GANGUES DO PLANALTO

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O governo está convencido de que, com a reforma ministerial anunciada ontem, a presidente Dilma Rousseff ganhou uma sobrevida. Integrantes do Palácio do Planalto associaram a queda do dólar e a alta da bolsa de valores à aprovação, pelos investidores, das medidas anunciadas pela petista. Mas o que realmente pesou para o bom humor do mercado foi a divulgação do voto do ministro Augusto Nardes, do Tribunal de Contas da União (TCU), propondo a rejeição das contas do governo de 2014. Os investidores sonham com o impeachment de Dilma.

Apesar do discurso positivo no Planalto, o clima é de apreensão. Mesmo as pessoas mais próximas da presidente admitem que ela deu a última cartada ao ampliar a participação do PMDB no governo. O problema é que Dilma, no desespero, entregou seu mandato a uma ala extremamente podre do partido, um grupo – ou uma gangue, como ressaltam técnicos da equipe econômica – que não tem o menor compromisso com a ética e a fidelidade. Está mais interessado em tirar o maior proveito possível dos bilhões de reais que vai administrar.

Técnicos importantes do governo reconhecem que Dilma fez uma espécie de renúncia branca para sustentar a travessia até 2018. Mas a possibilidade de interrupção do mandato continua latente. E, pior, não se tem a garantia de que o PMDB dará os votos necessários à aprovação do ajuste fiscal que está tramitando no Congresso. Para a equipe do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o Banco Central, não importa se a presidente vendeu a alma ao diabo. O que interessa é se ela terá forças para convencer os parlamentares sobre a urgência de se arrumar as contas públicas.

“A agonia é grande”, ressalta um auxiliar de Levy. O tempo para a aprovação do ajuste fiscal está encurtando. A ressurreição da CPMF, vista, no momento, como a salvação para o caixa do governo, não está garantida com o novo ministério. Há, no entender da equipe econômica, uma barreira enorme atravancando o caminho para a aprovação do tributo. Esse empecilho tem nome e sobrenome: Eduardo Cunha. Não se sabe até que ponto ele está enfraquecido depois da descoberta de contas no nome dele na Suíça. Uma coisa é certa, Cunha vai morrer atirando e, para a artilharia, fará todo o possível para aprovar o impeachment de Dilma.

Grande teste

A próxima semana, por sinal, já será um grande teste para ver se Dilma, ao entregar o governo ao ex-presidente Lula e  ao vice-presidente da República, Michel Temer, conseguiu aglutinar as forças políticas que precisa. O TCU julgará as pedaladas fiscais, manobras que permitiram ao governo esconder a triste realidade das contas públicas. Pelo menos três ministros são ligados diretamente ao presidente do Senado, Renan Calheiros, que conseguiu manter seu feudo no governo a troco de ser um contraponto a Eduardo Cunha.

Até ontem, o placar entre os nove ministros do TCU era desfavorável à presidente. Mas Calheiros prometeu virar o jogo para evitar que a rejeição das contas chegue ao Congresso. Caso não tenha a garantia de vitória, o governo orientará o presidente do Senado a convencer um de seus protegidos a pedir vistas do processo e adiar a votação ao máximo. É questão de honra para Dilma resolver a fatura no Tribunal e não ficar dependente de apoio dos parlamentares, pois, a qualquer momento, a trégua conseguida com o novo ministério pode se romper.

Há, ainda, no curto horizonte do governo, a possibilidade de novas denúncias da Operação Lava-Jato. As investigações da Polícia Federal estão se aproximando cada vez mais do Planalto e de Lula. Se sentir que a corrupção na Petrobras pode custar o mandato de Dilma, o PMDB que hoje lhe estende a mão pode lhe dar um tapa de traição. Para um partido que tem sete ministérios, nada melhor do que a possibilidade de ter a Esplanada inteira.

Torcida aflita

Todos esses riscos estão mapeados pela equipe econômica. Entre auxiliares de Levy e do presidente do BC, Alexandre Tombini, a visão é de que, com a nova configuração do ministério, Dilma talvez sobreviva ao impeachment. Para isso, é preciso que o PMDB abra mão de sua principal característica, a ambiguidade, e realmente passe a apoiar o governo. Nesse contexto, poderia se aprovar um ajuste fiscal que não evitaria o rebaixamento do Brasil pela Moody’s e pela Fitch, mas daria aos investidores sinais de sustentação na dívida bruta, que, em agosto, chegou a 65,3% do Produto Interno Bruto (PIB) e pode fechar o ano em 70%, se a velocidade atual de crescimento for mantida.

Na avaliação dos técnicos, esse ajuste, mesmo que mínimo, mas com uma certa direção, será capaz de acalmar os investidores e derrubar os preços do dólar, um alívio sobre a inflação. A partir daí, o BC poderia ver as expectativas para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) caindo e pavimentando o caminho para o início da queda da taxa básica de juros (Selic), que está em 14,25% ao ano – o que seria um combustível e tanto para a economia. “O Brasil não tem espaço fiscal para agir, mas tem muito espaço monetário”, diz um dos integrantes da equipe econômica.

Para os técnicos, com a atividade respondendo à queda dos juros, as receitas vão melhorar e o ajuste fiscal ficará menos doloroso. Nenhum deles, porém, acredita em um “boom” econômico, mesmo que esse quadro positivo se confirme. Na verdade, o que se fará é corrigir o máximo possível de erros para que o próximo governo possa realizar as reformas que o país tanto precisa. “Não podemos só ficar pensando no fim do mundo”, afirma um integrante do Planalto. Mas ele admite que tudo, “infelizmente”, depende do PMDB, que tem os pés em dois barcos. Se o partido inviabilizar o impeachment e apoiar o ajuste fiscal, ótimo. Do contrário, com o PMDB dividido, o país não vai estourar, mas também não será consertado. E o resultado será mais recessão, inflação e desemprego.

Brasília, 00h10min