A capacidade do PT de terceirizar responsabilidades não tem limites. Sem argumentos sólidos para justificar a reprovação recorde da presidente Dilma Rousseff, que chegou a 68%, o presidente do partido, Rui Falcão, atribuiu o resultado à “má vontade” da população. Na visão dele, ainda que a economia não esteja vivendo um bom momento, não há por que apenas 9% dos eleitores considerarem o governo da petista bom ou ótimo.
Não se trata de má vontade. A avaliação de Dilma é resultado do desastre que ela, meticulosamente, provocou nos quatro primeiros anos de mandato. Já se sabia, quando a presidente tomou posse, que o custo para fazê-la sucessora de Lula foi muito alto. Contudo, em vez de corrigir os excessos, para, aos poucos, criar uma base que permitisse ao país crescer de forma sustentada, sem solavancos, Dilma tratou de aumentar a fatura.
A petista foi leniente com a inflação. Deixou que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) rodasse, sistematicamente, no teto da meta, de 6,5%, definido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Para que esse limite de tolerância não fosse superado, usou todos os artifícios possíveis. Impediu que a Petrobras reajustasse os preços dos combustíveis e obrigou as empresas de energia a reduzirem as tarifas de eletricidade sem que houvesse condições técnicas para isso.
Mesmo com a inflação dando sinais de descontrole, ordenou ao Banco Central que reduzisse a taxa básica de juros (Selic) para o menor nível da história, 7,25% ao ano. A presidente permitiu, ainda, que o Tesouro Nacional abusasse da contabilidade das contas públicas, recorrendo a pedaladas fiscais que feriram a legislação e podem lhe custar o mandato. Mesmo com os cofres do governo combalidos, deu subsídios a setores que em nada contribuíram para o crescimento do país. Em meio a todos esses desacertos, a corrupção na Petrobras corria solta.
O resultado desse descalabro administrativo está aí. O país mergulhou na mais grave recessão em pelo menos um quarto de século, a inflação está roçando os 10% e o desemprego caminha rapidamente para os dois dígitos. Boa parte das famílias que, antes do governo Dilma, conseguiram ascender socialmente, corre o risco de mergulhar novamente na pobreza. Em vez de o país reduzir as desigualdades que separa ricos e pobres, voltou a aumentá-la. Os ganhos sociais começam a se tornar miragem para muitos lares.
Não à toa, a rejeição ao governo aumentou em todas as classes sociais. Entre os eleitores, a percepção é de que o colapso do país é iminente. O pior, mostra a pesquisa CNI-Ibope, é que 78% não confiam na presidente para resolver os problemas pelos quais o Brasil está passando. Alegam que foram enganados pela mandatária que, durante a campanha à reeleição, prometeu manter todas as conquistas dos anos anteriores, sobretudo em relação ao emprego.
Overdose
Dilma mentiu tanto que ninguém acredita na presidente que emergiu das urnas em outubro passado e, da noite para o dia, passou a defender aumento de juros para combater a inflação e ajuste fiscal como forma de resgatar a confiança no país. A falta de convicção no discurso dela é tamanha que o presidente do PT tratou ontem de antecipar que o governo vai flexibilidade o ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para “estimular os investimentos”. Em vez de ajudar, Rui Falcão só criou mais ruídos.
Na avaliação do economista Júlio Sérgio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica da Fazenda, a percepção que a população tem hoje do governo é de que não há projetos para o país. Está claro que a presidente da República está fragilizada politicamente e o Palácio do Planalto só consegue apagar incêndios. “O desapontamento aumenta porque as medidas corretivas que foram anunciadas, de aumento de juros e de ajuste fiscal, estão sendo vistas como uma overdose, mesmo sendo necessárias”, afirma.
Para Almeida, o momento é terrível para o país. E se o governo não reagir, não se reinventar, não estabelecer uma agenda que realmente recoloque a economia no caminho do crescimento, o colapso será líquido e certo e a reconstrução do que perderemos, extremamente dolorosa. Ele diz que a indústria é o retrato mais cruel desse processo destrutivo. E o mesmo acontecerá com o emprego.
O Brasil conseguiu, nos últimos anos, quando prevaleciam medidas sensatas na economia, reduzir drasticamente o desemprego. Com o aumento da renda, as famílias puderam satisfazer necessidades reprimidas por décadas. Agora, estão tendo que tirar produtos do carrinho do supermercado, cancelar matrículas dos filhos em escolas particulares, suspender planos de saúde, atrasar as prestações do carro e da casa própria.
Com tanta notícia ruim, não há como a população dar um voto de confiança a Dilma. Tudo de ruim que o país vive hoje decorre de decisões erradas da presidente. Portanto, nem ela nem os petistas que a cercam podem se queixar do elevado nível de reprovação. Um dia, a casa iria cair.
Brasília, 00h01min