» ROSANA HESSEL E CÉLIA PERRONE
Enquanto pede que todo o governo se engaje no ajuste fiscal, cortando gastos “na carne”, como costuma dizer, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, não faz o mesmo no edifício em que despacha diariamente. Levy não tem conseguido colocar sua famosa tesoura em ação nas reformas, herdadas do antecessor Guido Mantega, no prédio P da Esplanada dos Ministérios.
No andar térreo, ao lado do comitê de imprensa, um banheiro, que havia sido totalmente remodelado em 2012, está novamente em reforma há sete meses. Iniciada em setembro de 2014, a nova empreitada ainda não foi concluída. A obra faz parte de um conjunto de serviços contratados pela Fazenda de setembro a dezembro do ano passado para reformar pelo menos cinco banheiros. Até agora, esse pacote custou pouco mais de R$ 500 mil, de acordo com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi).
Nesse montante estão incluídos R$ 72 mil gastos com louças e metais para os sanitários do 10º andar do Edifício Alvorada, onde fica a sede do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), epicentro das investigações da Operação Zelotes, que desvendou um esquema de corrupção que pode ter dado um prejuízo de mais de R$ 19 bilhões aos cofres da União.
O gasto de meio milhão de reais apenas com reformas de banheiros na Fazenda chama a atenção de especialistas em administração pública. “Estamos diante de um valor significativo. E, se houve uma reforma anterior, isso precisa ser explicado, porque mostra que o primeiro serviço ou foi malfeito ou temos, agora, uma obra desnecessária. Esses casos merecem mais transparência”, analisa o professor da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira. Ele lembra que a então primeira-dama Rosane Collor gastou valor semelhante para remodelar um banheiro da Legião Brasileira de Assistência (LBA), quando presidiu a entidade, no início dos anos 1990.
A obra anterior nos sanitários do térreo do Ministério da Fazenda demorou quase um ano para ficar pronta e foi realizada pela Delta, que já foi a maior empreiteira de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Mesmo após a conclusão dos trabalhos, eram constantes problemas como vazamentos e trepidação nas torneiras.
Procurada, a Fazenda não detalhou os custos das reformas nem comentou o fato de duas obras acontecerem em tão pequeno intervalo de tempo. Em nota, informou que a demora da atual reforma “é decorrente da própria natureza dos serviços de engenharia”. E acrescentou que os trabalhos atuais “não têm natureza provisória”.
Transparência
De acordo com ministério, “os banheiros estão sendo reformados para atender à demanda de servidores que recentemente passaram a ocupar os espaços da área administrativa”. Antes, parte da ala abrigava as instalações provisórias da agência do Banco do Brasil. A instituição chegou a colocar um elevador até o mezanino, que agora fica parado porque, “no momento, não existe um contrato de manutenção”. Para ampliar a minúscula copa do térreo, ao lado dos banheiros que estão sendo reformados, o piso de mármore branco, da época da inauguração de Brasília, foi substituído por placas de granito, uma pedra menos nobre.
O professor Matias-Pereira, da UnB, destacou que o Ministério da Fazenda não é o único caso de obras problemáticas no país. “Reformas são sempre um problema. Elas acabam ficando mais caras do que a construção de algo novo”, lamentou. “Quando são feitas em órgãos públicos, é preciso ter cuidado redobrado. Nessa área, é necessário que os contratos tenham bastante transparência. Podemos estar diante de uma situação de desperdício de dinheiro do contribuinte”, emendou.
Brasília, 22h08min