ROSANA HESSEL
Em meio ao avanço recorde do endividamento das famílias com a escalada dos juros e a volta da inflação mensal, o crescimento das vendas do comércio varejista perde fôlego, desacelerando de 1,2%, em setembro, para 0,4%, em outubro, na série com ajuste sazonal, conforme dados divulgados, nesta quinta-feira (8/12), pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O dado ficou levemente acima da mediana das estimativas do mercado, entre 0,2% e 0,3%. Na comparação com outubro de 2021, houve crescimento de 2,7%, o terceiro resultado positivo consecutivo, de acordo com os dados da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC) do órgão ligado ao Ministério da Economia. No ano, o setor registrou variação 1%, e, no acumulado de 12 meses encerrados em outubro, variou 0,1% — primeiro resultado no campo positivo em cinco meses.
No comércio varejista ampliado, incluindo as atividades de veículos, motos, partes e peças e de material de construção, o volume de vendas em outubro cresceu 0,5%, frente a setembro, e 0,3%, em relação ao mesmo mês de 2021. Conforme os dados do IBGE, a média móvel trimestral foi de 0,7% no trimestre encerrado em outubro.
Em outubro de 2022, na série com ajuste sazonal, cinco das 10 atividades pesquisadas no varejo ampliado estavam no campo positivo: móveis e eletrodomésticos, com alta de 2,5%; equipamentos e material para escritório, informática e comunicação (2,0%); outros artigos de uso pessoal e doméstico (2,0%); combustíveis e lubrificantes (0,4%); e hiper, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (0,2%). Na contramão, registraram quedas os grupos de artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos e de perfumaria (-0,4%), tecidos, vestuário e calçados (-3,4%), livros, jornais, revistas e papelaria (-3,8%), veículos, motos, partes e peças (-1,7%) e material de construção (-3,5%).
No mês de outubro, as vendas do varejo ampliado ainda estão 0,9% abaixo do patamar pré-pandemia, de fevereiro de 2020. Já o varejo restrito ficou 3,4% acima do nível pré-covid19.
Perda de fôlego
Pelas estimativas da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), que alerta para a perda de fôlego do setor, é provável queda do setor nos últimos meses do ano. Um dos motivos, além da perda de fôlego da atividade econômica em curso e da volta da inflação em outubro, de acordo com Fábio Bentes, economista sênior da CNC, é que a segunda parcela do 13º salário não deve ser convertida em consumo de bens e serviços. “Este será o quarto ano seguido que o brasileiro deverá priorizar o pagamento de dívidas devido ao comprometimento recorde no comprometimento de renda”, destacou.
Em outubro, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) interrompeu três meses de deflação e subiu 0,59%, acima das estimativas do mercado. Enquanto o mercado vem elevando a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano há três semanas, — a mediana das estimativas do boletim Focus, do Banco Central, está em 2,81% –, a CNC reduziu de 1,3% para 1,1% a previsão de expansão do comércio no PIB de 2022.
De acordo com levantamento da CNC, o endividamento dos brasileiros bateu novo recorde e está bem perto de 80%. Bentes lembrou que os juros médios no varejo continuam subindo, passando de 53% para 56% ao ano, apesar de a taxa básica da economia (Selic) continuar em 13,75% ao ano desde agosto. Vale lembrar que, na quarta-feira (7), após decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) em manter a Selic pela terceira reunião seguida, o Banco Central deixou a porta aberta para nova alta se houver piora nas expectativas de inflação e do quadro fiscal. “O primeiro semestre pode ter queda nas vendas. O crescimento, no segundo semestre, vai depender da queda dos juros e de medidas de estímulo do novo governo”, acrescentou Bentes.
Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, a manutenção do padrão de vendas no varejo ainda é afetada pelas medidas expansionistas do governo federal. “Seu efeito sobre o endividamento das famílias é evidente, assim como a perda de ímpeto do mercado de trabalho”, destacou. Ele ainda alertou que as expectativas do consumidor e do comércio “devem fechar o ano no vermelho”.