ROSANA HESSEL
Apesar do discurso do ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmar que o Brasil será uma “fronteira de investimentos” em infraestrutura, atraindo investidores estrangeiros com as concessões em curso, a expectativa para esse setor neste ano não é muito animadora, conforme dados levantados pela consultoria InterB.
A consultoria especializada em infraestrutura prevê recuo dos investimentos no setor em 2022 em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), passando de 1,73%, em 2021, para 1,71% do PIB, neste ano, conforme os dados da 21ª edição da Carta de Infraestrutura da InterB. O documento aponta ainda uma necessidade de que esses investimentos sejam de, pelo menos, 3,64% do PIB, durante duas décadas para evitar a depreciação da atual infraestrutura e ajudar no crescimento do país — que não consegue crescer acima de 1% neste ano e no próximo, pela maioria das projeções do mercado.
“Este seria o mínimo necessário para ensejar um processo de modernização ao longo das próximas duas décadas, e na suposição de um potencial de crescimento não inflacionário na média de 1% para os próximos 20 anos. Com um potencial alargado por reformas que impulsionassem o PIB potencial para, ao menos, 2%, as necessidades de investimento chegariam a 4,2% do PIB. Em ambos os casos ainda estamos distantes”, destacou Claudio Frischtak, sócio fundador da InterB.
Pelas estimativas do analista, existe uma brecha de R$ 200 bilhões de investimentos privados que poderiam ser realizados em infraestrutura no país, se houvesse maior confiança do investidor no país, mas ela diminuiu devido aos retrocessos, principalmente, na área ambiental. “Existe uma brecha enorme e esse é o volume que deveríamos investir, mas não estamos investindo para começo de conversa. E, para mudar esse quadro, o governo precisará parar de dar tiro no pé”, alertou Frischtak, citando os desmatamentos recordes da Amazônia e as recentes polêmicas em relação às questões indígenas. ” Parece que as autoridades não estão entendendo o que está acontecendo no mundo”, acrescentou.
De acordo com o levantamento, os investimentos em infraestrutura em 2021 somaram R$ 149,7 bilhões, dos quais a maior parte, R$ 53,3 bilhões ocorreram no setor de energia elétrica. E, para este ano, a estimativa da consultoria para os investimentos é de R$ 151,2 bilhões, mas, como o PIB nominal deverá ser maior do que o do ano passado, a estimativa em relação ao PIB tende a cair. “Essa estimativa ainda não foi atualizada e, como o PIB nominal deverá ser maior devido à inflação que vem aumentando, esse percentual de 1,71% deverá ser menor”, alertou Frischtak.
“Não investimentos necessariamente bem. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) foi um programa mal concebido e pior executado, gerando enorme desperdício de recursos. Continuamos errando com projetos sem avaliação de custo-benefício, muitos de natureza paroquial e clientelista, com taxas sociais de retorno negativas ou questionáveis”, pontuou o relatório.
Conforme dados da consultoria, para atingir o mínimo necessário para ajudar no crescimento do país e evitar deterioração da atual infraestrutura, os investimentos públicos nesse segmento situam-se próximos a 0,6% do PIB — abaixo da média das últimas duas décadas — , e seria necessário ampliá-los para pouco acima de 1% do PIB, enquanto o salto do setor privado, de 1,14% do PIB nos últimos anos, deveria seria da ordem de ao menos 1,5% do PIB, e tendo possivelmente que se aproximar de 2% do PIB, chegando a 3,1% do PIB. “Vale enfatizar que ampliar os investimentos públicos irá demandar com toda a probabilidade uma reforma do Estado, criando espaço fiscal de forma responsável e rechaçando tentações populistas”, alertou o especialista.
De acordo com o levantamento, na última década, a participação do setor público no estoque de investimentos em infraestrutura passaram de 57,3%, em 2010, para o piso histórico de 30,9%, em 2020. No ano passado, houve crescimento desse percentual, para 34,1%, mas o dado deve recuar para 33,6%, neste ano, pelas projeções da InterB.
Segundo Frischtak, não há como avançar sem perseguir uma agenda centrada em dois grandes temas: melhoria da governança dos investimentos públicos e da institucionalidade do ambiente de negócios no país. “Patrimonialismo com a coisa pública e clientelismo orçamentário, assim como decisões do executivo com frágil base técnica, geram desperdício e má alocação de recursos públicos; o país já está maduro e informado para não aceitar formas atrasadas de fazer política pública”, destacou. “Ao mesmo tempo, o ambiente de negócios necessita não apenas de maior segurança jurídica e previsibilidade regulatória, mas aderência a regras universais, passando pela reconstrução reputacional do país, no contexto de uma economia aberta, competitiva e sustentável”, acrescentou.
“Investimento público requer uma nova governança, com melhor planejamento, e menos arbítrio. O planejamento de governo ainda é sujeito a forte influência política de grupos de interesse. O investimento privado, por sua vez, requer maior segurança jurídica, com transparência, estabilidade e obediência às regras. Essencial prover clareza nos conflitos de instâncias e competências, no âmbito interfederativo e na esfera dos órgãos de controle”, ressaltou o documento.
De acordo com a carta, a maioria dos investimentos privados é explicada pelas privatizações, mas o espaço de participação privada é limitado “por força dos elevados retornos sociais dos investimentos, que justificariam um continuo envolvimento — direto ou indireto — do setor público, a exemplo de mobilidade urbana ou saneamento básico em áreas rurais”.