RODOLFO COSTA
A orientação ao Supremo Tribunal Federal (STF) da agora ex-procuradora-geral da República, Raquel Dodge, para a derrubada dos decretos que regulamentam a compra e posse de armas de fogo e munições, pegou mal no Palácio do Planalto. O governo, no entanto, só agirá depois que a relatora da ação na Suprema Corte, ministra Rosa Weber, se manifestar. Não há, contudo, data prevista para o julgamento do caso. Por ora, a orientação é ignorar a decisão de Dodge e acelerar as articulações para a sabatina e aprovação do subprocurador-geral Augusto Aras, indicado para ocupar a Procuradoria-Geral da República (PGR). Afinal, a expectativa no Palácio do Planalto é de que ele ocupe o posto o quanto antes para evitar tomadas de decisões classificadas pela cúpula governista e pessoas próximas do presidente como ideológicas.
O Planalto orientou que a interlocução capitaneada pelo líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), avance o quanto antes o processo da indicação de Aras. Desde que a formalização do nome, os diálogos avançam a passos largos, com apoio do próprio subprocurador, que vem visitando os gabinetes de senadores. O fruto dessa força-tarefa é a confirmação nesta quarta-feira (18/9) do agendamento da sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado para a próxima quarta-feira, 25. O Planalto entende que Aras não vai interferir na decisão de Dodge e solicitar a Weber o arquivamento das ações referentes à derrubada dos decretos.
O subprocurador deixou claro que atuará com altivez e independência no cargo, mas o perfil dele agradou Bolsonaro e vem conquistando a confiança de demais interlocutores. Embora não se posicione como um feroz defensor da agenda armamentista, Aras também não dá sinais de ser um desarmamentista. A perspectiva do Planalto e de pessoas próximas de Aras é de que ele não interfira nessa pauta.
Responsável por ter apresentado Aras a Bolsonaro e por intermediar as conversas que sacramentaram a indicação dele à PGR, o ex-deputado federal e Alberto Fraga (DEM-DF), candidato a governador pelo Distrito Federal nas últimas eleições, confirma ao Blog que o governo trata a sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado como prioridade. “Estive com o presidente (Bolsonaro) ontem (terça-feira, 17), e a ideia é primeiro vencer essa etapa (sabatina), e, depois, se debruçar em outras matérias, como a indicação do (deputado federal) Eduardo (Bolsonaro) para a embaixada dos Estados Unidos.
Perfil
A aposta de Fraga é que o subprocurador não interfira na pauta armamentista do governo caso assuma o órgão. “Ele foi escolhido exatamente por não ser um populista e alguém preso a ideologias. O que move ele é a agenda desenvolvimentista”, afirmou. Outro objetivo de Aras, como antecipou o Blog, é expandir a Lava Jato a outros estados. “Ninguém pode ser contra a Lava Jato. O Aras está ajudando na questão indígena e pensando no Brasil”, adiantou Fraga. Ele criticou, contudo, a decisão de Dodge em sugerir a derrubada dos decretos. “Adotar medidas no apagar das luzes é deselegante. Estar de saída e assinar as coisas que ela assinou é só para causar com o sucessor. Não é algo que o Aras faria”, sustentou.
A decisão de Dodge orienta que o STF revogue três decretos, ambos publicados em 25 de junho. O 9.845 e o 9.847 regulamentam a posse de armas, normatizando que, para ter uma ou mais, o interessado precisa ter mais de 25 anos, comprovar capacidade técnica e aptidão psicológica, bem como a idoneidade moral e inexistência de inquérito ou processo, além de apresentar documentos de identificação, ocupação lícita e residência.
O 9.847 estabelece, ainda, regras de porte de armas para quem já o tem até a aprovação de matéria legislativa que regulamente o tema, no caso, o Projeto de Lei 3.723/2019. O outro decreto é o 9.846, que regulamenta o registro e compra de armas por caçadores, atiradores e colecionadores (CACs). O dispositivo também possibilita que adolescentes com idade entre 14 e 18 anos façam aula de tiro com a autorização de um responsável. O local para a prática precisa ser autorizado pelo Comando do Exército, e a arma deve ser do clube de tiro ou do responsável pelo menor.
Acordo
Os três decretos foram editados para flexibilizar a posse de armas, após acordo costurado entre governo e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado (DEM-AP), Davi Alcolumbre, para evitar a derrubada de outros dois decretos. O Planalto chegou a assinar o decreto 9.844, que revogou o 9.785 e o 9.797 — alvos de críticas do Parlamento –, que, por sua vez, foi revogado pelo 9.847.
No Planalto, a avaliação é de que é pouco provável que o STF acate a orientação de Dodge e derrube os três decretos. Na edição dos instrumentos, as conversas não ficaram restritas entre o Executivo e o Legislativo. O presidente da Suprema Corte, ministro Dias Toffoli, também foi consultado. A expectativa no Planalto é de que ele abra diálogo com Weber e adote decisão contrária ao pedido da ex-procuradora-geral.