação real é uma incógnita, diante das frustrações de receitas e de esqueletos que saem do armário a cada dia na área das despesas. “Essas surpresas podem tornar a situação pior do que se espera em 2017, o que adiará a queda de juros e a recuperação”, vaticina.
Para José Márcio, economista-chefe da Opus Investimentos e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), o governo precisa cortar gastos com a Previdência, o que depende de reformas estruturais, como a Previdência, e reajustar salários de funcionários públicos abaixo da inflação. Ele lembra que esses dois itens são responsáveis por 70% das despesas não financeiras da União. “Se Temer acha que vai conseguir fazer alguma coisa sem aprovar medidas impopulares, está enganado”, diz. Buccini, da Rio Bravo, esperava maior força política do governo na semana passada. Frustrou-se quando o Planalto se viu obrigado a escolher André Moura (PSC-SE) líder do governo na Câmara. “Mas talvez fosse utópico esperar que o PMDB tivesse força para resolver tudo”, pondera.
Capacidade de produção
Embora o ceticismo quanto à retomada da demanda ainda prevaleça nas fábricas, há tênues sinais alentadores. Sondagem realizada pela Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) demonstra que 71% das empresas do setor suspenderam investimentos em aumento da capacidade produtiva até abril. Mas 7% ainda pretendem investir até dezembro. E 43% planejam ampliar a capacidade produtiva a partir de 2017. Outras 33%, de 2018 em diante. Ainda restam 17% que não têm intenção de investir nos próximos anos, as mais preocupantes.
Fonte de alívio (em %)
Bancos revisam para cima as projeções de crescimento para o PIB de 2017
Instituições Antes Agora
Bradesco 1,3 1,5
Banco Fibra 1,0 2,1
Credit Suisse -1,0 0,5
Bank of America 0,8 1,5
Morgan Stanley 0,6 1,1
Fontes: bancos
Brasília, 15h28min