Guedes: Qual é o problema agora se a energia vai ficar um pouco mais cara?

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ROSANA HESSEL

Após o pessimismo tomar conta do mercado financeiro nos últimos dias e as previsões de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2022 serem revisadas para baixo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, resolveu colocar o bloco do otimismo na rua, e, mais uma vez, afirmou que o país “está surpreendendo” o mundo e que a economia “está se recuperando em V”, o que não é um consenso entre especialistas. Além disso, minimizou a crise hídrica que está ajudando a pressionar a inflação, fazendo o Banco Central sinalizar aumento na taxa de juros básica (Selic), atualmente em 5,25%, acima do patamar neutro, em torno de 6,5% a 7,5%, o que significaria um freio para a retomada.

“Qual é o problema agora se a energia vai ficar um pouco mais cara?”, questionou Guedes, nesta quarta-feira (25/08), durante evento na Câmara dos Deputados de lançamento da Frente Parlamentar do Empreendedorismo, ao lado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e do presidente da Frente, deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP). Segundo o ministro, é preciso “tapar os ouvidos” para a gritaria por conta da antecipação das eleições, porque os fundamentos fiscais “nunca estiveram tão tranquilos”.

“A democracia é barulhenta. Tapem os ouvidos, porque nós vamos chegar do lado de lá. A economia já está saindo (da crise da pandemia)”, disse ele, voltando a chamar de “negacionistas” os economistas que não enxergam a retomada em V que ele diz estar ocorrendo tanto na atividade quanto na arrecadação, cujos dados da Receita Federal de julho apontaram um recorde histórico.  “A economia está bombando e continua a narrativa de que o governo não está fazendo nada. Os negacionistas negam a força da economia brasileira”, reforçou ele, defendendo a reforma do Imposto de Renda e a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que parcela o pagamento por 10 anos dos precatórios — dívidas judiciais da União. Segundo o chefe da equipe econômica, o governo está conversando com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) para encontrar uma solução para essas dívidas judiciais por meio de uma modulação.

Guedes ainda lamentou o fato de ter que abandonar a ideia do imposto sobre transações financeiras, que seria uma espécie de nova CPMF para compensar a desoneração da folha, que ele tentou emplacar em 2019, mas não conseguiu. Segundo ele, a medida ajudaria a reduzir os 40 milhões de “invisíveis” que existem hoje no mercado informal, porque reduziria o custo de contratação, mas não detalhou como o novo tributo incidiria sobre os contribuintes e qual seria a arrecadação, que são os argumentos dos críticos que apontam aumento de carga tributária com a volta da CPMF.

Para Guedes, o Brasil surpreendeu no primeiro ano do governo do presidente Jair Bolsonaro, porque aprovou a reforma da Previdência; surpreendeu no ano passado, quando o PIB caiu 4,1% enquanto as economias desenvolvidas tiveram quedas maiores, e, portanto, vai surpreender neste ano e próximo também.  “Estou muito confiante de que vamos atravessar (a crise). Se, no ano passado, que era o caos, nós nos organizamos e conseguimos atravessar, porque vamos ter medo agora?”, questionou.

O ministro minimizou os riscos da crise hídrica que já está fazendo o Ministério de Minas e Energia adotar medidas de racionamento de energia, incialmente, em grandes empresas que deverão reduzir o consumo nos horários de pico, por conta da crise energética que bate à porta da população e, inclusive, pode levar o país a um quadro de recessão ou de estagflação. Hoje, inclusive, o presidente Bolsonaro assinou um decreto em que determina redução de até 20% no consumo de energia do setor público.

Vale lembrar que a escassez de chuvas vem ajudando elevar em 9,3% na prévia da inflação oficial (IPCA-15) no acumulado em 12 meses até a primeira quinzena de agosto.  A crise energética também contribui bastante para a alta de quase 33% no Índice Geral de Preços (IGP) em 12 meses até agosto. Para analistas, o IPCA não é um bom indicador no momento para comparar o crescimento real da arrecadação federal, que de acordo com os dados da Receita Federal divulgados hoje, somaram R$ 1,053 trilhão, de janeiro a julho. Se considerarmos o IGP, que está pesando mais no bolso do brasileiro e descontar o crescimento nominal 34,70% na receita total acumulada nos primeiros sete meses do ano, a arrecadação, na verdade, não deu um salto de 26,11%, mas apenas andou de lado em relação ao mesmo período de 2020.

Superavit primário em 2022

Guedes voltou a afirmar que o governo conseguiu baixar os juros e conseguiu reduzir a relação dívida-PIB no primeiro ano de governo, principalmente, por conta das devoluções dos aportes da União nos bancos públicos. “Nós mudamos essa mistura de fiscal frouxo e juros altos”, disse.  Pelas contas do ministro, o governo conseguiu reduzir a conta de juros em R$ 200 bilhões nos primeiros dois anos de governo e ainda voltou a afirmar que, neste ano, a dívida pública bruta vai voltar ao patamar pré-pandemia e, em 2022, o governo vai conseguir zerar o deficit primário das contas públicas, após o rombo fiscal chegar em 10% do PIB em 2020 devido às medidas adotadas para minimizar os efeitos contra a pandemia da covid-19.

“Neste ano, o deficit primário volta para 1,7% do PIB e, da mesma forma, a dívida pública que diziam que iria para 100% do PIB, ficou em 88% do PIB, em 2020, e, neste ano, pode voltar para onde estava quando a covid-19 nos pegou. É possível que a gente tenha superavit no ano que vem”, afirmou. “O país lidou muito bem com a crise. E os empresários fizeram a sua parte, mantendo as linhas vitais da economia preservadas”, acrescentou Guedes, elogiando a iniciativa de criação da Frente.  Ele também comemorou o registro do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) de que há R$ 544 bilhões de investimentos comprometidos para os próximos 10 anos com concessões e privatizações federais e de entes federativos.

Contudo, Guedes evitou comentar que, desde março, a Selic passou de 2% ao ano para 5,25%, e, pelas projeções do mercado, encerrará o ano entre 7,5% e 8%, o que significaria uma alta de 6,0 pontos percentuais nos juros básicos porque a inflação não dá trégua. Conforme dados do Banco Central, cada 1% a mais na Selic implica em R$ 30,8 bilhões na dívida pública bruta em um ano. Com isso, se a Selic encerrar 2021 em 8%, o custo da dívida bruta vai crescer R$ 184,8 bilhões, volume que praticamente anula a tal economia que Guedes disse que conseguiu proporcionar na dívida em dois anos.

“Tem negacionista em relação à nossa recuperação econômica. Tem gente dizendo coisas que não são verdadeiras. Mas a mídia é maior do que isso e tem que entender e ajudar”, afirmou. Guedes reconheceu, no entanto, que há excessos no governo, no parlamento e no Judiciário que ajudam nesses ruídos. “Todo mundo trisca nas quatro linhas. Mas o importante é que as instituições estão se aperfeiçoando”, disse.

Respeito

O ministro defendeu o respeito entre os Poderes como regra básica para diminuir o barulho. Ele disse que acredita no “funcionamento virtuoso da democracia”. “Acredito que as instituições vão funcionar corretamente. E essa Frente Parlamentar é um passo nessa direção”, afirmou.

Guedes ainda voltou a afirmar que é preciso respeitar um presidente com 60 milhões de votos, e, em seguida, disse que é preciso que todos se respeitem, sem excessos, para preservar a democracia e evitar “brigas de rua”. “Sou testemunha de um governo que trabalha, de manhã, de tarde e de noite. Um governo como esse tem que ser respeitado”, frisou.

Vicente Nunes