FALTA DE LIMITES

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Os problemas criados pelo governo vão tornar a vida do Banco Central mais difícil. Não bastasse o presidente da instituição, Alexandre Tombini, ter colocado o cargo à disposição caso a presidente Dilma Rousseff lhe retire o status de ministro, o anúncio de que o país terá, em 2016, deficit de R$ 30,5 bilhões nas contas públicas provocou enormes focos de pressão inflacionária. Tudo está jogando para minar a perspectiva do BC de levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, até dezembro do próximo ano. E, pior, impor juros ainda mais altos à população e às empresas. A intenção do Comitê de Política Monetária (Copom) é de manter a taxa básica de juros (Selic) em 14,25% ao ano na reunião de hoje e sustentar esse patamar até pelo menos o fim do primeiro semestre de 2016, quando se espera que a inflação acumulada em 12 meses, que encosta nos 10%, comece a cair com força. A partir daí, o BC já se sentiria confortável para dar início a um processo de corte nos juros. Esse quadro, porém, começou a ser atropelado pelo governo. Ao mostrar descompromisso com o ajuste fiscal e resistir em cortar gastos, Dilma provocou pânico entre os investidores. O dólar atingiu ontem R$ 3,70, a maior cotação desde dezembro de 2002 — antes, portanto, de Lula tomar posse para o primeiro mandato. Com a moeda norte-americana nesse nível, não há como a inflação cair. Nas contas do próprio BC, a cada 10% de alta da divisa dos Estados Unidos, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) sobe 0,5 ponto percentual ao longo de 12 meses. Só para se ter uma ideia dessa pressão, o dólar já acumula valorização de 38,7% neste ano. Mas os problemas vão além, lembra o economista-chefe da Itaim Asset, Ivo Chermont. Ao não poupar recursos para pagar juros da dívida, o chamado superavit primário, o governo também estimula a inflação, pois significa mais gastos. Em todos os seus documentos, o BC tem deixado claro o quanto um governo responsável com as finanças públicas é importante para levar a inflação ao centro da meta. Nesse ponto, porém, a autoridade monetária só tem colecionado decepções. Por isso, destaca Chermont, o BC está perdendo a batalha do controle das expectativas, o que se torna mais um componente a pressionar o custo de vida. A meta da autoridade monetária era ancorar as projeções para o IPCA dos próximos anos no centro da meta. Até estava conseguindo. Contudo, com os sinais de descontrole fiscal e a fragilidade do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, as estimativas voltaram a descolar dos planos do BC. Para 2016, 90% das cerca de 100 instituições ouvidas semanalmente pelo time comandado por Tombini preveem taxas entre 5% e 6%. Em 2017, a média do mercado está em 4,6%, com viés total de alta. “A continuar o quadro atual, de tantas incertezas, não será surpresa para nós se, em vez de cortar juros, o BC voltar a discutir a elevação da Selic em 2016, mesmo com a economia em recessão”, diz Chermont. Ele não descarta a necessidade de um aperto monetário se tornar iminente, caso Levy ou Tombini — ou ambos — deixe o governo. A probabilidade de isso acontecer aumentou bastante, sobretudo diante da proeminência que Nelson Barbosa, ministro do Planejamento, e Aloizio Mercadante, Casa Civil, ganharam na condução da política econômica do país. Paciência esgotada

Juros mais altos significam menos consumo e menos investimentos, o que, na ponta final, resultará em mais desemprego. Sendo assim, soa falso a presidente Dilma dizer que a grande preocupação de seu governo é com o emprego. As demissões em massa que estão ocorrendo Brasil afora têm a digital do Palácio do Planalto. A cada erro cometido pela presidente da República, a economia sente o tranco e vai encolhendo, até que as empresas não suportam mais e são obrigadas a fechar postos de trabalho. Quando começou o segundo mandato, muita gente acreditou que a petista havia aprendido a lição. Deu-se uma lua de mel entre ela e o mercado financeiro. Mas essa boa relação não demorou a azedar. Aos poucos, Dilma foi tirando a força de Levy e empoderando Barbosa e Mercadante, dos quais os investidores têm horror, porque representam a política que vigorou nos últimos quatro anos e que levou o país ao desastre. Agora, a sensação é de que nada mudou. Mais uma vez, todos se sentem enganados. Nas conversas que tiveram recentemente, Dilma disse a Levy que ele ficará no governo até o fim de seu mandato, em 2018. Aconselhou o subordinado a não se deixe render às intrigas, especialmente às palacianas. Recomendou que ele mantenha um discurso positivo, de que, passado o período de ajuste, a economia voltará a crescer. Levy anotou tudo. Mas quem o conhece sabe que o entusiasmo que o levou a trocar o conforto de um salário de R$ 100 mil mensais por Brasília diminuiu bastante, está quase no chão.

Brasília, 03h10min

Vicente Nunes