Ilan defende ajuste fiscal e reforma da Previdência

Publicado em Sem categoria

POR PAULO SILVA PINTO

 

O economista Ilan Goldfajn, escolha anunciada ontem pelo governo para a presidência do Banco Central (BC), defende um ajuste fiscal profundo no país e acredita na possibilidade de redução dos juros a partir do próximo semestre. As avaliações foram feitas por ele em recente entrevista ao Correio, ainda na condição de economista-chefe e sócio do Itaú Unibanco.
Para analistas de mercado, porém, não se deve imaginar, por conta dessas opiniões, que Ilan venha a ter uma atitude leniente com a inflação, algo de que é acusado o atual presidente do BC, Alexandre Tombini. Eles chamam atenção para o fato de que análises conjunturais envolvem percepção diferente da exigida no manejo da política monetária.
Ilan é um economista de perfil ortodoxo. Nascido em Haifa, Israel, há 50 anos, formou-se em economia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Fez mestrado na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), um dos principais centros do conservadorismo econômico no país. Tornou-se doutor pelo Instituto de Tecnlogia de Massachusetts (MIT). Entre 1996 e 1999, atuou no Fundo Monetário Internacional (FMI).
No ano seguinte, tornou-se diretor de Política Econômica do BC, na gestão de Arminio Fraga. Ficou lá até meados de 2003, convivendo por seis meses com Henrique Meirelles, que agora o escolheu. Ao comentar os desafios fiscais, Ilan propôs que as contas do governo saiam do deficit de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para um superavit de 2,5%. O processo deve levar no mínimo dois anos, mas precisa começar já, alertou.
Ele também é favorável a uma reforma consistente no sistema de aposentadorias, mesmo que os efeitos só sejam sentidos a longo prazo. A melhora da confiança, argumenta, seria imediata.

 

CONHEÇA O PENSAMENTO DO FUTURO PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL

 

Política econômica
Há dificuldades políticas e fiscais. As medidas que precisam ser tomadas não são populares. Há uma grande incerteza.

Câmbio
Nos últimos tempos, temos tido uma expectativa maior de alguma mudança. Por isso o real se apreciou.

Ajuste
Pode haver frustração, porque as dificuldades não são pequenas. Há possibilidade de reduzir o deficit primário, mas não há condições de mudar tudo de um ano para o outro, devido à queda da arrecadação, às despesas obrigatórias que sobem. É possível ir melhorando devagarzinho.

Meta
Precisamos chegar a um superavit primário de 2% a 2,5% do PIB (Produto Interno Bruto). Hoje temos um deficit de cerca de 1,5%. Então, estamos falando de um ajuste de 4% do PIB. O mais rapidamente que pudermos chegar lá será melhor. Pode-se esperar isso em dois ou três anos.

Efeito recessivo do ajuste
Isso é culpar o médico pela doença, que vem lá de trás e ninguém faz nada. O paciente chega muito debilitado e o médico consegue fazer com que ele reaja. Mas acabam culpando o profissional por ele não ter feito a pessoa sair saltitando. A gente tem de culpar é a falta de prevenção anterior. Em 2015, tivemos um problema bem sério. O ajuste no ano passado foi imperfeito, porque faltou apoio político, força para tomar as medidas necessárias. Não vai ser fácil andar para frente.

Despesa ou receita
O lado da despesa é o que precisa ser trabalhado com maior cuidado. Você não consegue fazer tudo de uma vez. Uma reforma da Previdência mexe com o lado da despesa, ainda que tenha impacto só daqui a 20 ou 30 anos. É possível que precise de uma medida de curtíssimo prazo pelo lado da receita para ajudar, na transição, a levar esse deficit de 1,5% a um superavit de 2,5%. É muito difícil conseguir apoio para isso, porque a sociedade está um pouco cansada de pagar para resolver o buraco do governo.

Novo governo
Tem mais chance de conseguir (aprovar reformas), mas não acho que é fácil.

CPMF
Nenhum imposto é razoável, mas talvez seja necessário.

Reforma da Previdência
Teria impacto imediato na confiança (ainda que os efeitos nas contas públicas venham só a longo prazo), porque a dúvida é a trajetória ao longo do tempo. Se você tem medidas que fazem a trajetória ser boa no futuro, elas têm impacto no presente. Às vezes não precisa fazer os cortes no dia, ou na hora, precisa é indicar uma trajetória favorável. Isso aumenta a confiança, faz as pessoas investirem, o PIB (Produto Interno Bruto) volta a crescer e você já tem uma trajetória melhor.

Volta dos investimentos
A chave da mudança é a capacidade de aprovar ajustes. Qualquer governo, a qualquer momento, se mostrar que há capacidade de fazer ajuste, de criar consenso, faz a diferença. Há outras reformas além da previdenciária: criação de teto para despesas, tributária, política. E, fazendo isso, os investimentos vêm rápido. A mudança de confiança é muito rápida. Não significa que os problemas não vão mais existir.

Hesitação
Estamos há 13 trimestres com queda de investimentos. Existe hoje a posição de muita gente de parar e esperar o melhor momento. À medida que houver um alívio, que ficar menos incerto, isso pode destravar rapidamente. Há um estoque reprimido de investimentos que está a espera de uma solução. (Se não houver mudança, capacidade de mudança), aí fica na paralisia mais tempo. Este é o perigo: não ter crescimento, não ter receita, não produzir, não empregar, não ter crescimento e então termos um círculo vicioso.

PIB
Acho que teremos dois anos de queda e o próximo mais ou menos zerado.

Inflação
A inflação está caindo nos cenários mais prováveis. É claro que, nos cenários extremos, se tiver o dólar disparando de novo, isso não acontece. Se houver uma crise, falta de confiança, isso pode acontecer. Também em caso de paralisia: se você não faz nada, fica sujeito a esses acidentes.

Juros
Se a inflação continuar caindo, no segundo semestre o Banco Central vai baixar a Selic. No primeiro semestre, continuará conservador. A inflação já foi 11% no ano passado. Se ela for na direção que a gente está esperando, que é perto de 7%, vai ser uma tentação enorme baixar os juros num país que está em recessão. Voltar ao centro da meta vai demorar um pouquinho mais.

Manutenção da Selic em janeiro
Foi correta, mas não foi bem comunicada. Deu impressão de uma decisão de última hora, mal explicada.

Queda da Selic em 2011
Foi um pouco precipitada.

Origem dos erros
No segundo governo Lula, já se começa a ter distorções, intervenções. A coisa foi aumentando e culminou nos últimos anos, no governo Dilma.

Conjuntura internacional
Está colaborando agora, pois há expansão monetária, com juros baixos no mundo. Isso traz certo alívio, com fluxo de capital para países emergentes, inclusive o Brasil. Esse é o cenário favorável hoje. À medida que a economia global vai melhorando, você sai dessa situação de emergência, os juros vão subindo, você tem menos estímulo para o Brasil. Isso favorece aqui um dólar mais fraco, juro mais baixo. É claro que, com a economia melhorando, eventualmente crescimento vai melhorar e a demanda também.

Fed
Acho que haverá um aumento mínimo (da taxa básica de juros dos Estados Unidos) neste ano, de 0,25 mais 0,25 ponto, totalizando meio ponto. É um aumento mínimo, mas seguro. Isso já está precificado. O que não está precificado é a possibilidade de três ou quatro aumentos.

Bonança do passado
Nas economias emergentes, não só no Brasil, tende-se a achar que o boom é permanente e que a queda é temporária, quando na verdade o ideal é pensar o contrário: que os períodos de vacas gordas não vão ser para sempre e que as quedas, quando vêm, exigem ajuste. Os resultados ruins geram um questionamento, uma vontade de mudar. Mas é essencial ter um diagnóstico do que deu errado. O equívoco, por exemplo, é achar que o problema foi o ajuste do ano passado, a tentativa de consertar. Com isso você não melhora, porque você nunca faz o ajuste.

Consenso
Há um certo consenso sobre as medidas que se precisa fazer: a reforma tributária, a da Previdência. Não acho que haja um grande debate sobre a economia. O que precisa é de um consenso político para fazer. (É um ganho limitado), porque, por enquanto, está só no campo das ideias. Todo mundo concorda, até a hora de implementar em que você vai ver os detalhes. Todo mundo é a favor do ajuste fiscal, desde que seja no outro. Os consensos existem de fato quando você vê os detalhes.

Desvinculação de receitas
Será preciso mudar as leis, rediscutir se o Estado tem a capacidade de fazer tudo o que promete. O ideal é fazer escolhas: o que a gente acha que será o melhor uso dos recursos do Estado. Isso envolve rediscussão de benefícios, gastos, e adequação à receita que existe. Se a sociedade tem hoje ojeriza a aumentar imposto, então tem de ter ojeriza ao excesso de gastos.

Bancos na crise
O sistema bancário veio bem preparado para essa desaceleração. Reduziu o risco, tem liquidez. Então não acho que isso seja uma fonte de preocupação.

 

Brasília, 15h33min