Com o PT afastado das negociações políticas e o PMDB dando fortes sinais de comprometimento com o ajuste fiscal de Joaquim Levy, os investidores recomeçaram a lua de mel com o governo. Como bem definiu ontem um banqueiro, a presidente Dilma Rousseff terceirizou a administração. Sabe que não tem mais chance para errar. A única coisa que pode azedar o humor dos investidores agora é a Petrobras não divulgar, até o fim do mês, os balanços auditados do terceiro trimestre e do ano de 2014.
As apostas são de que, com a estatal cumprindo a promessa de dar transparência a seus números, incluindo nos resultados o impacto da corrupção, e com aval de empresas de auditoria, o dólar, que caiu 2,5% ontem, para R$ 3,056, pode ceder até R$ 2,70 no quadro mais positivo. Primeiro, porque há dinheiro de sobra circulando pelo mundo em busca de boas oportunidades de investimentos, como a maior taxa de juros do planeta paga pelo Tesouro Nacional. Segundo, porque ainda não se sabe quando, efetivamente, os Estados Unidos elevarão o custo do dinheiro.
Até mesmo do lado inflacionário o governo deverá receber ajuda. O índice de março, de 1,32%, o maior para o mês em 20 anos, foi o pico de 2015. A tendência, destaca o economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros, é de que a carestia caia para 0,6% em abril. Em 12 meses, porém, se manterá em 8%. O importante é que o custo de vida ficará menos pesado, inclusive reduzindo a pressão para o aumento da taxa básica (Selic). O governo acredita que, daqui por diante, é possível que se consolide no mercado a percepção de que o Banco Central dará somente mais uma alta nos juros no fim deste mês, de 0,25 ponto percentual, encerrando o ciclo de aperto com a Selic a 13% ao ano.
Para técnicos da equipe econômica, os investidores estão sendo pragmáticos. É melhor que o azedume do mercado se dissipe, de forma que possam voltar a ganhar dinheiro. Com Levy aprovando o ajuste fiscal, mesmo abrindo mão de algumas coisas para apaziguar os ânimos na base petista e entre os trabalhadores, e o vice-presidente da República, Michel Temer, controlando os dois maiores algozes de Dilma, os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, a tendência é de que a bolsa de valores suba com mais força, os juros futuros caiam e o dólar se estabilize um pouco abaixo de R$ 3 até que os EUA decidam mexer na sua política monetária.
Ninguém descarta que a presidente, especializada em trapalhadas, possa criar ruídos. Nem que a Petrobras desaponte mais uma vez. Mas, depois de tanto pessimismo, a poeira começa a dar sinais de que baixará. Ontem, o Credit Default Swaps (CDS) do Brasil, uma espécie de seguro contra calote, encerrou as negociações a 235 pontos. Trata-se de um tombo significativo ante o observado em 19 de março, quando se registrou 310 pontos, o pico do mau humor em relação ao país.
Esse clima menos adverso é fundamental para que o Brasil possa reconstruir as pontes para sair do atoleiro no qual está mergulhado. Foi Dilma quem empurrou a economia para o pântano. Ela sabe que o custo para resgatá-la será pesado, sobretudo por causa do aumento do desemprego. Portanto, quanto menos confusão o governo causar agora, melhor. Todos agradecem.
Dólar e desemprego
Ainda que a cotação menor do dólar funcione, neste momento, para segurar a inflação, o Ministério do Desenvolvimento torce para que a moeda norte-americana fique entre R$ 3,20 e R$ 3,30, para estimular a retomada das exportações. “Sabemos que, do ponto de vista inflacionário, um dólar mais baixo é bom. Mas precisamos recuperar, urgentemente, a competitividade do país. A indústria precisa voltar a crescer exportando”, frisa um auxiliar do ministro Armando Monteiro. Ele diz que o real mais valorizado significa mais desemprego, uma taxa próxima de 10%. Já o real mais fraco pode segurar a taxa de desocupação em torno de 7%. “O governo não pode se esquecer disso”, enfatiza.
Pressão sobre Levy
» A indústria têxtil lançará, no próximo dia 14, uma frente parlamentar para pressionar o governo a reduzir a carga de impostos que incide sobre o setor. Não será tarefa fácil diante da gula do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, por receitas para reforçar o caixa e entregar a meta de superavit primário de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB).
Perdas de 40%
» Pelas contas da Associação Brasília da Indústria Têxtil (Abit), o setor de vestuário entrega 18% de tudo o que fatura ao governo, cerca de R$ 7,1 bilhões por ano. A meta é de que o total de tributos caia para 5%. A entidade reconhece que, num primeiro momento, a arrecadação de impostos sobre o setor poderá cair até 40%, mas, ao longo do tempo, o aumento da produção voltará a engordar o caixa do Tesouro Nacional.
Produção desaba
» Nos dois primeiros meses do ano, a produção de vestuário desabou 17,1% em relação ao mesmo período de 2014. O setor têxtil como um todo encolheu, na mesma base de comparação, 7,1%. Somente no ano passado, as empresas de confecções fecharam 20 mil postos de trabalho. Em 2015, estão previstas mais 6 mil demissões.
Como cego em tiroteio
» A assessoria de imprensa de Joaquim Levy está mais perdida do que cego em tiroteio. Ninguém consegue controlar a agenda do ministro. Os auxiliares dele só descobrem onde ele está depois que os jornalistas informam à Fazenda.
Brasília, 00h10min