A presidente Dilma Rousseff decidiu vestir novamente a fantasia de candidata. Bastou a reaproximação com o ex-presidente Lula, para que ela retomasse o velho e ultrapassado discurso de que a culpa de todos os males que o Brasil está enfrentando hoje é da oposição. A petista acredita que, com isso, ganha força política para manter o mandato, ameaçado por um processo de impeachment e por uma investigação de uso irregular de recursos na campanha à reeleição. Na verdade, ao jogar palavras ao vento, ela só ajuda a afundar o país, varrido por uma onda sem precedentes de desconfiança.
Enquanto esteve distante de Lula e do PT, Dilma deu algum sinal de racionalidade. Liberou sua equipe econômica para negociar, com a oposição que ela agora critica, um pacote mínimo de ajuste fiscal, incluindo a reforma da Previdência Social, de forma a mostrar que nem tudo está perdido em relação às contas públicas. Ao partir para o discurso eleitoral, simplesmente, ela fecha todas as portas do Congresso, pois o partido dela, o PT, já avisou que não aprovará nada que afronte os manifestantes que lotaram a porta da casa de Lula para recebê-lo depois de prestar depoimento na polícia federal.
Como bem define um importante técnico da equipe econômica, se antes já estava difícil acreditar no real compromisso de Dilma com o ajuste fiscal e a reforma da Previdência, agora ficou praticamente impossível. Ao dar tchauzinhos da sacada do apartamento de Lula, em São Bernardo do Campo, para a claque que a aplaudia, ela explicitou de que lado está. Entre colocar as contas públicas em ordem e garantir o apoio nas ruas contra os que pedem o fim de seu mandato, a chefe do Executivo ficará com os companheiros, ainda que isso provoque mais estragos na economia.
Queda de 4% é piso
Não por acaso, empresários e investidores estão se apegando a todos os sinais de que o governo de Dilma pode acabar antes do prazo previsto. Apesar de essa probabilidade ser baixa, muitos justificam que é melhor manter a esperança de que isso aconteça do que imaginar que o desastre econômico pode perdurar até 2018. Todos os números da atividade mostram um país em colapso. O primeiro trimestre do ano está caminhando para o fim e os economistas projetam queda de 1,8% em relação aos últimos três meses de 2015, que já foram terríveis.
A falta de perspectiva para a economia é tamanha, que os mais pessimistas acreditam que o piso para a queda do Produto Interno Bruto (PIB) passou a ser de 4%. “Com o distanciamento da oposição, da qual o governo vinha se aproximando para tirar o país do atoleiro fiscal, esgarçou-se o combate à recessão e à inflação”, diz Ivo Chermont, economista-chefe da Itaim Asset. Para ele, está ficando cada vez mais evidente que a contração do PIB neste ano será de 4,1%. Isso, é claro, no seu cenário base. “Se houver alguma revisão desse número, será para pior”, avisa.
Na avaliação de Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Corretora, o tombo do PIB neste ano será de 4,2%. E nem mesmo o possível corte das taxas de juros pelo Banco Central será suficiente para evitar o aprofundamento da recessão. “A resposta do PIB à política monetária é muito pequena”, diz. O mais preocupante, acrescenta Ivo Chermont, é que a inflação continuará muito acima do tolerável para uma economia que, em 2015, fechou com índices de preços próximos de 11%. “Continuaremos afundados num quadro de forte contração econômica com custo de vida em torno de 9%”, prevê.
O caldo entornou
A equipe econômica reconhece que “o caldo entornou de vez”, não apenas por causa do ressurgimento do discurso de candidata de Dilma. Para técnicos da Fazenda e do Banco Central, a delação do senador Delcídio do Amaral e o risco de prisão do ex-presidente Lula elevaram a níveis incontroláveis a crise política, que torna impossível se falar em ajuste fiscal e em reformas estruturais pelos próximos meses. Essa percepção vale para a CPMF, imposto que o Palácio do Planalto planejava aprovar até o fim de maio e cobrar a partir de setembro, garantindo reforço de R$ 10 bilhões no caixa do Tesouro Nacional.
A ordem, porém, é não jogar a toalha explicitamente. A equipe econômica continuará pregando que trabalhará junto ao Congresso para levar adiante todas as propostas que resultem na melhora das contas públicas e contenham o derretimento da economia. Mas, à medida que Dilma for migrando para mais à esquerda, modelando o discurso ao que as bases do PT querem ouvir, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, se tornará um fantoche, uma figura decorativa. Nada muito distante da visão que muitos empresários e investidores já têm dele.
Quanto ao Banco Central, o que todos esperam é que siga na direção errática que prevaleceu desde que Dilma tomou posse, ou seja, prometendo uma coisa e fazendo outra. A instituição, ressalte-se, deixou de ser referência há muito tempo. Em vez de dar a tranquilidade que a economia tanto precisa nesse ambiente de caos que o país se encontra, só alimenta ruídos e a especulação. Enquanto isso, a inflação que assombra as famílias segue impávida. É o Brasil ao deus-dará.
Brasília, 08h30min